quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Come Away With Me...

Saber acadêmico e analfabetismo cultural...

                                                                    Pinturas de Comonian, aqui...
Não é fácil assumir que, de fato, somos analfabetos culturais. É difícil aceitar que o conhecimento enciclopédico e os títulos acadêmicos que porventura temos não são garantia de que sejamos culturalmente alfabetizados. Sabemos ler e escrever, podemos conhecer as teorias, dominar os conceitos filosóficos, políticos, etc., mas isto, longe de nos aproximar do outro e da nossa própria humanidade, pode, paradoxalmente, ter um efeito inverso e perverso: o distanciamento do mundo real, da mísera realidade que nos cerca. Tendemos a tudo racionalizar e nada sentir. O adágio “Penso, logo existo” sugere uma questão: existir para quê? Para além do pensar, que nos dá a certeza do existir, é preciso sentir que existimos.

O especialista tende a separar a palavra do mundo, o conceito da realidade. As palavras dissociam-se da vida real, das contradições, sofrimentos e esperanças dos que vivem no mundo. Se quisermos ir além do saber livresco, do formalismo titulado, enfim, do “balé dos conceitos”[1], precisamos superar os limites da fria racionalidade e assumirmos uma postura diante do mundo.[2] É preciso sentir, indignar-se, comprometer-se. Os que dominam a palavra escrita iludem-se em equivaler conhecimento formal e alfabetização cultural. O ser humano cujas condições sócio-econômicas não lhe permitiu freqüentar os bancos universitários tem o que ensinar. Para compreender este fato singelo é mister desmistificar a noção de cultura, predominante e arraigada em nossos corações e mentes, que confunde cultura com saber acadêmico.

O saber racionalista e eurocêntrico é importante, mas também é fator de colonização das nossas mentes e herança introjetada em nosso ser. Se nos atermos a isto, nos tornamos analfabetos culturais. O resultado é a cegueira da consciência, a anulação da subjetividade e da intersubjetividade. Só superando esta cegueira é que teremos condições de estabelecer o diálogo com o outro. Portanto, o comprometimento intelectual, ou o engajamento, não nos torna necessariamente melhores nem indica que estejamos alfabetizados culturalmente.

A alfabetização cultural é parte da construção da utopia que respeita a subjetividade e estabelece o dialogo entre as diferentes manifestações étnicas, de gênero e de classe. Isto pressupõe uma concepção não elitista da cultura e uma postura pedagógica apoiada na autodeterminação. É preciso, portanto, incorporar uma nova atitude fundada na compreensão de si e no diálogo com o outro, uma atitude que persiga a coerência entre os meios e os fins, entre o discurso e a prática.

Para continuar a leitura de Antonio Ozaí da Silva, Professor do Departamento de Ciências Sociais na Universidade Estadual de Maringá...

Sobre o Analfabetismo Cultural...

                                       Fernando França, aqui...
A obra Alfabetização Cultural: a luta íntima por uma nova humanidade, de Dan Baron, trata da necessidade de construção de uma pedagogia e uma estratégia de libertação que possibilite enfrentar os dilemas da práxis transformadora da realidade social. Como escreve a educadora peruana Liliana Galván Ore:

“Este livro é um modelo vivo refletido no compromisso de quem faz o que aconselha e integra sua subjetividade ao mundo exterior, para transformar essa memória sombria e obscura da realidade numa visão luminosa, plena de esperança pelo crescimento e florescimento”. (p. 17)
(...)
O domínio da cultura escrita e discursiva não é suficiente para que nos alfabetizemos culturalmente. Essa cultura racionalista e eurocêntrica, fator de colonização das nossas mentes e herança introjetada em nosso ser, “nos deixa menos alfabetizados, até ‘analfabetos’, no que se refere às linguagens e performances de nosso corpo, às emoções, aos usos do espaço e aos relacionamentos”. (p. 41) O resultado é a cegueira da consciência, a anulação da subjetividade e da intersubjetividade. Só superando esta cegueira é que teremos condições de estabelecer o diálogo com o outro. Portanto, o comprometimento intelectual, ou seja, o engajamento militante, não nos torna necessariamente melhores nem indica que estejamos alfabetizados culturalmente. Como escreve o autor:

“Precisamos reconhecer que a ausência dessa alfabetização cultural gera conseqüências íntimas, com profundas implicações sociais e políticas. Até que ponto preferimos olhar para as injustiças socioeconômicas ‘externas’ porque é insuportável e aterrorizador olhar para as suas seqüelas da desidentificação em nossas vidas íntimas, muitas das quais não sabemos nomear, interpretar e transformar?” (p. 43)

Para compreender a alfabetização cultural enquanto um objetivo estratégico na construção de uma nova utopia que respeite a subjetividade humana e estabeleça o dialogo entre os diversos territórios e suas manifestações étnicas, de gênero e de classe, precisamos ter claro a definição de cultura proposta pelo autor:

“A cultura é normalmente entendida como a arte produzida para galerias e teatros por gênios criativos em isolamento. Essa crença nos tem desviado e inferiorizado por séculos. Tem sido usada para nos convencer de que a cultura é irrelevante a nossa vida e para nos excluir da construção de idéias e interpretações. Resultou na idéia de que não possuímos técnicas culturais. Mas, sobretudo, essa mentira tem sido usada para nos desencorajar de participar da construção de nossa própria cultura e identidade.

A cultura expressa nossa relação com a produção e reprodução da vida; por isso, o verbo cultivar. Interpreta e define nossa relação econômica, política e social com o mundo. É como nós trabalhamos, comemos, pensamos, nos vestimos, organizamos, , sentimos, escolhemos nossos amores, amamos, nos divertimos, refletirmos, lembramos, falamos, rimos, choramos, transamos, nos vemos, educamos nossas crianças e enterramos nossos mortos. É como entendemos a nós mesmos no mundo e como vivemos este entendimento”. (p. 56)

Esta percepção torna possível compreender como a cultura se encontra profundamente relacionada à “nossa história pessoal, familiar, comunitária, nacional e, hoje, explicitamente global, gravada em nosso corpo, nossas emoções, nossos sentidos e nossas relações – com os vivos, com os mortos e aqueles que ainda não nasceram”. (p. 57)

A alfabetização cultural pressupõe não apenas a compreensão não elitista, da cultura, como também uma atitude pedagógica fundada na autodeterminação. Trata-se de uma pedagogia crítica, uma pedagogia da esperança que possibilite ir além da crítica e da resistência à realidade. É preciso, portanto, incorporar uma nova atitude fundada na compreensão da própria subjetividade e no diálogo com o outro, uma atitude que persiga a coerência entre os meios e os fins, entre o discurso e a prática.

Modernidade e Segurança Ontológica...

                                                                                                      Van Gogh
Anthony Giddens (1991, p. 77) utiliza a imagem do Carro de Jagrená como metáfora da modernidade, indicando que esta se assemelha a um veículo desgovernado, cuja direção não podemos controlar, mas também não podemos “pular fora”. A metáfora indica que a modernidade produziu um mundo perigoso. A sociedade atual é identificada a sentimentos de desorientação e mal-estar. Estaríamos num período de transição, de liminaridade.

“A modernidade é inerentemente globalizante”, afirma Giddens. (id., p. 69) A era da globalização impõe transformações universalizantes que reconfiguram a tradição, levam a seu abandono ou desincorporação. O local encontra-se de tal forma conectado ao global que influencia e é influenciado por este. A tradição vivenciada no locus do cotidiano, no espaço específico, é colocada em questão pela experiência vivenciada do indivíduo no tempo e espaço global. Por outro lado, o local também problematiza o global.

Giddens (1997, pp. 74-75) observa que: “Poucas pessoas, em qualquer lugar do mundo, podem continuar sem consciência do fato de que suas atividades locais são influenciadas, e às vezes até determinadas, por acontecimentos ou organismos distantes”. Porém, não é tão evidente o fato de que “as ações cotidianas de um indivíduo produzem conseqüências globais. Minha decisão de comprar uma determinada peça de roupa, por exemplo, ou um tipo específico de alimento, tem múltiplas implicações globais”.

Há uma interdependência cada vez maior entre o espaço global e o local. O global tem influência sobre as vidas individuais nos espaços locais; mas também as decisões dos indivíduos em seu cotidiano podem influenciar sobre os resultados globais. Esta inter-influência incide sobre as coletividades e grupos de todos os tipos, incluindo o Estado. Isto pressupõe repensar os papéis, sua reorganização e reformulação.

A modernidade nas condições da globalização amplia as incertezas e os perigos. Daí a sensação de mal-estar e de desorientação. O mundo tornou-se cada vez mais um lugar inseguro e essa insegurança é sentida pelo indivíduo em sua mais remota comunidade. A experiência da modernidade colocou por terra as certezas: as surpresas e os riscos estão sempre à espreita e o futuro parece uma impossibilidade se pensado enquanto construção histórica. A modernidade na globalização se assemelha a uma grande e perigosa aventura, à qual, independente da nossa vontade, estamos vinculados. É o Carro de Jagrená!

As experiências do cotidiano no mundo atual vinculam-se às questões fundamentais relativas à identidade, à percepção do “eu” e do “outro”; e, por outro lado, envolvem múltiplas mudanças e adaptações na vida cotidiana. Em tais circunstâncias, os indivíduos “sentem-se no ar” e, inseguros, se apegam à tradição. Eles resistem localmente à globalização e, simultaneamente, não podem desconsiderá-la.

A modernidade solapa a confiança fundada nos valores tradicionais e pressupõe um novo ambiente em que possa se desenvolver a “segurança ontológica”, isto é, o “ser no mundo”. A segurança ontológica “se refere à crença que a maioria das pessoas têm na continuidade de sua auto-identidade e na constância dos ambientes de ação social e material circundantes”. (Id., p. 95) Ela diz respeito ao sentimento que temos sobre a continuidade das coisas e das pessoas; um sentimento inculcado desde a infância e que se vincula à rotina e à influência do hábito. A necessidade de “segurança ontológica” produz novo ambiente de confiança. O reencantamento religioso e a busca crescente do ambiente sagrado, não seriam motivados por essa necessidade de “segurança ontológica”? Não é essa a essência do envolvimento religioso?

Eduardo Meksenas disse...
É que sempre é bom lembrar que o Anthony Giddens é um autor de direita (suas análises limitam-se aos efeitos super-estruturais, sem alcançar as causas estruturais) e conservador (acha que a realidade não pode ser essencialmente modificada e tornar-se muito diferente do que está aí). Além do mais, é um pensador que se filia ao pós-modernismo (despreza as grandes narrativas explicativas como o marxismo e o freudismo, por exemplo, além de achar que o capitalismo provou que veio para ficar eternamente, é o sistema ideal e eterno para a humanidade, estamos no "fim da História").

O pós-modernismo andou em voga nos EUA e parte da Europa nos anos 80 e 90, tendo como expoentes Daniel Bell, Richard Rorty, Allain Touraine, Lyotard, Francis Fukuyama e outros - todos de pensamento enganoso e limitado, cujas falácias já foram demonstradas por pensadores como Fredric Jameson, Terry Eagleton, David Harvey, Perry Anderson, Tonio Negri e outros.

Que o transitório, o fugidio, o disperso, o contraditório sejam características da modernidade já foi muito explorado desde Rousseau e Baudelaire, passando por Marx e, atualmente, chegando em Berman e Harvey. Mas esses autores também constatam a existência de uma “âncora” no moderno, um lado que é mais sedentário contrapondo-se ao nomadismo delirante, é mais planejado que aventureiro delirante, tem os pés no chão, e procura aquilo que é a essência, o imutável, o eterno. Para tais pensadores, a modernidade mesmo sendo desagregadora, volátil e fragmentada, também tem seu lado agregador, sólido, humano e pode ser apreendido e entendido a partir de uma visão de totalidade.

Giddens atém-se a apenas um aspecto da modernidade – o transitório, e o “super-sujeito” como forma de vivê-lo. E caracteriza-a como um eterno presente, impossível de ser modificado – mas não questiona nem muito menos responde por que a modernidade tem esse lado disperso, transitório e fragmentado. Ele previlegia o sujeito (a ontologia) em detrimento do conhecimento(a epistemologia), negando a este último a validade histórica que teve até então. Giddens e os pós –modernos em geral desconfiam da História e de podermos conhecê-la em autenticidade, e entendem que o conhecimento é a instrumentalização do ser humano; rejeitam a visão de totalidade sobre os fenômenos e eventos, como o marxismo, o cristianismo, o darwinismo, o freudismo – tidos como mera ilusão, pois ao sujeito é impossível explicar e conhecer verdadeiramente: a história é uma projeção de nossa própria visão atual, a ciência é um feixe de ilusões. Rejeitam o racionalismo iluminista, por ser responsável por tantos totalitarismos políticos nefastos e destruidores, esquecendo que há uma outra vertente do iluminismo, que é libertadora, emancipadora, humanista, que vem desde Nicolau de Cusa, passa por Dante e Giordano Bruno, e chega a Espinosa e Condorcet.

O que é globalismo? Existe apenas um tipo de globalização? Por que a globalização e a modernidade apresentam aquelas características descritas por Giddens? A estas questões ele não reponde, sequer as coloca.

Giddens e os seus passam batidos pelos efeitos capitalistas do mercado, agora globalizados; as conseqüências de uma economia global de mercado e de uma sociedade de mercado são que a vida tornou-se uma mercadoria, a cultura, a solidariedade, o pensamento, as pessoas: tudo é mercadoria numa sociedade globalizada de mercado; os sentimentos e ações são mercadorias; a ciência, o conhecimento. A arte. Até a miséria e a tragédia, se transformadas em mercadorias, ficam mais charmosas e aceitáveis, e rendem bons lucros à industria da comunicação. Só a mercadoria é que está conectada, e só tem valor aquilo que pode ser expresso e convertido em moeda, inclusive as pessoas e países.. Daí a insegurança, a falta de perspectiva e de sentido, o medo, o isolamento, o individualismo exacerbado. A descrença, a apatia, o abulismo. É isto que merece ser refletido, para buscar-se as alternativas capazes de re- direcionar o globalismo. Sejamos globais, sim (aliás, este era um velho sonho das 3 Internacionais, lembram?), mas em outros termos, que devem ser elaborados. Resistamos ao globalismo nivelador e predador, coisificador e massificador, mas através de outras formas de luta que ainda não conhecemos, e que precisam ser elaboradas.

O texto do Ozaí é muito melhor do que o livro do Giddens, pois vai além e não descarta a esperança nem a humanização, ainda vê o presente como passo para o futuro, e entende que a História não terminou – pontos que Anthony Giddens considera superados. Realmente, para uma determinada classe social –a elite, e a elite da elite – seria muito bom se a vida e o mundo fossem como Anthony e os demais pós-modernos a descrevem: poderiam dormir tranquilamente per omnia saecula seculorum. Mas não é: no silêncio de uma sociedade coisificada, às escuras, a chama de um humanismo tênue se acende, e aquece a Multidão que vai tomando corpo, vai formando-se lenta e imperceptivelmente, seus afluentes surgindo de vários lugares e classes, e vem chegando, grávida de humanismo e energia. Ávida por vida, e por conquistar espaço e condições para essa vida em plenitude dentro de uma sociedade globalizada.

As conseqüências da Modernidade...


Para conseguir explicar a visão de Giddens sobre a globalização será necessário examinar suas idéias sobre o processo de modernização. Isto acontece por culpa da sua crença de que as sementes da globalização são plantadas pelos processos de modernização. Giddens não concebe a modernização como representante do começo de uma nova era ou sequer época da humanidade. Para Giddens a globalização é uma continuação de tendências postas em movimento pelo processo de modernização que teve início na Europa do século XVIII. A modernização substituiu as formas de sociedades tradicionais que eram baseadas na agricultura.

Giddens sugere que o processo de modernização influiu em quatro grandes grupos de “complexos institucionais da modernidade”. Estes quatro que formam a base do processo de modernização. Eles são: Poder administrativo, poder militar, capitalismo e industrialização.

O poder administrativo se refere ao crescimento e ao desenvolvimento da nação-estado secular, esta nova forma de estado é baseado em formas burocráticas e racionais de administração de sua população, lei e ordem. Tal “Racionalização administrativa” permite, como diria Giddens, o desenvolvimento de um estado envolvido na sua sobrevivência e na de outros, populações até então desconhecidas.

O capitalismo e a industrialização então representam as novas formas de produção baseadas e centradas na produção fabrico-industrial. Igualmente às novas formas de cálculo econômico como o lucro, ela se tornou dominante na economia moderna, substituindo as formas tradicionais de produção baseadas primariamente na agricultura.

No livro As consequências da modernidade GIDDENS (1991) propõe uma análise institucional da modernidade com ênfase cultural e epistemológica. Neste sentido, o autor diz que a "modernidade" refere-se a estilo, costume de vida ou organização social que se emergiram na Europa a partir do século XVIII e que ulteriormente se tornaram mais ou menos mundiais em sua influência. p. 8

No que diz respeito a pós-modernidade, GIDDENS diz que se refere a um deslocamento das tentativas de fundamentar a epistemologia, e da fé no progresso planejado humanamente. Afirma ainda que a condição pós-moderna é caracterizada por uma evaporação da grand narrative - o "enredo" dominante por meio do qual somos inseridos na história como seres tendo um passado e um futuro predizível. Sobre a perspectiva pós-moderna, o autor infere que esta vê uma pluralidade de reivindicações heterogênias de conhecimento, na qual a ciência não tem um lugar privilegiado. Ou seja, a pós-modernidade destrona a ciência que havia ocupado o trono com tanta pompa na modernidade. Mas, não há apenas um modelo de conhecimento para se colocar no lugar da ciência, sim múltiplos e fluidicos saberes e conhecimentos.

Giddens, porém defende que os modos de vida produzidos pela modernidade nos desvencilharam de todos os tipos tradicionais de ordem social, de uma maneira que não tem precedentes. Tanto em sua extensionalidade quanto em sua intecionalidade, as transformações envolvidas na modernidade são mais profundas que a maioria dos tipos de mudança característicos dos perídos precedentes. p. 10

Giddens argumenta que a influência a longo prazo do evolucionismo social é uma das razões por que o caráter desconstinuísta da modernidade tem com frequência deixado de ser plenamente apreciado. Uma vez que, a história, no seu dizer, "começa" com culturas pequenas, isoladas, de caçadores e coletores, se movimenta através do desenvolvimento de comunidades agrcolas e pastoris e daí para a formação de estados agrários, culminando na emergência de sociedades modernas no Ociendente. p. 11

Entretanto, desconstruir o evolucionismo social significa aceitar que a história não pode ser vista como uma unidade, ou como refletindo certos principios unificadores de organização e transformação. Giddens apresenta três descontinuidades que separam as instituições sociais modernas das ordens sociais tradicionais, a saber:

1. O ritmo de mudança nítido que a era da modernidade põe em movimento;

2. O escopo da mudança. Conforme diferentes áreas do globo são postas em interconexão, ondas de transformação social penetram virtualmente toda a superficie da Terra;

3. Por fim, a natureza intrínseca das instituições modernas, uma vez que algumas formas sociais modernas simplesmente não se encontram em períodos históricos precedentes. p. 12

terça-feira, 23 de agosto de 2011

O Éden ao lado do Inferno...

                                                                              Charles Burchfield  aqui...
A cena parece irreal. Na maior democracia do Ocidente, ícone do capitalismo mundial, a pobreza espraia-se por territórios ocupados por uma classe média que, menos de cinco anos atrás, exibia vitalidade e brandia com orgulho a bandeira dos direitos. A paisagem agora é de devastação. Milhares de famílias nos Estados Unidos perderam suas casas e hoje vivem em acampamentos. Na Inglaterra, o flagrante de lojas estilhaçadas, prédios e carros incendiados borra a imagem de Londres, uma das capitais do glamour mundial. Levantes no mundo árabe, revoltas em Tel-Aviv, manifestações violentas na Grécia e na Espanha, piqueteiros batendo panelas no Chile e até movimentos de insatisfação na controlada China parecem expressar o que o professor Samuel P. Huntington designa, em seu clássico O Choque das Civilizações, como paradigma do "puro caos": quebra da lei e da ordem, Estados fracassados e anarquia crescente, violência étnica, religiosa e civilizacional, declínio de confiança e uso da força.

Mas esses são os efeitos, fato que sugere indagar: que fatores explicam a escalada de barbárie que invade parcela do planeta neste início de segunda década do século 21?
(...)
O estado de insolvência que envolve economias centrais e os distúrbios em praças civilizadas e incivilizadas impõem a pergunta: e o Brasil, como se comporta na moldura? Não dá para escapar pela tangente e argumentar que nossa terra é uma ilha de segurança no oceano revolto. É evidente que ondas concêntricas, formadas pelos sismos, acabarão batendo em nossas plagas. O País pode se dar ao luxo de exibir sua dimensão continental, riquezas naturais incomparáveis, reservas de US$ 350 bilhões e uma classe média inflada com a inserção de 32 milhões que saíram das margens sociais. E dizer que alargou o meio da pirâmide, ao contrário do que ocorre com a conformação social de outras nações. A questão é: sustentará a posição? Não há o risco de o dragão político devorar o leão econômico? Na era das incertezas, tal risco é possível. E as distâncias entre o Bem e o Mal são curtas. O éden fica ao lado do inferno.

Gaudêncio Torquato nO Estado de S.Paulo...

Choque das Civilizações...

                                                      Van Gogh, aqui... 
Coerente mas falacioso

Que paradigma modela a política internacional de hoje?

Postulou Samuel P. Huntington nesta obra de 1996 que são as várias identidades culturais do mundo que modelam as coesões, as desintegrações e os conflitos numa nova ordem pós Guerra Fria.

Num esforço de compreensão do mundo e do novo quadro das Relações Internacionais emergente da implosão soviética, o autor propõe o paradigma civilizacional como modelo: os inputs da conflitualidade na velha ordem bipolar deixaram de ser a subordinação política a um ou a outro bloco para passarem a dar-se em função dos sentimentos de compertença civilizacional entre os estados.

De facto a tese do autor revela-se-nos ainda bastante actual no sentido em que a maioria das guerras desta nova era foram, ou são, fundamentalmente, entre povos de civilizações diferentes: o conflito israelo-árabe, a Guerra do Golfo, a desintegração jugoslava, a instabilidade na Caxemira, a luta independentista da Chechénia ou mesmo a actual presença anglo-americana no Iraque.

Na minha perspectiva, esta obra deve ser vista como um esforço de abstracção teórica meritório no sentido em que o autor tenta construir um modelo de previsibilidade dos conflitos internacionais, portanto com um elevado grau de infalibilidade, que se afigura em certa medida aceitável no quadro do actual Sistema Internacional.

Contudo, a co-identificação civilizacional / religiosa entre povos não se verifica empiricamente como “o” factor-chave de toda a conflitualidade actual. Por exemplo, melhor do que compreender os conflitos conhecendo as fronteiras inter-civilizacionais do mundo como propõe Huntington, poderíamos compreender as fricções politico-militares entre estados/actores/grupos/nações conhecendo a geografia dos recursos vitais. Veja-se o caso dos Montes Golã, assegurada pelos israelitas para garantir o fornecimento de água, ou o território do Iraque, onde os americanos procuram maximizar o controle sobre o petróleo. Por conseguinte, o paradigma civilizacional de Huntington não é verificável ao ponto de o podermos chamar como tal. Se retrocedermos ao inicio da década de 90, utus e tutsis no Ruanda - diferentes na religião mas pertençamente, para Huntington, sob a «unidade cultural africana» - confrontaram-se, morrendo 1 milhão de africanos numa guerra, naquela que foi tão-somente a maior catástrofe humanitária desde a queda do Muro de Berlim.

Enfim, explicar a conflitualidade através da civilizacionalidade/religiosidade é atirar areia para os olhos dos leitores, secundarizando os interesses, mais ou menos legítimos, dos actores internacionais, em função de antagonismos nas concepções de Deus, nos usos e costumes. No entanto, apesar deste reducionismo, que esquece a geografia dos recursos naturais ou quaisquer outras variáveis que possam conduzir á conflitualidade, é uma obra obrigatória e ainda hoje muito discutida pela sua coerência argumentativa e pela sua actualidade geral nos meios académicos e entre os interessados por Relações Internacionais.

O Choque de Civilizações...

Comparado ao "Fim da História", de F. Fukuyama, pelo impacto causado com sua publicação nos Estados Unidos, "O CHOQUE DE CIVILIZAÇÕES", do historiador americano Samuel Huntington é um ensaio incisivo e profético sobre a nova ordem mundial. Huntington propõe, neste livro, uma mudança radical do paradigma que vem sendo utilizado para a compreensão da política internacional.

"O CHOQUE DE CIVILIZAÇÕES" foi desenvolvido a partir de um artigo com mesmo título que saiu em 1993 na revista "Foreign Affairs", alcançando grande repercussão e provocando intensos debates. Para o autor, no mundo pós-Guerra Fria, a principal fonte de conflito se dá na esfera cultural, e não na ideológica ou econômica. As pretensões universalistas do Ocidente o levam cada vez mais para o confronto com outras civilizações, em especial, com o Islã e a China.

"Minha hipótese é que a fonte fundamental de conflitos neste mundo novo não será principalmente ideológica ou econômica. As grandes divisões entre a humanidade e a fonte dominante de conflitos será cultural. Os Estados-nações continuarão a ser os atores mais poderosos no cenário mundial, mas os principais conflitos da política global ocorrerão entre países e grupos de diferentes civilizações. O choque de civilizações dominará a política global. As falhas geológicas entre civilizações serão as frentes de combate do futuro."

Fonte: aqui... e aqui...

DESABAFO DE UM DESTINO DESATINADO


I – Da observação do destino

Filho da puta,
humano-moleque,
No final da curva,
Eu vou te pegar.

Te pego sozinho,
Sem mãe, sem defesa,
Na tua mente escondida,
Saída na há.

Tu te achas grande,
Metido, perverso.
Exacerba sentidos.
Onde tu estás?

O meu paraíso,
É teu medo escondido.
No rio do destino,
Vingança virá!

Caminhas pra frente!
Não olhas pra trás?
Desce daí!
O que ganharás?

Tua origem é teu tudo,
Teu fruto desnudo,
Ignoras futuro?
E teus filhos, pastais?

II – Da advertência do destino

Filho da puta,
Pensais na vida,
Minha labuta é corrida.
Quem te vai defender?

Não te achais tudo,
Pois no teu crepúsculo,
Da terra e do pó,
Tu não podes correr!

Ao teu livre arbítrio,
Assisto sozinho,
E no livro da vida,
Estou eu a escrever.

Eu quieto, calado,
Com os dois pés descalços,
Com medo do futuro,
Quero te ver crescer!

Mas teu deslumbramento,
Orgulho desatinado,
Subiu pra cabeça,
Não te deixa ver!

Que teu coração,
Ficando escuro,
Teus filhos queridos
A quem vão obedecer?

III – Das consequências

Filho da puta,
Quem pensas que és?
Já bebestes as lágrimas,
De quem ignoraste?

O amor da tua esposa,
Já não mais existe,
Lembranças apenas,
Do que destruístes.

No teu livro da vida,
Eu já escrevi,
O grito e o temor,
Dos que tu abandonaste.

Tua alma sem cor,
Teus olhos sem vida,
Espelham apenas,
O que tu plantaste.

Tuas noites, agora,
Sem lua, sem sono,
Soam os pesadelos,
Que tu já causastes.

E hoje tu choras humano-moleque,
Eu bem te avisei o que estava por vir.
E tu não me ouvistes, homem-teimoso
a tua morte em vida, tu já cansastes?
Mas agora filho: "É tarde!
 

segunda-feira, 22 de agosto de 2011

The Silence...

Happy...

..

Definição do Amor...

Os portugueses desconfiam do que lhes ensinaram...

Coordenou o trio de investigadores que apresentou a última 'versão' da 'História de Portugal'. Esteve bastante envolvido como independente no período pré-chegada ao poder do primeiro-ministro social-democrata. Não vê a Guerra Colonial como o grande drama nacional do século passado português, nem considera o fim do Ministério da Cultura como um problema. Assume que há cada vez menos estudantes interessados pela História e define o fim da preponderância do Ocidente como a primeira grande alteração do século XXI.

Em entrevista ao DN, Rui Ramos afirma que, ao nível da História de Portugal, falta rever, em termos de conhecimento, "muito sobre o nosso passado. A nossa historiografia é relativamente recente em relação a uma grande quantidade de temas e de áreas, e até poderia dizer que falta rever tudo".

O historiador considera que os portugueses aprenderam pouco com o passado, adiantando que "afinal continuamos a cometer erros antigos, como se vê por esta crise!"

Em relação às críticas de hoje à Justiça, Rui Ramos considera que as mesmas "já vem de longe". O historiador considera que "estamos a pagar por uma preocupação grande que houve no passado, que era sobre a independência da magistratura. Houve sempre grandes receios acerca da politização da Justiça e da interferência do Governo nas decisões dos magistrados. Essa preocupação levou a criar-se aquilo que chamaria uma espécie de Estado dentro do Estado".

Rui Ramos considera que o número de estudantes de História "tem diminuído bastante" e espera que, mesmo apesar da Internet, o ensino continue a ter um lugar para a História".

O "Fim da História" ou A Ideologia Imperialista da “Nova Ordem Mundial”...

                                     Monet, aqui...
A grande maré capitalista que tomou conta do mundo, particularmente após a derrocada dos regimes estabelecidos nos países do Leste europeu e na extinta União Soviética, não significou somente a explosão das propostas neoliberais nos terrenos econômico e político. Implicou, também, uma ofensiva sem precedente da ideologia burguesa-imperialista visando à conquista dos corações e mentes em escala mundial. Uma das manifestações mais emblemáticas dessa ofensiva foi, primeiramente, o artigo, aparecido ainda em 1989, com o título "O fim da história" e, posteriormente, em 1992, o livro “O fim da história e o último homem”, ambos do norte-americano Francis Fukuyama1.

O esforço principal de Fukuyama, que tem provocado grande repercussão, foi o de tentar elaborar uma linha de abordagem da história, indo de Platão a Nietzsche e passando por Kant e Hegel, a fim de revigorar a tese de que o capitalismo e a democracia burguesa constituem o coroamento da história da humanidade, ou seja, de que a humanidade teria atingido, no final do século XX, o ponto culminante de sua evolução com o triunfo da democracia liberal ocidental sobre todos os demais sistemas e ideologias concorrentes.

(...)
Dessa forma, os países que representam e encarnam o "fim da história", os "países democráticos" da "pós-história" - na verdade, as atuais potências imperialistas, com os Estados Unidos à frente - ficariam de mãos livres para agir em defesa de seus interesses e perpetrar barbaridades, tudo em nome da "humanidade" e da "civilização". Onde está a diferença em relação ao fascismo? É um discurso antidemocrático, anti-socialista e agressivo, que, às vezes usando uma linguagem rebuscada, reflete o triunfalismo e a agressividade da ideologia capitalista após a derrocada do Leste europeu e da União Soviética. O livro de Fukuyama, além disso, não analisa e não derruba nenhum ponto essencial do pensamento socialista a respeito do capitalismo e da evolução histórica da humanidade. O ponto de partida do socialismo científico sobre o capitalismo e o de que este último é um regime fundado na exploração do homem pelo homem, da burguesia sobre o proletariado, sob a forma da apropriação da mais-valia, a forma especificamente burguesa de apropriação do trabalho não pago. Enquanto persistir essa relação de dominação, não se pode falar em libertação do homem. Como disse Marx, a produção capitalista significa a dominação do capitalista sobre o operário, a dominação da coisa sobre o homem, do trabalho morto sobre o trabalho vivo, do produto sobre o produtor. "Na produção material, no verdadeiro processo da vida social - pois o processo de produção é isso - dá-se exatamente a mesma relação que, no terreno ideológico, se apresenta na religião: a conversão do sujeito em objeto e vice-versa."

Esse modo de produção, que está condenado a produzir e reproduzir permanentemente tal relação social, não conduz nunca à liberdade, mas à opressão e à alienação. Essa cadeia precisa ser rompida, ou seja, os trabalhadores têm de rompê-la para se após sarem das condições de produção de sua vida material e se libertarem. Sem destruição do capitalismo, não existe o reino da liberdade, que não será o "fim da história", mas o início de uma nova era na história da humanidade. O socialismo significa um primeiro passo na superação do capitalismo e um avanço em direção ao comunismo, a uma sociedade sem classes, uma sociedade altamente desenvolvida e igualitária - não porque os homens estejam formalmente iguais em direitos e deveres, como na sociedade burguesa, persistindo entre eles a desigualdade econômica básica, fruto da exploração de uma classe por outra - mas precisamente porque as classes serão abolidas, restando apenas as diferenças individuais entre as pessoas. Nas palavras de Engels, o homem, ao tornar-se dono e senhor das suas próprias relações sociais, converte-se, pela primeira vez, em senhor consciente e efetivo da natureza. "Os poderes objetivos e estranhos que até aqui vinham imperando na história colocam-se sob o controle do próprio homem. Só a partir de então ele começa a traçar sua história com plena consciência do que faz. E só daí em diante as causas sociais postas em ação por ele começam a produzir, predominantemente, e cada vez em maior medida, os efeitos desejados. É o salto da humanidade do reino da necessidade para o reino da liberdade'." A partir daí, pode-se falar não no "fim da história", mas num verdadeiro "começo da história" para a sociedade humana.

A evolução da humanidade em direção ao reino da liberdade não se interrompeu neste final de século, marcado por tantos acontecimentos trágicos e por um aparente triunfo final do capitalismo. O historiador E. H. Carr faz uma reflexão no sentido de que a história vem sempre avançando, mas o! Prova que ninguém jamais acreditou num tipo de progresso que avançasse numa linha reta contínua, sem reveses ou desvios. Ele diz: "Há, nitidamente, períodos de regressão e períodos de progresso". Assim, este final de século poderia ser descrito como um período de regressão, de desvio, que não deve nos levar a perder o rumo do horizonte histórico da humanidade.

O Fim da História e o Último Homem...

Em 1989, Francis Fukuyama publicou um artigo em que afirmava que o surgimento dos movimentos reformistas na então União Soviética e na Europa Oriental, além da propagação da cultura do consumo em escala mundial, marcava a vitória do Ocidente, do mundo capitalista. Os resultados daquilo que Fukuyama tão habilmente percebera nos movimentos emergentes começaram a se mostrar corretos. Algo como a realidade dando munição para uma teoria de natureza explosiva.

A partir daquele artigo, publicado em uma revista especializada e de circulação restrita, acendeu-se o estopim de uma acirrada discussão, que se propagou em todos os meios após a publicação do livro. Afinal, entrou em debate o rumo da História ou, mais sísmico, o fim, no sentido hegeliano, do que se entende por História.

Em seu estudo, Fukuyama toma como referência não só a noção de Hegel, mas também a de Marx. Para ambos, diz o autor, a evolução das sociedades humanas não era ilimitada, mas terminaria quando a humanidade alcançasse uma forma de sociedade que pudesse satisfazer suas aspirações mais profundas e fundamentais. Neste sentido, os dois pensadores previram um "fim da história". Para Hegel, tal fim seria o Estado liberal; para Marx e sociedade comunista.

No centro da argumentação de Francis Fukuyama o que vamos encontrar é, antes de tudo, a observação de que existe atualmente, no mundo todo, um consenso ideológico quanto à legitimidade e à viabilidade da democracia liberal. O fracasso das forças comunistas no Ocidente dá a Fukuyama fios resistentes para a confecção da trama de suas idéias. A partir daí, instala-se a inevitável e essencial discussão, calorosa, sem dúvida, e que demonstra a importância da reflexão de Francis Fukuyama sobre o destino do homem e da sociedade.

Esta sinopse é daqui...

domingo, 21 de agosto de 2011

Desenha-me uma Canção...

Com o projecto Draw me a song™ (Desenha-me uma canção), vencedor do Prémio de Criatividade promovido pelo Deutsche Bank em 2011, Nour dá vida a conhecidas músicas. Faz-nos entrar num universo paralelo e fantasioso onde letras, histórias e cor se fundem na materialização de um mundo sensorial de onde não apetece sair.

Ao desenhar as canções que nos dançam nos lábios, Nour dá o mote para o complemento perfeito: imagem e som juntos estimulam os sentidos.

sábado, 20 de agosto de 2011

Cronópio Ciclope...


Estigmatizando o viver
Transvestindo as hipocrisias
Dilacerando as máscaras
De tantas falsas aparências

Encontro a essência dum Mundo
Delirando na poeira do caos

Mundo gira...

Traz-me
O essencial do ser
Que sempre quis: Ser

Palavras... Poesias...

Apenas uma lírica
Que pudesse, como uma fecha,
Atingir um Coração

Mundo roda – vem

Como numa canção
E toca em nossos corações
Todas amiúdes verdades
Dos devaneios que torturam
As cores indecifráveis
Na Vênus imaginação
Em Vênias solicitudes...

Rio Acre

                                                                                       Fotografia de Val Fernandes - rio Acre 
Quero rio do Rio...
De tanto rir
Do rio dessa Cidade

Sem o navegar
De Dantes...

Riso do meu Pranto
Dum manto não Preto...
Mas Branco
Do branco rio
De Rio Branco!...

Onde os marujos portugueses
Com suas Brancas Máscaras
Da Negra Colonização
Não conseguiram ultrapassar

E nem navegar...

Pois longas são suas Margens
Em correntezas
De tantas memórias
que chora...

Protegida pelo branco rio
De Rio Branco
És, nos doces lábios,
 denso fluxo ardente:

Meu belo Rio Acre!..

Já nem choro
Nem rio
So[(u]r)rio...

sexta-feira, 19 de agosto de 2011

l'important c'est la rose...

Saigon...

Mi eterno amor secreto...

Willy el Soñador...

Anthony Browne es considerado uno de los principales creadores de libros-álbum en el mundo y ha sido traducido a más de quince idiomas. En WILLY EL SOÑADOR, sus maravillosas ilustraciones parecen formar una galería de cuadros surrealistas donde cada detalle habla del mismo modo como nosotros relacionamos los objetos y sus significados en el mundo de los sueños.
En este libro, nos reencontramos con el simpático chimpancé que es uno de sus más queridos personajes y que ha protagonizado gran parte de su obra. A nuestro amigo Willy le encanta soñar y a través de cada página veremos cómo él se transforma en una estrella de cine, en un pintor, un bailarín de ballet, un monstruo feroz o un divertido superhéroe.
Puedes pasar horas mirando y riendo con cada una de estas imágenes, recordando clásicos personajes de los cuentos infantiles que se esconden en sus rincones y descifrando junto a tus hijos todo el humor y el ingenio de sus infinitos secretos... Confira neste link...

Anthony Browne...

Anthony Browne, nacido en Inglaterra hace 50 años, ha logrado con sus libros-álbum lo que pocos autores-ilustadores alcanzan: cautivar por igual al público adulto, al especialista y al infantil. Sus libros han sido merecedores de la medalla Kate Greenaway en dos ocasiones y la candidatura al premio Andersen. Además ha ganado la simpatía de muchos niños que le escriben con frecuencia con personajes como Willy.

En sus historias e ilustraciones conviven lo humorístico con el mundo íntimo de sus personajes, la técnica realista con elementos surrealistas para el lector atento, animales antropomórficos con seres humanos que se comportan como animales, gorilas con ruda apariencia pero de tiernos sentimientos, niños sumisos y miedosos con niños dominantes y buscapleitos...

La vida de José va a experimentar un gran cambio, según le cuenta su padre por la mañana. Todo comienza a cambiar: la zapatilla se convierte en una gaviota, el sofá es un cocodrilo… ¿Será el cambio al que se refiere su padre? No, porque el cambio que sufrirá será otro.

Este libro plantea como la llegada de un nuevo miembro a la familia produce cambios inesperados en el protagonista. Un álbum que plantea un extraño y divertido juego de imágenes.

“Esta mañana su papá había dicho a José que las cosas iban a cambiar.

Leer libros álbum con los hijos es una de las mejores maneras de compartir el tiempo”. Anthony Browe es uno de los más distinguidos referentes.
 
Eis aqui a fonte...

quinta-feira, 18 de agosto de 2011

quarta-feira, 17 de agosto de 2011

Woody Allen e Vicky Cristina Barcelona...

Outro dia, numa sala de aula (momento de intervalo), ouvir duas colegas comentando sobre o filme de Woody Allen, Vicky Cristina Barcelona, pelo entusiasmo e a empolgação da conversa, cheguei a pensar que fosse o melhor filme dele; pois ainda não assisti, mas já está na lista para minha próxima sessão solitária, isso é, se a locadora de filmes cumprir com o que disse... Oh, mas que atraso de vida cinematográfica é essa cidade; além de faltar um bom cinema, as locadoras nunca renovam seus filmes...

A verdade mesmo (estou ansiosa para assistir a qualquer filme de Wood Allen) é que eu gostaria de ser, ao menos, uma medíocre crítica de cinema para fazer um extraordinário comentário sobre este gênio e suas produções, contudo uma reles cidadã comum, assim como eu, tem mesmo é que se contentar apenas com o encantamento proporcionado com a arte genial deste artista consagrado... Por isso, ficarei apenas com a vaga recordação do primeiro contato que tive com Woody Allen, na minha adolescência, através do livro de contos Cuca Fundida... A partir de então comecei a conhecer seus filmes, assistindo aos três primeiros: Tudo que você precisa saber sobre sexo, Noivo neurótico, noiva nervosa e Sonhos de um Sedutor... depois veio uma sequência indescritível...

Naquele momento da minha vida, sem cinema nessa cidade, perante o provincianismo que (impera) vivíamos em Rio Branco, com a total falta de informação, fui muito criticada e pouco compreendida pela aquisição daquele livro de contos, enfim: foi uma paixão à primeira leitura... Pouco me recordo sobre os contos (já faz tanto tempo que os li e não tenho tempo para fazer uma releitura), mas muito também me chamou a atenção foi à apresentação do tradutor Ruy Castro; em poucas palavras, ele descreve a dramática trajetória da vida pobre que Wood Allen teve em Booklyn...

Ele, o tradutor, inicia a apresentação falando sobre um grande escritor americano, chamado Nathanael West, que tinha um calo no dedo e que doía muito ao escrever... E, “o que tem isso a ver com Wood Allen?”, ao que parece nada tem a ver, mas Rui Castro responde: “Pensando bem, os dois têm uma coisa em comum: ambos se especializaram em vender neuroses”, logo eu penso: deve ser por conta da dor que sentem, na alma, ao escrever... E é exatamente a expressiva capacidade de brincar com a neurose, em toda sua produtividade, que Woody Allen tanto me fascina, como no filme Vicky Cristina Barcelona... 
 
 Vejamos o  que me disse este link:

“Na cena final de Noivo Neurótico, Noiva Nervosa (Annie Hall, 1977), Woody Allen lembra uma piada antiga. Um homem diz a um psiquiatra: "Doutor, meu irmão é maluco, ele pensa que é uma galinha". O médico diz: "Então, porque você não o interna?". Ao que Allen responde: "Bem, eu o internaria, mas acontece que preciso dos ovos". À piada segue uma pequena, porém brilhante, reflexão: "Assim é como me sinto sobre relacionamentos, eles são completamente irracionais, malucos, absurdos, mas continuamos, insistimos porque a maioria de nós precisa dos ovos".

Absolutamente coerente com a "filosofia dos ovos", depois de tantos anos esmiuçando os paradoxos do romance, Woody Allen ainda tem muito o que dizer sobre a irracionalidade, a maluquice, os absurdos de um relacionamento amoroso. Vicky Cristina Barcelona tem esse mesmo leitmotiv. Mas o tratamento aqui é outro. Há uma leveza maior sem, no entanto, banalizar ou simplificar as emoções dos personagens. Talvez o tempo tenha amenizado a angústia e o diretor e roteirista tenha compreendido que algumas coisas nem sempre podem ser analisadas de forma racional e cartesiana. Às vezes, nem um analista ajuda.”...

terça-feira, 16 de agosto de 2011

Um Militante contra a Hipocrisia...


Poucos escritores causaram tanto escândalo em seu tempo, e mesmo além dele, quanto o americano Henry Miller. Nascido em 1891, Miller escolheu Paris para viver, mas não como os bem sucedidos autores que residem na Cidade Luz, usufruindo da fama. Henry Miller tinha quase 50 anos quando publicou seu primeiro livro, Tropic of Cancer, uma narrativa confessional como as de Santo Agostinho ou Rousseau, mas baseada em suas experiências com as prostitutas francesas.

Nenhum escritor soube valorizar tanto a putaria como ele. Havia um rito sacro e mistérios cósmicos em cada trepada descrita. O sucesso foi imediato, e a censura também. O livro foi proibido em várias partes do mundo, e foi o que o promoveu, é claro. Na década de 30 a descrição crua do sexo, embora apaixonada e sincera, feria suscetibilidades. O livro passou a ser referência para masturbações adolescentes, e sua dimensão artística foi sufocada. Mas Miller chegara para ficar, e logo lançou "Tropic of Capricorn".

A sexualidade desenfreada

Para Henry Miller, descrever os homens em seu sexualismo extremo era uma obrigação da literatura moderna, conforme suas próprias palavras numa entrevista: "na realidade pouca revolta de qualquer espécie é permitida ao homem moderno. Ele já não age, ele reage. Ele é a vítima que, afinal, veio a ser apanhada na sua própria armadilha".

Em seus livros, Miller dá ao sexo uma dimensão sacra. Os personagens chafurdam na lama, são descritos com franqueza quase pornográfica, mas com tal naturalidade de estilo e humor que assumem uma grandeza indiscutível. A crítica literária européia saudou Miller como a culminância de uma corrente literária que remonta ao século XVIII.

A crucificação encarnada

Henry Miller tornou-se um clássico absoluto quando publicou a trilogia "Sexus, Plexus, Nexus"... Aqui, para continuar a leitura... 

domingo, 14 de agosto de 2011

Hay Milonga de Amor...

Com a escrita Presente: Sinto o Aroma Forte da tua Ausência...

Olha eu, novamente, cheia de saudades, às vezes, desistindo e resistindo, mas existo: eis a essência do meu ser que me impossibilita qualquer encontro consumista...

Aqui, na solidão e no silêncio da tua ausência; envolta dessa imensidão verde: fiquei pensando em ti (mais uma vez delirando com o cheiro forte das tuas palavras), e com o desejo que consome meu corpo, lembrei que as tramas do Tempo que nos aproximaram, se entrelaçaram, se fragmentaram e, secularmente, foram ignoradas; abarcaram todas as possibilidades dos encontros que constroem a vida.... Nós existimos na maioria desses tempos. Tempo que, em alguns momentos, existiram o Outro, tu e eu; eu em ti, e todos os outros em nós dois...

Assim, foi quando eu compreendi que a linguagem é uma pele, então esfreguei minha língua em ti e senti que a única palavra que exige a verdade é esta: a linguagem do teu corpo... Por isso, eu sinto: existo para me consumir em desejos e, na solidão de um mundo sem fim, embeber-me com o cheiro forte da saudade... Sofro com a dor da tua ausência e sentindo medo do teu corpo próximo ao meu: dissolvo-me de tanto prazer, por quê?:
Disseram-me, um dia...
Que o orgasmo é:
Um instante sem dor
De loucuras e desejos

Em sedentos movimentos

Mãos que seguram
E tudo escapam

Corpos que são...
A turbulência de dois rios
Quando se encontram

Introduzi meu desejo
Em teu corpo

Derramei minha carência
Por sobre ti

Escorri por entre
Tuas pernas

Essa foi minha única saída
Sob o teu líquido
Que me banhou

Curei-me no teu hálito
Que habitou
A pátria do meu desejo

E, embriaguei-me
Com teu cheiro forte de prazer

Nós saímos da Real...

sexta-feira, 12 de agosto de 2011

Mentiras...

Nossa Aquarela...

Tranque também o seu!...

                                                                                           A Imagem é daqui...
Meu Brasil, meu Brasil brasileiro: amo-te porque te amo, mas jamais saberei da onde vem tanto amor por ser brasileira (isto é uma desculpa para não falar sobre assuntos sérios)... Talvez conhecendo nossas origens portuguesas, quem sabe, hein?, eu encontre alguma explicação para tantas incompreensões...

Enquanto hoje uns comemoram os 50 anos do início duma  construção democrática no Muro de Cimento (Muro de Berlim), outros recordam a Queda deste Muro como início doutra democracia, e o Fim da Guerra Fria, porém meu medo foi de que tenha sido o início duma Guerra Quente: ai, ai!... Sempre imaginei que democracia fosse apenas uma palavra, que funciona como uma mola propulsora ou impulsionadora, no discurso daqueles seres que almejam o Poder, ao ler o artigo abaixo, de quem conhece a História do Brasil (nem foi necessário ir tão longe), acabei por esclarecer algumas dúvidas:

“Em russo, espanhol e inglês - para que todos pudessem compreender - havia, no aeroporto de Havana, a seguinte mensagem: "Cuba é uma nação livre, soberana e independente. O governo é democrático, revolucionário e comunista. Aqui não há fome, exploração ou injustiça social. Não admitimos prostituição, drogas ou qualquer outra forma de depravação inerente ao capitalismo. Numa sociedade em que todos são iguais, não ocorrem furtos, roubos ou corrupção".

Isso me foi contado por entusiasmados colegas de faculdade na década de 1970. No mundo universitário, então, o marxismo imperava. Pobre de quem não compartilhasse o seu credo: era discriminado e banido do convívio acadêmico. Perguntava-me eu: por que motivo aqueles que pregam a inclusão social são os primeiros a tentar excluir?

Quem exercia o poder no Brasil eram os militares e seus simpatizantes. E a nós, estudantes e mestres, restava defender ideias opostas. Para tanto o marxismo vinha muito a calhar. Até mesmo eu, na época, me considerava um socialista light. Sempre que afirmava isso, logo aparecia alguém para me desmentir: "Você não passa de um liberal". Mais de duas décadas e meia após a redemocratização do País, a antiga polarização acabou. O pessoal da faculdade tinha razão: eu sempre fui mesmo um liberal. O problema é que não me dava conta disso.

Agora, à luz da História, a gente percebe que nada daquilo fazia sentido. Nem os militares brasileiros se comportaram como radicais de direita, nem os irmãos Castro, em Cuba, dirigem um governo de esquerda. De um lado e de outro, as ditaduras não são mais do que isto: ditaduras.
(...)
Nos lugares onde foi implantado, o socialismo falhou. Depois da queda do Muro de Berlim, então, nem sequer a visão marxista da sociedade sobreviveu.
(...)
A culpa, como sempre, é atribuída aos outros. Perversa é a sociedade, não nós... Somos inocentes porque estamos denunciando e criticando tudo isso.
(...)
Os nossos bravos sindicalistas e intelectuais - nos quais o sangue socialista ainda ferve nas veias - se dispõem a tudo, desde que, ao final, prevaleça a "causa justa". Vale roubar, matar ou até morrer, se for necessário. Eles não ficam com a consciência pesada? Não. Acreditam piamente que moralidade "é coisa de pequeno burguês".

O nosso "ex-presidente proletário" ganhou fama, nos meios políticos, de transigente e negociador. Faz qualquer coisa para manter o poder. Para lograr tal intento e eleger a sua sucessora ele cedeu diversos órgãos governamentais ao comando dos demais partidos. E, pelo que se vê agora, o negócio foi feito de porteira fechada, ou seja, cada um cuida de si.
(...)
Enquanto isso, o que se ouve lá pelos lados do Planalto Central é que, dia desses, um indivíduo estacionou o seu veículo bem em frente da rampa de certo palácio. A o sentinela se aproximou: "O senhor não pode parar aí! É por aqui que passam as autoridades!".

"Não se preocupe, seu guarda. Eu tranquei o carro!". Para ler o artigo, de João Mellão Neto, em O Estado de S. Paulo

Ahahahahahahah!!!...

quinta-feira, 11 de agosto de 2011

Con la Mano Levantá...

O Animal da Floresta...

De madeira lilás (ninguém me crê)
se fez meu coração. Espécie escassa
de cedro, pela cor e porque abriga
em seu âmago a morte que o ameaça.
Madeira dói?, pergunta quem me vê
os braços verdes, os olhos cheios de asas.
Por mim responde a luz do amanhecer
que recobre de escamas esmaltadas
as águas densas que me deram raça
e cantam nas raízes do meu ser.
No crepúsculo estou da ribanceira
entre as estrelas e o chão que me abençoa
as nervuras.
Já não faz mal que doa
meu bravo coração de água e madeira.
Thiago de Mello 

O Clamor de um Poeta...

Conhecendo a determinação da historicidade dos Homens que, verdadeiramente, construíram a história brasileira, percebe-se que o Brasil ditatorial é bem semelhante ao Brasil atual com a ditadura da democracia:

"Thiago de Mello nasceu há 85 anos na pequena cidade de Barreirinha, no Amazonas. Cedo foi pro Rio de Janeiro, onde trabalhou como ajudante de cozinha em troca de comida e estudos. Sua atividade como poeta, que completou 55 anos, o projetou mundialmente. Uma poesia sempre combativa e humanista, marcada pela simplicidade, alheia a modismos e experimentação.

Em entrevista ao Dom Total, Thiago recorda o período de 1961 a 1964, quando trabalhou como adido cultural em Santiago do Chile, mas foi afastado do cargo por acolher refugiados políticos brasileiros em sua casa, contrariando a orientação dos militares. Foi preso na época em que as ditaduras militares se apoderaram de toda a América Latina, por participar ativamente na Organização Revolucionária do Chile, quando se tornou amigo íntimo do poeta Pablo Neruda, Prêmio Nobel de Literatura no ano de 1971.

De volta ao Brasil, Thiago retornou à sua Barreirinha para uma vida marcada pela simplicidade em contato com a natureza. Mas mesmo afastado dos grandes centros, sua poesia ainda ecoa em todo o planeta, principalmente sua obra-prima, Os Estatutos do Homem, uma ode à liberdade e aos direitos humanos.

Durante sua vida, Thiago ameaçou várias vezes abandonar a poesia, mas a poesia nunca o abandonou. E ele segue escrevendo uma obra que hoje, acima de tudo, traz o clamor dirigido aos quatro cantos do mundo, chamando a atenção do Brasil para a devastação do planeta, a começar pela floresta Amazônica. Confira em Dom Total a entrevista, realizada pelo jornalista Marco Lacerda e no áudio a entrevista completa...

Foi para ti...

Foi para ti
que desfolhei a chuva
para ti soltei o perfume da terra
toquei no nada
e para ti foi tudo

Para ti criei todas as palavras
e todas me faltaram
no minuto em que falhei
o sabor do sempre

Para ti dei voz
às minhas mãos
abri os gomos do tempo
assaltei o mundo
e pensei que tudo estava em nós
nesse doce engano
de tudo sermos donos
sem nada termos
simplesmente porque era de noite
e não dormíamos
eu descia em teu peito
para me procurar
e antes que a escuridão
nos cingisse a cintura
ficávamos nos olhos
vivendo de um só olhar
amando de uma só vida.
 Mia Couto
Fonte: aqui...

quarta-feira, 10 de agosto de 2011

Economia: A fronteira da cultura...

Durante anos, dei aulas em diferentes faculdades da Universidade Eduardo Mondlane. Os meus colegas professores queixavam-se da progressiva falta de preparação dos estudantes. Eu notava algo que, para mim, era ainda mais grave: uma cada vez maior distanciação desses jovens em relação ao seu próprio país. Quando eles saíam de Maputo em trabalhos de campo, esses jovens comportavam-se como se estivessem emigrando para um universo estranho e adverso. Eles não sabiam as línguas, desconheciam os códigos culturais, sentiam-se deslocados e com saudades de Maputo. Alguns sofriam dos mesmos fantasmas dos exploradores coloniais: as feras, as cobras, os monstros invisíveis.

Aquelas zonas rurais eram, afinal, o espaço onde viveram os seus avós, e todos os seus antepassados. Mas eles não se reconheciam como herdeiros desse património. O país deles era outro. Pior ainda: eles não gostavam desta outra nação. E ainda mais grave: sentiam vergonha de a ela estarem ligados. A verdade é simples: esses jovens estão mais à vontade dentro de um video-clip de Michael Jackson do que no quintal de um camponês moçambicano.

O que se passa, e isso parece inevitável, é que estamos criando cidadanias diversas dentro de Moçambique. E existem várias categorias: há os urbanos, moradores da cidade alta, esses que foram mais vezes a Nelspruit que aos arredores da sua própria cidade. Depois, há uns que moram na periferia, os da chamada cidade baixa. E há ainda os rurais, os que são uma espécie de imagem desfocada do retrato nacional. Essa gente parece condenada a não ter rosto e falar pela voz de outros.

A criação de cidadanias diferentes (ou o que é mais grave de diferentes graus de uma mesma cidadania) pode ou não ser problemática. Tudo isso depende da capacidade de manter em diálogo esses diferentes segmentos da nossa sociedade. A pergunta é: será que esses diferentes Moçambiques falam uns com os outros?
(...)
O nosso continente corre o risco de ser um território esquecido, secundarizado pelas estratégias de integração global. Quando digo "esquecido" pensarão que me refiro à atitude das grandes potências. Mas eu refiro-me às nossas próprias elites que viraram costas às responsabilidades para os seus povos, à forma como o seu comportamento predador ajuda a denegrir a nossa imagem e fere a dignidade de todos os africanos. O discurso de grande parte dos políticos é feito de lugares-comuns, incapazes de entender a complexidade da condição dos nossos países e dos nossos povos. A demagogia fácil continua a substituir a procura de soluções. A facilidade com que ditadores se apropriam dos destinos de nações inteiras é algo que nos deve assustar. A facilidade com que se continua a explicar erros do presente através da culpabilização do passado deve ser uma preocupação nossa. É verdade que a corrupção e o abuso do poder não são, como pretendem alguns, exclusivas do nosso continente. Mas a margem de manobra que concedemos a tiranos é espantosa. É urgente reduzir os territórios de vaidade, arrogância e impunidade dos que enriquecem à custa do roubo. É urgente redefinir as premissas da construção de modelos de gestão que excluem aqueles que vivem na oralidade e na periferia da lógica e da racionalidade europeias. Para continuar com a leitura, aqui... ou aqui...

Mia Couto é Escritor moçambicano. Texto apresentado na Associação Moçambicana de Economistas (AMECON)