sábado, 30 de outubro de 2010

Eu...

Eu sou a que no mundo anda perdida,
Eu sou a que na vida não tem norte,
Sou a irmã do Sonho, e desta sorte
Sou a crucificada... a dolorida...

Sombra de névoa tênue e esvaecida,
E que o destino amargo, triste e forte,
Impele brutalmente para a morte!
Alma de luto sempre incompreendida!...

Sou aquela que passa e ninguém vê...
Sou a que chamam triste sem o ser...
Sou a que chora sem saber porquê...

Sou talvez a visão que Alguém sonhou,
Alguém que veio ao mundo pra me ver,
E que nunca na vida me encontrou!...


(Florbela Espanca)

Fonte: Jornal de Poesia

sexta-feira, 29 de outubro de 2010

Meu Fado Tropical...

Tropa Elite 2...

Embora Tropa de Elite seja um filme inegavelmente eficiente, há algo mais por trás de seu sucesso e do verdadeiro modismo que inspirou através das repetições de vários de seus diálogos: estabelecendo o capitão Nascimento como um ícone da luta contra o crime (algo que comentei em meu texto sobre o longa ao lamentar a percepção equivocada que muitos tiveram acerca do personagem ao encará-lo como “heróico”), aquela obra de José Padilha tocou num nervo exposto da sociedade brasileira, que, farta de viver sob o medo constante diante dos criminosos, encarou as ações violentas de Nascimento de forma quase catártica, como um símbolo da reação do “bem” contra o “mal”. Neste sentido, o plano final de Tropa de Elite servia, como argumentei na época, como um espelho erguido diante do espectador, que era obrigado a avaliar seus próprios sentimentos acerca da execução a sangue frio do traficante Baiano.

Pois Tropa de Elite 2 traz o agora coronel Nascimento (Moura) enfrentando, como aponta o subtítulo do projeto, um outro inimigo – e que igualmente pressiona outro nervo do brasileiro: a política. Depois de comandar uma operação mal sucedida em Bangu I que resulta num massacre, Nascimento se torna um problema para o governador do Rio de Janeiro: por um lado, é exonerado para aplacar a mídia; por outro, é promovido a subsecretário de segurança para respeitar a vontade de uma elite estúpida que, formadora de opinião e lixando-se para os direitos humanos alheios, aplaude de pé (literalmente, como revela a cena no restaurante) as atitudes do sujeito.

Depois de aparelhar o BOPE e transformá-lo numa verdadeira máquina de guerra, o coronel interrompe o tráfico na cidade, mas, sem saber, propicia a ascensão de uma milícia nascida dentro da PM que, explorando o vácuo de poder, aterroriza as favelas para extorquir seus habitantes, transformando-as também em autênticos currais eleitorais.

Sem perceber o que está acontecendo, Nascimento se vê atormentado por problemas pessoais e pela pressão exercida por um político de esquerda, o deputado Fraga (Santos), cuja visão idealista acerca dos direitos humanos freqüentemente gera embaraços para a polícia.

Escrito por Bráulio Mantovani, parceiro do diretor e co-roteirista José Padilha desde Ônibus 174, esta continuação pinta um retrato complexo das relações entre a política, o crime, a polícia e a imprensa, resultando num roteiro inteligente e multifacetado que sugere novos cenários para a realidade brasileira (como a quebra do tráfico) e as possíveis conseqüências destas hipóteses. Aliás, a dupla não esquece nem mesmo de incluir a inevitável figura do apresentador de TV que, arrotando auto-importância e indignação diante das câmeras, jamais se esquece de colher todos os frutos que sua raiva teatral lhe rende nos planos políticos e financeiros.

Mantendo-se a mesma criatura cruel e sanguinária que conhecemos anteriormente, o coronel Nascimento desta vez tem sua natureza implacável exposta de forma mais óbvia por Padilha, que, talvez em função da controvérsia gerada pelo original (que levou muitos comentaristas desatentos a classificarem o diretor do incrivelmente humano Ônibus 174 como “fascista”), deixa clara a culpa do BOPE na ação desastrada que abre o filme – e mesmo que o protagonista insista em se referir a Fraga como “intelectualzinho de esquerda”, a revolta do deputado diante da matança promovida pelos homens de Nascimento é retratada com paixão e integridade por seu intérprete e encarada com respeito pelo longa.

Em contrapartida, sempre através da mesma narração em off que o humanizou no original (e sem a qual, escrevi na ocasião, ele seria visto pelo público como um monstro), Nascimento apresenta suas motivações e seu senso de justiça de forma articulada, apresentando-se para o espectador como um homem complexo que pode até não gostar de agir com violência, mas acredita honestamente ser obrigado a abraçá-la em prol da sociedade que é pago para defender – uma filosofia de trabalho que seu antigo aprendiz, o agora capitão Mathias (Ramiro), passou a seguir com vigor.

Neste aspecto, a pergunta que Tropa de Elite 2 insiste apropriadamente em apresentar é: afinal, figuras como Nascimento e Mathias são um mal necessário? Sim, vivemos numa guerra interminável – como provam os arrastões que ocorreram no Rio de Janeiro na última semana e as ações cada vez mais audaciosas dos bandidos em São Paulo -, mas a escalada da violência promovida pela polícia seria algo construtivo (resposta: violência, por definição, nunca é algo construtivo) ou apenas serviria para piorar o quadro geral?

Se somarmos a isto a inoperância do Estado e os interesses obscuros da mídia (em certo momento da projeção, um jornal se recusa a publicar uma matéria para não prejudicar o governo “parceiro”), a impressão final é a de que estamos realmente nas mãos de indivíduos incapazes e/ou corrompidos até a alma que se preocupam apenas com seus próprios e imediatos objetivos.

Porém, como também defende o roteiro – e com maturidade -, a solução não reside numa revolta adolescente do tipo “Nenhum político presta! Vamos votar no Tiririca!”, já que, queiramos ou não, a solução final (sem trocadilhos nazistas) passa inevitavelmente pela política. E que há bons quadros merecedores de nossos votos e dispostos a lutar pelos interesses da população não restam dúvidas – basta buscarmos informações confiáveis antes de nos colocarmos diante da urna eletrônica.

Esta é uma lição, aliás, que o próprio protagonista eventualmente parece aprender em Tropa de Elite 2, o que talvez se estabeleça como seu grande arco dramático. Vivido com imponência por Wagner Moura, que não só incorpora a segurança absoluta do personagem como também retrata perfeitamente seu envelhecimento gradual (observem seu encurvamento e o óbvio cansaço que passa a demonstrar a partir de certo momento), o coronel Nascimento é um sujeito que reconhece as dificuldades de seu trabalho e os sacrifícios feitos em nome deste – e mesmo que queira, por exemplo, retomar a proximidade com o filho, sua própria natureza vai de encontro a gestos mais intimistas, o que resulta numa cena reveladora na qual, buscando contato com o filho, desafia-o para uma luta de jiu-jitsu que acaba servindo como substituta dos abraços e beijos que ele, embora não consiga, gostaria de dar no garoto.

Enquanto isso, Irandhir Santos atua como contraponto ao coronel em todos os sentidos, já que, além de abominar a violência, o deputado Fraga é um sujeito que claramente não vê problemas em se entregar a arroubos emocionais e que mesmo visivelmente apaixonado por si mesmo (e pelo que julga representar) é o que o filme oferece de mais próximo a uma bússola moral em sua narrativa. Aliás, seria perfeitamente possível dedicar vários parágrafos ao impecável elenco da produção, que, preparado por Fátima Toledo, constrói uma galeria de personagens complexos e multifacetados que honram a arquitetura do roteiro.

Mais uma vez comprovando seu imenso talento para conduzir seqüências de ação, José Padilha mantém a narrativa sempre fluida e confere imensa energia e uma tensão palpável aos confrontos físicos e verbais entre os personagens, sendo auxiliado na tarefa pela fotografia do ótimo Lula Carvalho, que traz realismo e urgência à narrativa, e pelo excepcional montador Daniel Rezende, que aqui também assume a direção de segunda unidade do longa.

Da mesma maneira, o design de som mais uma vez merece destaque ao evocar toda a intensidade dos combates armados, ao passo que a trilha instrumental de Pedro Bromfman ajuda a estabelecer a atmosfera tensa sem recair em clichês.

Contando com sua parcela de frases marcantes que certamente serão repetidas à exaustão pelos fãs do filme (minha favorita é a cínica “Vamos dar saco de bombom pros vagabundos!”), Tropa de Elite 2 talvez demonstre a coragem e a integridade dos realizadores na abordagem de uma questão tão complicada ao colocar nos lábios do coronel Nascimento uma fala breve, mas capaz de despertar uma polêmica infindável que merece, no entanto, ganhar as ruas: “A PM do Rio tem que acabar”.

Se este é um diagnóstico apropriado, uma alternativa viável ou mesmo uma peça da solução (e vale lembrar sempre que um dos responsáveis pelo projeto e pelo argumento é o ex-BOPE Rodrigo Pimentel), é algo que só poderemos concluir através de um amplo debate, mas o fato de trazer uma afirmativa como esta em seu clímax é a prova suficiente de que, embora continuação de uma produção de sucesso, o filme tem aspirações muito mais nobres do que apenas arrancar mais alguns trocados do público – e, só por esta razão, já mereceria respeito.

O fato de ser também um ótimo trabalho é um bem-vindo bônus.

 Por Pablo Villaça


Fonte: Dom Total

quinta-feira, 28 de outubro de 2010

O meu País...

VOTE 77 NO REFERENDO DA HORA ...

Estamos às vésperas do referendo que decidirá sobre o “fuso horário” do Acre. Um país ou uma unidade política qualquer, pode ter horários determinados não condizentes com sua localização no Planeta. Isso ocorre quando o lugar tem um território pequeno; quando sua extensão leste/oeste é estreita, sendo maior no sentido norte sul, ou quando o governo é autoritário e muda os horários conforme suas conveniências econômicas ou políticas. Em qualquer das situações quem paga mais caro pelas mudanças é a população, que tem de estudar, trabalhar, descansar etc. em horários, às vezes, não tão apropriados.

O Acre faz parte de um país imenso tanto no sentido leste-oeste quanto norte-sul. Por isso, nossas variações temporais são tão comuns, se considerarmos o sentido leste-oeste, nos horários diversificados que temos, assim como são comuns as variações climáticas com as temperaturas mais frias e mais quentes quando tomamos com referência o sentido norte-sul.

Tenho visto muita gente na rua, nos bairros, nas igrejas, em todos os lugares, discutindo como ficará o fuso horário do Acre após o dia 31 de outubro.

Primeiro temos de desfazer uma confusão de termos: “fuso horário” e “horário local”. Vamos primeiro entender que o “fuso horário acreano” sempre foi o mesmo, pois ele é dado pela localização do Acre no Planeta, e isto não pode ser mudado por força de uma lei. Portanto, o “fuso horário” nosso é e sempre será o mesmo, isto é, o quarto fuso horário brasileiro ou o quinto fuso em relação à linha de Greenwich.

O que foi mudado no Acre foi nossa “hora legal”. A mudança se baseou em parâmetros que desconsideram o fator natural de nossa localização e a forma da população pensar sobre o assunto. Podemos dizer que foi uma medida errada cientificamente e socialmente arbitrária. Por este motivo defendo o retorno ao antigo e legítimo horário acreano. E justifico cada um dos argumentos:

- O fuso horário de um lugar é um fenômeno de sua localização geográfica no Planeta. Existem profissionais, como geógrafos e cartógrafos, que são especialistas nessas áreas, que vivem no Acre, e foram totalmente ignorados pelo “atropelo do poder e da vaidade” que o autor da lei que mudou a hora do Acre, acreditou ter. Portanto, o primeiro ponto que saliento: o desrespeito para com as ciências da área geográfica e cartográfica e com toda a comunidade acadêmica em geral.

- Nosso organismo reage de forma diferente conforme as variações temporais diárias. Sendo assim, temos mais disposições para dormir à noite e fazer atividades diversas durante o dia. Portanto, o “relógio biológico” de cada humano está vinculado à sua condição de localização no Planeta. Porém, quando mudou o horário do Acre, o então senador Tião Viana (PT-AC), autor da lei, não considerou como a mudança afetaria as condições biológicas das pessoas, com repercussões diretas, inclusive, na saúde de cada acreano.

- A sociedade acreana ao longo de sua formação acostumou com a hora de fuso horário dado por sua localização. Uma mudança de horário, ou qualquer outra que um dia venha a ser feita, caso envolva a sociedade como um todo, tem que ser aceita por todos. Como vivemos num estado democrático, é bom que as autoridades aprendam que a consulta popular apenas reforça os seus propósitos conforme os anseios de seus representados. Isso deveria ser uma prática comum numa sociedade democrática.

- A localização do Acre fez desse território o Estado mais ao oeste do Brasil. Estamos distantes da faixa litorânea Atlântica, onde situam-se as áreas economicamente mais dinâmicas do país. Na época da mudança do horário, argumentavam que este novo horário iria ajudar o “Acre a aproximar mais do Brasil”. Nisso há pontos críticos. Apesar de distante espacialmente do centro, o Acre é Brasil desde 1903. A distância não é um fenômeno que justifica a importância de um lugar. Nos Estados Unidos da América, os centros políticos principais também estão no litoral Atlântico (New York e Washington, por exemplo), mas o estado mais rico daquele país é a Califórnia, que está no litoral Pacífico, em fuso horário diferente. Por isso, a localização do Acre é distante do oceano Atlântico, mas é a porção do território nacional que mais se aproxima do Pacífico. Daí, esta localização que aparentava ser um limitador pode ser um potencial importante para nosso desenvolvimento.

- Diziam as mudanças seriam necessárias para viabilizar o funcionamento bancário, para o horário de programas televisivos e para o comércio. Resultado: os bancos mantiveram o horário, os programas de televisão continuam sendo assistidos por todos, inclusive, nossas crianças (que agora dormem mais tarde). Ao comércio até que serviu para as negociações telefônicas, porém hoje, diante da tecnologia existente, as transações comerciais e financeiras podem ocorrer praticamente em qualquer horário. Também o comércio, em Rio Branco, passou a abrir em horários variáveis -algumas lojas às 7 horas, outras apenas às 9 horas. Até as escolas passaram a iniciar as aulas às 7h30. Sabem por que houve essas adequações de horário interno ao Acre? Porque se seguíssemos o novo horário, as pessoas não chegariam no tempo determinado, mas sim no tempo de seu relógio biológico, que está regulado pelo velho horário ignorado pelo senador. Isso demonstra que o costume das pessoas, de todos nós vivendo em sociedade, onde somos os agentes que preenchem a realidade, inclusive, o mercado consumidor, é que dinamiza a realidade. Então esta mudança não nos serviu.

Dizem as propagandas em defesa do sim que: “já se acostumou, por que mudar?” Será que já acostumamos ou estamos sendo obrigados a nos adequar? Não se desfaz algo construído em 100 anos e se reconstrói em apenas um ano. É bom que pensemos nisto.

Com a economia globalizada, o tempo econômico é ágil. A distância temporal torna-se cada vez mais virtual. As principais bolsas de valores do mundo funcionam em fusos horários diferentes é nem por isto as cidades onde se situam tiveram que adequar seus horários ao de New York, de Londres ou de Tóquio. Então a quem interessou a mudança do horário acreano? Este é um ponto para refletirmos e não cair perante vaidades individuais.

Defendo “o não” à mudança e o retorno ao horário real, por uma questão de defesa ao estado democrático, pelo respeito à opinião do povo acreano, pelo acerto científico de nossa hora. No dia 31, escolha 77.


Por Silvio Simione da Silva,  professor do Centro de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal do Acre.

Fonte: Blog Altino Machado

terça-feira, 26 de outubro de 2010

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Os Avanços Tecnológicos e o Futuro da Humanidade: Querendo ser Deus?


Sinopse

Este livro é uma história da tecnologia que vai dos hominídeos na Pré-História até o século XXI. Mostra como na Pré-História a tecnologia era um instrumento que fazia aumentar a qualidade de vida de todos os humanos e a partir da invenção do dinheiro, passa a ser o mais importante instrumento de dominação, porque se torna serva do Capital/Dinheiro e é usada a favor dos que o possuem. No século XXI a situação é tão grave que esperamos uma gigantesca luta entre os Senhores do Dinheiro e a Mãe Terra, porque esta não agüenta a economia de consumo exagerada em que vivemos. Já estamos consumindo da Terra 30% a mais do que ela é capaz de nos dar. O presente livro apresenta soluções para este problema.

Fonte: Wook

Segundo turno...

                                                                                                     Imagem rio Chandles - Arison
Surpreendeu a votação (quase 20 milhões de votos) recebida por Marina Silva. Votos dados a ela e não ao PV, pois o eleitor vota em pessoas mais que em partidos. Isso coloca algumas questões.


Muitos eleitores de Marina se coligaram pelas redes sociais da internet. Esta funciona, sim, como poderoso palanque virtual. Milhares de pessoas estão permanentemente dialogando através da web. E isso ajuda a formar opinião.

Curioso é constatar que a militância virtual cresce na proporção em que se reduz a do corpo a corpo, do militante que, voluntariamente, saía às ruas, panfletava, pichava muros, distribuía santinhos e vendia brindes para arrecadar fundos de campanha. É lamentável observar a ausência de militância voluntária em eventos eleitorais, substituída por pessoas remuneradas que, por vezes, nada sabem do candidato que propagam.

Ao contrário do que, até agora, supunham PT e PSDB, o tema da preservação ambiental interessa sim ao eleitor. Já não é pauta “apenas dos verdes”. A sociedade, como um todo, está preocupada com o aquecimento global, o desmatamento da Amazônia, a construção de hidrelétricas poluidoras.

Marina Silva se afirmou politicamente como representante de importantes demandas da sociedade que ainda não foram devidamente assumidas pelo PT e o PSDB. Parafraseando Shakespeare, há mais coisas entre a esquerda e a direita do que supõem os atuais caciques partidários. Criou-se, assim, uma fissura, quebrando a polarização bipartidária. E, para muitos, abriu-se uma nova janela de esperança.

A candidatura de Marina Silva ajudou a bloquear o suposto caráter plebiscitário do primeiro turno. Agora, Dilma e Serra têm que, obrigatoriamente, debater propostas e programas de governo. O eleitor não quer saber se FHC ou Lula foi melhor presidente. Interessa-lhe o futuro: como promover o desenvolvimento sustentável? Como o Estado pode oferecer mais eficientes segurança pública e sistemas de educação e saúde? Como a Amazônia e as nossas florestas serão preservadas?

Marina é neófita no PV. E assim como Lula é maior que o PT, ela também é maior que o PV. E a história do PV está marcada, como ocorre nos outros partidos, por contradições. Participou do governo Lula (ministério da Cultura) e, em nível estadual, do governo Serra em São Paulo (secretaria do Meio Ambiente) e, no Rio, apoiou César Maia (DEM) candidato a senador.

O PV poderá continuar em cima do muro ou até mesmo deixar-se seduzir pelo canto das sereias e aceitar propostas de cargos no futuro governo federal. Marina não. Ela tem uma história de coerência e testemunho ético. Portanto, a candidata do PV não tem o direito de manter-se neutra no segundo turno.

Em política, neutralidade é omissão. Nenhum aspecto de nossas vidas – da qualidade do café da manhã ao transporte que utilizamos – escapa ao âmbito da política. E Marina não veio de Marte. Veio do Acre, das Comunidades Eclesiais de Base, da escola ambiental de Chico Mendes, do PT pelo qual se elegeu senadora e graças ao qual se tornou ministra do Meio Ambiente em dois mandatos de Lula.

O eleitor espera que Marina se posicione, e o faça em coerência com sua história de militância e seus princípios éticos e ideológicos. Seria uma decepção vê-la em cima do muro para observar melhor os dois lados… Fiel não é apenas quem abraça convicto determinada religião. Há que ter fidelidade também à trajetória que permite a Marina se destacar, hoje, como uma das mais importantes lideranças políticas do Brasil.

O que está em jogo, agora, não é o futuro eleitoral da senadora Marina Silva e seu rico patrimônio político de quase 20 milhões de votos. É o futuro imediato do Brasil. Nos próximos quatro anos, a influência dela pesará nos rumos de nosso país. Por isso, é preciso que, embora adepta do verde, ela amadureça o quanto antes o seu posicionamento entre os dois projetos de Brasil em questão.

Por Frei Betto

Fonte Dom Total

sábado, 23 de outubro de 2010

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

Meu Ideal Seria Escrever...

                                                                                                                         Thomas Kinkade
 Meu ideal seria escrever uma história tão engraçada que aquela moça que está doente naquela casa cinzenta quando lesse minha história no jornal risse, risse tanto que chegasse a chorar e dissesse -- "ai meu Deus, que história mais engraçada!". E então a contasse para a cozinheira e telefonasse para duas ou três amigas para contar a história; e todos a quem ela contasse rissem muito e ficassem alegremente espantados de vê-la tão alegre. Ah, que minha história fosse como um raio de sol, irresistivelmente louro, quente, vivo, em sua vida de moça reclusa, enlutada, doente. Que ela mesma ficasse admirada ouvindo o próprio riso, e depois repetisse para si própria -- "mas essa história é mesmo muito engraçada!".

Que um casal que estivesse em casa mal-humorado, o marido bastante aborrecido com a mulher, a mulher bastante irritada com o marido, que esse casal também fosse atingido pela minha história. O marido a leria e começaria a rir, o que aumentaria a irritação da mulher. Mas depois que esta, apesar de sua má vontade, tomasse conhecimento da história, ela também risse muito, e ficassem os dois rindo sem poder olhar um para o outro sem rir mais; e que um, ouvindo aquele riso do outro, se lembrasse do alegre tempo de namoro, e reencontrassem os dois a alegria perdida de estarem juntos.

Que nas cadeias, nos hospitais, em todas as salas de espera a minha história chegasse -- e tão fascinante de graça, tão irresistível, tão colorida e tão pura que todos limpassem seu coração com lágrimas de alegria; que o comissário do distrito, depois de ler minha história, mandasse soltar aqueles bêbados e também aqueles pobres mulheres colhidas na calçada e lhes dissesse -- "por favor, se comportem, que diabo! Eu não gosto de prender ninguém!" . E que assim todos tratassem melhor seus empregados, seus dependentes e seus semelhantes em alegre e espontânea homenagem à minha história.
E que ela aos poucos se espalhasse pelo mundo e fosse contada de mil maneiras, e fosse atribuída a um persa, na Nigéria, a um australiano, em Dublin, a um japonês, em Chicago -- mas que em todas as línguas ela guardasse a sua frescura, a sua pureza, o seu encanto surpreendente; e que no fundo de uma aldeia da China, um chinês muito pobre, muito sábio e muito velho dissesse: "Nunca ouvi uma história assim tão engraçada e tão boa em toda a minha vida; valeu a pena ter vivido até hoje para ouvi-la; essa história não pode ter sido inventada por nenhum homem, foi com certeza algum anjo tagarela que a contou aos ouvidos de um santo que dormia, e que ele pensou que já estivesse morto; sim, deve ser uma história do céu que se filtrou por acaso até nosso conhecimento; é divina".

E quando todos me perguntassem -- "mas de onde é que você tirou essa história?" -- eu responderia que ela não é minha, que eu a ouvi por acaso na rua, de um desconhecido que a contava a outro desconhecido, e que por sinal começara a contar assim: "Ontem ouvi um sujeito contar uma história...".

E eu esconderia completamente a humilde verdade: que eu inventei toda a minha história em um só segundo, quando pensei na tristeza daquela moça que está doente, que sempre está doente e sempre está de luto e sozinha naquela pequena casa cinzenta de meu bairro.

Por Rubem Braga

A crônica acima foi extraída do livro "A traição das elegantes", Editora Sabiá - Rio de Janeiro, 1967, pág. 91.

Saiba tudo sobre o autor e sua obra em "Biografias".

© Projeto Releituras: Arnaldo Nogueira Jr: 14/10/2010 - 10:10:52

Fonte: Releituras - Textos

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Hinos para a Noite...

... "(...) Seus olhos amados lacrimejam sobre a tumba... lágrimas graves de júbilo, lágrimas emocionadas, lágrimas de graça eterna, sempre renovadas; com felicidade observam-no a erguer-se novamente, e contemplaram seu lamento fervoroso e suave sobre o seio abençoado da mãe, a andar em comunhão pensativa com seus amigos, murmurando palavras como que arrebatadas da árvore da vida; vêem a ti, partindo saudoso para os braços do pai, levando consigo a jovem Humanidade, e a inexaurível taça de um futuro dourado. Logo a mãe juntou-se a ti em triunfo celeste, e era a primeira pessoa contigo na nova morada. Desde então, eras fluíram, e num esplendor sempre maior tens se dedicado à nova criação, e milhares seguiram a ti, em meio a dores e torturas, plenos de fé e desejosos pela verdade, andam contigo e a virgem celestial no reino do Amor, e serão para sempre teus, ministro do templo da Morte celestial"...
A pedra é elevada,
E toda a humanidade ergue-se;
Todos nós residimos em ti,
Desaparecemos em nossa prisão.
Todos os tormentos se foram
Diante da taça dourada;
Pois nem a vida nem o mundo podem estar
Na mesa em que ceamos com o Senhor.
Ao casamento a Morte convida;
E nenhuma virgem tarda;
As lamparinas queimam vistosas;
Sem necessitarem de óleo algum.
Teus pés ao longe despertam
Ecos em nossas sendas!
E as estrelas criam símbolos
E doces vozes!
Dez mil corações aspiram
A ti, ó nobre mãe;
Nesta vida, carregados de tristezas,
Desejam apenas a ti;
Em ti espera a cura;
Em ti espera o repouso seguro,
Quando, selando sua segurança,
O abraçará contra teu peito.
Os que repousam no inferno
Queimam desapontados,
Pois por fim, ao te verem
Fogem deste mundo:
E tu apareces em auxílio,
A nós, em meio às dores:
Agora estamos mais próximos de tua morada,
E nunca mais iremos embora!
Agora não existem mais lágrimas
Que amor e preces junto aos túmulos;
O dom que o Amor concede
Não será mais roubado de ninguém.
Para apaziguar e aquietar a saudade
Vem a noite, e acalma os sábios;
A multidão de filhos do Céu nos envolve
Zela por nós e guarda nosso coração.
Coragem! pois esta vida ruma
Para uma vida sem fim adiante;
O sentido, amoroso, aguardando,
Torna-se claro e forte.
Um dia as estrelas, caindo,
Devem fluir como vinho dourado:
E nós, sorvendo tal néctar,
Brilharemos como estrelas vivas!
Livre, o amor emerge da tumba,
Para não morrer nunca mais;
Em plenitude, a vida eleva-se e ondeia
Qual mar sem limites!
Toda noite há uma deliciosa tarefa!
Uma ode de júbilo!
E o sol de todos nossos prazeres
É a face de Deus!..

(Novalis 1772 – 1801)

Fonte: Internet

quinta-feira, 14 de outubro de 2010

La Vita è Rosa...

O País da Imaginação...

 
                                                                                                                                         Imagem MSN
Em Benjamim e Raízes do Brasil, obras de Chico Buarque e de Sérgio Buarque de Holanda, respectivamente, há a caracterização da ausência de uma finalidade para a vida e para a história. A passagem do individual ao coletivo, e a sua justa interpretação, é um tema que, nos livros em foco, questiona a descontinuidade e a precariedade de certas narrativas históricas, tradicionalmente amparadas numa lógica com sentido determinado, com finalidade e com certezas previamente estabelecidas. Percebe-se, assim, que a escrita da história humana tem caráter inconcluso, incerto, quanto ao seu sentido.

Chico Buarque, em sua obra, apresenta uma configuração do ser humano numa época de miragens e de protótipos. Verifica-se que a construção da identidade de seu protagonista é erguida sobre ilusões, fantasias e faíscas imaginárias. Benjamim tem a sensação de estar sempre sendo filmado. A idéia de tudo ver, com todos os olhos, não é mais do que uma possibilidade lógica, que no entanto se consome no mesmo tempo em que se acredita tê-la alcançado, como no instante anterior à morte da personagem narrada na cena inicial do livro (a narrativa começa pelo fim). A trama, ao se desenrolar sob o signo da morte, aponta, talvez, para a abolição do futuro, na medida em que não atinge qualquer finalidade. O que há é a impossibilidade da escrita do futuro, porque o gozo é constituído por meio do jogo com os resquícios do passado.

Sérgio Buarque de Holanda ressalta, por sua vez, a especificidade temporal da realidade histórica do Brasil. Reconstrói, por meio da comparação, os aspectos do processo de formação da sociedade e da mentalidade dos brasileiros em suas mudanças, em seu devir, libertando-se de esquemas teóricos e de preconceitos. O aventureiro e o trabalhador, o espanhol e o português, são tipos ideais, que não existem "na realidade", ou seja, que se explicam nas suas diferenças e oposições, mas que somente puderam existir depois da análise minuciosa das fontes pelo historiador. Portanto, o "homem cordial" não existe, sendo apenas a condensação de um núcleo de atitudes recorrentes, que, reunidas num tipo ideal, permitem compreender uma certa constante na história brasileira, que é a prevalência do âmbito pessoal sobre o âmbito político, o qual deveria, por princípio, reger-se impessoalmente. Essa interpretação dos subterrâneos (raízes) do País aponta para a impossibilidade trágica da formação de um espaço público no Brasil.

O sentido da revolução brasileira em Sérgio Buarque de Holanda seria uma racionalização progressiva da sociedade tradicional, dominada por valores afetivos, familiares. Portanto, uma modernização baseada na separação entre o afetivo/privado e o racional/público. Assim, a modernização representaria uma mudança de mentalidade e um estabelecimento de regras universais que atingissem a todos, independentemente da sua origem familiar e de suas relações pessoais e políticas. Seu desejo é o de uma organização racional da sociedade, na qual todos possam encontrar o seu lugar e se expressar, de forma original, segundo regras universais e consensuais (cidadania).

Por Mauro Gaglietti* e Eliane Colussi**


*Mauro Gaglietti é Professor da Universidade de Passo Fundo (UPF). Doutor em História/PUCRS, Mestre em Ciência Política/UFRGS, Especialista em História/UFSM e Graduado em Licenciatura em História/UFSM.

FONTE: Internet

terça-feira, 12 de outubro de 2010

Nossa Senhora, valei-me minha Santa!...

Cubra-me com seu manto de amor
Guarda-me na paz desse olhar
Cura-me as feridas e a dor me faz suportar
Que as pedras do meu caminho
Meus pés suportem pisar
Mesmo ferido de espinhos me ajude a passar
Se ficaram mágoas em mim
Mãe tira do meu coração
E aqueles que eu fiz sofrer peço perdão
Se eu curvar meu corpo na dor
Me alivia o peso da cruz
Interceda por mim minha mãe junto a Jesus

Nossa Senhora me de a mão
Cuida do meu coração
Da minha vida do meu destino
Nossa Senhora me dê a mão
Cuida do meu coração
Da minha vida do meu destino
Do meu caminho
Cuida de mim

Sempre que o meu pranto rolar
Ponha sobre mim suas mãos
Aumenta minha fé e acalma o meu coração
Grande é a procissão a pedir
A misericórdia o perdão
A cura do corpo e pra alma a salvação
Pobres pecadores oh mãe
Tão necessitados de vós
Santa Mãe de Deus tem piedade de nós
De joelhos aos vossos pés
Estendei a nós vossas mãos
Rogai por todos nós vossos filhos meus irmãos

Nossa Senhora me de a mão
Cuida do meu coração
Da minha vida do Meu destino
Do meu caminho
Cuida de mim...

Roberto Carlos

Composição: Roberto Carlos / Erasmo

Meu Mundo Lunático...

No Mundo da Lua...

A Bela Adormecida...

Era uma vez, há muito tempo, um rei e uma rainha jovens, poderosos e ricos, mas pouco felizes, porque não tinham concretizado maior sonho deles: terem filhos.
— Se pudéssemos ter um filho! — suspirava o rei.
— E se Deus quisesse, que nascesse uma menina! —animava-se a rainha.
— E por que não gêmeos? — acrescentava o rei.
Mas os filhos não chegavam, e o casal real ficava cada vez mais triste. Não se alegravam nem com os bailes da corte, nem com as caçadas, nem com os gracejos dos bufões, e em todo o castelo reinava uma grande melancolia.

Mas, numa tarde de verão, a rainha foi banhar-se no riacho que passava no fundo do parque real. E, de repente, pulou para fora da água uma rãzinha.
— Majestade, não fique triste, o seu desejo se realizará logo: Antes que passe um ano a senhora dará à luz uma menina.

E a profecia da rã se concretizou, e meses depois a rainha deu a luz a uma linda menina.
O rei, que estava tão feliz, deu uma grande festa de batizado para a pequena princesa que se chamava Aurora.
Convidou uma multidão de súditos: parentes, amigos, nobres do reino e, como convidadas de honra, as treze fadas que viviam nos confins do reino. Mas, quando os mensageiros iam saindo com os convites, o camareiro-mor correu até o rei, preocupadíssimo.
— Majestade, as fadas são treze, e nós só temos doze pratos de ouro. O que faremos? A fada que tiver de comer no prato de prata, como os outros convidados, poderá se ofender. E uma fada ofendida…

O rei refletiu longamente e decidiu:
— Não convidaremos a décima terceira fada — disse, resoluto. — Talvez nem saiba que nasceu a nossa filha e que daremos uma festa. Assim, não teremos complicações.
Partiram somente doze mensageiros, com convites para doze fadas, conforme o rei resolvera.
No dia da festa, cada uma das fadas chegou perto do berço em que dormia a princesa Aurora e ofereceu à recém-nascida um presente maravilhoso.
— Será a mais bela moça do reino — disse a primeira fada, debruçando-se sobre o berço.
— E a de caráter mais justo — acrescentou a segunda.
— Terá riquezas a perder de vista — proclamou a terceira.
— Ninguém terá o coração mais caridoso que o seu — afirmou a quarta.
— A sua inteligência brilhará como um sol — comentou a quinta.

Onze fadas já tinham passado em frente ao berço e dado a pequena princesa um dom; faltava somente uma (entretida em tirar uma mancha do vestido, no qual um garçom desajeitado tinha virado uma taça de sorvete) quando chegou a décima terceira, aquela que não tinha sido convidada por falta de pratos de ouro.

Estava com a expressão muito sombria e ameaçadora, terrivelmente ofendida por ter sido excluída. Lançou um olhar maldoso para a princesa Aurora, que dormia tranqüila, e disse: — Aos quinze anos a princesa vai se ferir com o fuso de uma roca e morrerá.

E foi embora, deixando um silêncio desanimador e os pais desesperados.
Então aproximou-se a décima segunda fada, que devia ainda oferecer seu presente.
— Não posso cancelar a maldição que agora atingiu a princesa. Tenho poderes só para modificá-la um pouco. Por isso, Aurora não morrerá; dormirá por cem anos, até a chegada de um príncipe que a acordará com um beijo.

Passados os primeiros momentos de espanto e temor, o rei, decidiu tomar providências, mandou queimar todas as rocas do reino. E, daquele dia em diante, ninguém mais fiava, nem linho, nem algodão, nem lã. Ninguém além da torre do castelo.
Aurora crescia, e os presentes das fadas, apesar da maldição, estavam dando resultados. Era bonita, boa, gentil e caridosa, os súditos a adoravam.

No dia em que completou quinze anos, o rei e a rainha estavam ausentes, ocupados numa partida de caça. Talvez, quem sabe, em todo esse tempo tivessem até esquecido a profecia da fada malvada.
A princesa Aurora, porém, estava se aborrecendo por estar sozinha e começou a andar pelas salas do castelo. Chegando perto de um portãozinho de ferro que dava acesso à parte de cima de uma velha torre, abriu-o, subiu a longa escada e chegou, enfim, ao quartinho.

Ao lado da janela estava uma velhinha de cabelos brancos, fiando com o fuso uma meada de linho. A garota olhou, maravilhada. Nunca tinha visto um fuso.
— Bom dia, vovozinha.
— Bom dia a você, linda garota.
— O que está fazendo? Que instrumento é esse?

Sem levantar os olhos do seu trabalho, a velhinha respondeu com ar bonachão:
— Não está vendo? Estou fiando!

A princesa, fascinada, olhava o fuso que girava rapidamente entre os dedos da velhinha.
— Parece mesmo divertido esse estranho pedaço de madeira que gira assim rápido. Posso experimentá-lo também? Sem esperar resposta, pegou o fuso. E, naquele instante, cumpriu-se o feitiço. Aurora furou o dedo e sentiu um grande sono. Deu tempo apenas para deitar-se na cama que havia no aposento, e seus olhos se fecharam.

Na mesma hora, aquele sono estranho se difundiu por todo o palácio.
Adormeceram no trono o rei e a rainha, recém-chegados da partida de caça.
Adormeceram os cavalos na estrebaria, as galinhas no galinheiro, os cães no pátio e os pássaros no Telhado...
Adormeceu o cozinheiro que assava a carne e o servente que lavava as louças; adormeceram os cavaleiros com as espadas na mão e as damas que enrolavam seus cabelos.
Também o fogo que ardia nos braseiros e nas lareiras parou de queimar, parou também o vento que assobiava na floresta. Nada e ninguém se mexia no palácio, mergulhado em profundo silêncio.

Em volta do castelo surgiu rapidamente uma extensa mata. Tão extensa que, após alguns anos, o castelo ficou oculto.
Nem os muros apareciam, nem a ponte levadiça, nem as torres, nem a bandeira hasteada que pendia na torre mais alta.
Nas aldeias vizinhas, passava de pai para filho a história da princesa Aurora, a bela adormecida que descansava, protegida pelo bosque cerrado. A princesa Aurora, a mais bela, a mais doce das princesas, injustamente castigada por um destino cruel.

Alguns cavalheiros, mais audaciosos, tentaram sem êxito chegar ao castelo. A grande barreira de mato e espinheiros, cerrada e impenetrável, parecia animada por vontade própria: os galhos avançavam para cima dos coitados que tentavam passar: seguravam-nos, arranhavam-nos até fazê-los sangrar, e fechavam as mínimas frestas.
Aqueles que tinham sorte conseguiam escapar, voltando em condições lastimáveis, machucados e sangrando. Outros, mais teimosos, sacrificavam a própria vida.

Um dia, chegou nas redondezas um jovem príncipe, bonito e corajoso. Soube pelo bisavô a história da bela adormecida que, desde muitos anos, tantos jovens a procuravam em vão alcançar.
— Quero tentar também — disse o príncipe aos habitantes de uma aldeia pouco distante do castelo.
Aconselharam-no a não ir. — Ninguém nunca conseguiu!
— Outros jovens, fortes e corajosos como você, falharam…
— Alguns morreram entre os espinheiros…
— Desista!
Muitos foram, os que tentarem desanimá-lo.
No dia em que o príncipe decidiu satisfazer a sua vontade se completavam justamente os cem anos da festa do batizado e das predições das fadas. Chegara, finalmente, o dia em que a bela adormecida poderia despertar.

Quando o príncipe se encaminhou para o castelo viu que, no lugar das árvores e galhos cheios de espinhos, se estendiam aos milhares, bem espessas, enormes carreiras de flores perfumadas. E mais, aquela mata de flores cheirosas se abriu diante dele, como para encorajá-lo a prosseguir; e voltou a se fechar logo, após sua passagem.

O príncipe chegou em frente ao castelo. A ponte elevadiça estava abaixada e dois guardas dormiam ao lado do portão, apoiados nas armas. No pátio havia um grande número de cães, alguns deitados no chão, outros encostados nos cantos; os cavalos que ocupavam as estrebarias dormiam em pé.

Nas grandes salas do castelo reinava um silêncio tão profundo que o príncipe ouvia sua própria respiração, um pouco ofegante, ressoando naquela quietude. A cada passo do príncipe se levantavam nuvens de poeira.

Salões, escadarias, corredores, cozinha… Por toda parte, o mesmo espetáculo: gente que dormia nas mais estranhas posições.
O príncipe perambulou por longo tempo no castelo. Enfim, achou o portãozinho de ferro que levava à torre, subiu a escada e chegou ao quartinho em que dormia A princesa Aurora.

A princesa estava tão bela, com os cabelos soltos, espalhados nos travesseiros, o rosto rosado e risonho. O príncipe ficou deslumbrado. Logo que se recobrou se inclinou e deu-lhe um beijo.

Imediatamente, Aurora despertou, olhou par ao príncipe e sorriu.
Todo o reino também despertara naquele instante.
Acordou também o cozinheiro que assava a carne; o servente, bocejando, continuou lavando as louças, enquanto as damas da corte voltavam a enrolar seus cabelos.
O fogo das lareiras e dos braseiros subiu alto pelas chaminés, e o vento fazia murmurar as folhas das árvores. A vida voltara ao normal. Logo, o rei e a rainha correram à procura da filha e, ao encontrá-la, chorando, agradeceram ao príncipe por tê-la despertado do longo sono de cem anos.

O príncipe, então, pediu a mão da linda princesa em casamento que, por sua vez, já estava apaixonada pelo seu valente salvador.
Eles, então, se casaram e viveram felizes para sempre!


Fonte: QDivertido.com.br - brincadeiras, histórias, cantigas, desenhos para colorir, jogos infantis e mais.

domingo, 10 de outubro de 2010

No Teu Olhar...

Amor é fogo que arde sem se ver...

                                                                    Imagem  Blog Leves & Ausentes
Amor é um fogo que arde sem se ver;
É ferida que dói e não se sente;
É um contentamento descontente;
É dor que desatina sem doer.
É um não querer mais que bem querer;
É um andar solitário entre a gente;
É nunca contentar-se de contente;
É um cuidar que ganha em se perder.

É querer estar preso por vontade;
É servir a quem vence o vencedor;
É ter com quem nos mata lealdade...

__________________________

Transforma-se o amador na cousa amada,
Por virtude do muito imaginar;
Não tenho logo mais que desejar,
Pois em mim tenho a parte desejada.
Se nela está minha alma transformada,
Que mais deseja o corpo de alcançar?
Em si somente pode descansar,
Pois consigo tal alma está liada.

Mas esta linda e pura semideia,
Que, como um acidente em seu sujeito,
Assim com a alma minha se conforma,

Está no pensamento como ideia;
O vivo e puro amor de que sou feito,
como a matéria simples busca a forma...

Luís Vaz de Camões (1524-1580)

sexta-feira, 8 de outubro de 2010

O Alef...

A Tia Julia e o Escrevedor...

"A Tia Júlia e o Escrevedor é um dos livros mais originais de Vargas Llosa. Conta a história de Varguitas, um jovem peruano com ambições literárias, que se apaixona por uma tia com quase o dobro da sua idade"...

Ironia e romance em doses perfeitas, memórias autobiográficas e criação literária magistral fazem deste livro um clássico da literatura contemporânea.»
«Marito» ou «Varguitas» vive com os avós porque os seus pais se encontram no estrangeiro, trabalha na rádio e começa a introduzir-se na literatura. É neste momento que inicia a sua relação com a sua tia Julia, que tem quase o dobro da sua idade, e com a qual acaba por se casar apesar da oposição da família. Também é nesta altura que conhece a sua primeira inspiração, Pedro Camacho, autor de guiões de rádio cujas histórias se entrelaçam com as aventuras do protagnista. O tórrido romance com ares shakespearianos entre a tia Julia e o aprendiz de romancista, que a sociedade limenha dos anos cinquenta tenta impedir, combina-se incessantemente com as narrações truculentas e delirantes do folhetinista das ondas...

Fonte: Feira das Letras

Em Outras Palavras...

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Que República se comemora em 2010?...


                                                    Imagem Selecções Reader’s Digest
“Do historiador Rui Ramos sobre os ideais republicanos e a pertinência de celebrar um século sobre a sua implantação”...

Em 2010, a propósito do “centenário da república”, vamos comemorar o quê? Uma ideia – a ideia de república? Um acontecimento – o derrube revolucionário da monarquia constitucional nas ruas de Lisboa em 5 de Outubro de 1910? Ou um regime – o que resultou do monopólio do Estado e do constrangimento da vida pública por um partido da esquerda radical, o Partido Republicano Português, entre 1910 e 1926? Talvez alguém, um dia, nos venha explicar o que significa a efeméride. Entretanto, examinemos as hipóteses, antes de reflectir um pouco sobre a especulação político-partidária que pode estar por detrás de tudo isto.

UMA IDEIA?

Se é para comemorar a ideia de república, a escolha do 5 de Outubro de 1910 não é a mais feliz, embora seja há muito tempo feriado nacional. É que aquilo que desde o séc. XVIII interessou aos verdadeiros “republicanos” nunca foi saber se o chefe de Estado é electivo ou não mas o tipo de Estado e vida pública. O ideal republicano era o de uma comunidade de cidadãos independentes a viver sujeitos às leis e não ao arbítrio de outros homens, mesmo que tivessem um rei, como a Grã-Bretanha.

Nesse sentido, o processo de republicanização não foi obra da revolução de 1910 mas da chamada “revolução liberal” da primeira metade do séc. XIX: foram os liberais que reduziram o rei a um chefe de Estado com poderes definidos por uma constituição e que estabeleceram em Portugal o princípio do Estado de Direito e as instituições e cultura da cidadania.

Na prática, os liberais fizeram da monarquia constitucional o que eles referiam como “uma república com um rei”, isto é, uma comunidade de cidadãos livres com um chefe de Estado dinástico. A Câmara dos Pares estava aberta a todos os que satisfizessem requisitos legais que nada tinham a ver com o nascimento. A Igreja ainda era oficial (como, aliás, nas repúblicas desse tempo) mas havia liberdade de consciência e estava previsto o registo civil.

Nesse sentido, se as comemorações de 2010 visam celebrar o fim da monarquia constitucional, governada pelos liberais, estaremos então perante uma festa reaccionária para vitoriar o fim de um regime que trouxe as instituições do Estado moderno, a extinção das ordens religiosas, o Código Civil e o maior eleitorado, em termos proporcionais, antes de 1975?

Em 1910, é verdade, a monarquia constitucional estava em grandes apuros. Tinha uma classe política desacreditada e incapaz de assegurar bom governo e o jovem rei D. Manuel II era atacado por quase toda a gente, da direita e da esquerda. O Partido Republicano Português, um movimento sobretudo lisboeta, conseguira criar um sério problema de ordem pública que a monarquia constitucional nunca poderia ter resolvido sem se negar a si própria, tornando-se num regime repressivo, o que a sua classe política não podia aceitar. Quando o PRP resolveu tentar a sua sorte, em Outubro de 1910, subvertendo a guarnição de Lisboa, quase ninguém apareceu para defender o regime.

Tudo isto é verdade. Mas se o objectivo é celebrar a morte de sistemas políticos apodrecidos, ignorando o que se lhe seguiu, não deveríamos comemorar também o 28 de Maio de 1926, que pôs fim a um regime desacreditado?

UM REGIME?

Gostamos de contrastar o actual regime democrático, desde 1974, com a ditadura do Estado Novo (1933-1974). Mas o regime implantado em Portugal em 1910 e que durou até 1926, a chamada I República, tem tão pouco a ver com a actual democracia como o salazarismo. A I República passou por várias situações e foi dirigida por várias personalidades. Mas na sua versão dominante, associada ao monopólio do poder pelo Partido Republicano Português de Afonso Costa, foi um dos regimes mais intolerantes, exclusivistas e violentos do séc. XX em Portugal.

A “democracia” do PRP assentou na redução do eleitorado através da negação do direito de voto aos analfabetos: durante a monarquia, puderam votar 70% dos homens adultos em Portugal; com a I República, essa percentagem reduziu-se a 30%. A “tolerância” de Afonso Costa consistiu numa guerra de morte à Igreja Católica, sujeita a uma “lei de separação” que visava, de facto, o contrário: a sujeição do clero e dos católicos à prepotência e arbítrio de um Estado hostil. Críticos e oposicionistas ficaram sujeitos à violência dos ‘gangs’ armados do PRP, que em 1911 trataram de destruir (dizia-se então “empastelar”) todos os jornais ditos “monárquicos” em Lisboa.

A I República foi ainda o primeiro regime a excluir expressamente as mulheres da vida cívica, ao negar-lhes por lei o direito de voto. Nas colónias de África, seguiu uma política dura e racista, que em 1915 chegou ao genocídio das populações do Sul de Angola. Afonso Costa forçou ainda a entrada de Portugal na I Guerra Mundial (1914-1918). Em dois anos, houve quase tantos mortos como nos 13 anos de guerras coloniais entre 1961 e 1974. É com este regime que a nova democracia portuguesa quer identificar-se em 2010?

O que explica então esta fúria comemorativa? Fundamentalmente, as metamorfoses da esquerda. As esquerdas portuguesas, há 30 anos, eram marxistas, de linha soviética, maoista ou social-democrata “avançada”. Desprezavam os velhos republicanos, patriotas e colonialistas, de que uma parte até aderira ao Estado Novo na década de 1960, por causa das colónias (Norton de Matos, por exemplo, tornou–se uma referência da propaganda colonial salazarista). Basta ler os livros de História publicados na década de 1970 por autores marxistas: o republicanismo era para eles uma coisa “pequeno-burguesa”, de caixeiros com bigodes.

Depois do 25 de Abril de 1974, o coronel Vasco Gonçalves, na tomada de posse do II Governo Provisório, em Julho, avisou logo que a revolução não tinha sido feita para voltar “ao triste passado de antes de 1926″. Exactamente: a república, para as esquerdas portuguesas em 1974, era um “triste passado”. Aliás, um dos partidos logo convidados para integrar o Governo Provisório foi o Partido Popular Monárquico, por via do arquitecto Gonçalo Ribeiro Telles. Tanto Álvaro Cunhal como Mário Soares, filhos de antigos republicanos, evitaram o anticlericalismo, até para poderem conviver com os “católicos progressistas”, que formaram uma das principais componentes das esquerdas portuguesas na década de 1970.

A Democracia em Portugal, entre 1974 e 1976, foi construída contra o Estado Novo mas também contra a I República. Desde logo, constitucionalmente. Ninguém queria o parlamentarismo e o desregramento dos partidos. Por isso, a Constituição de 1976 inspirou-se na monarquia constitucional, ao estabelecer um Presidente da República que, à parte o ser eleito por sufrágio universal, tinha os mesmos poderes do Rei da Carta Constitucional de 1826. Por essa via, o regime com o qual, de facto, a actual democracia tem mais em comum é a monarquia constitucional de 1826-1910.

As esquerdas portuguesas só mudaram de opinião perante a velha república quando deixaram de ser marxistas e de querer fazer em Portugal uma revolução socialista. Para se distinguirem de uma direita cujo modelo de liberalização económica aceitaram numa forma mitigada, começaram a valorizar outra vez os “valores republicanos”, como fez a esquerda socialista francesa, e sobretudo adoptaram o programa de “fracturas culturais” da esquerda americana.

A fim de dar profundidade histórica a esta reconfiguração ideológica, identificaram-se com o laicismo anticlerical da velha I República. Mais: ocorreu-lhes que identificar esta democracia com a I República de 1910-1926 seria a maneira de legitimar oficialmente o exclusivismo de esquerda e fazer com que os liberais e os conservadores não se sentissem em casa no actual regime. O resultado é um travesti histórico. Os velhos republicanos de 1910 eram profundamente patriotas, machistas e homofóbicos. Foi a I República que, em 1922-1923, proibiu e mandou apreender a ‘Sodoma Divinizada’ de Raul Leal e as ‘Canções’ de António Botto, das primeiras defesas abertas da homossexualidade em Portugal. Que diriam os déspotas do PRP se soubessem que a comissão do centenário pensou em comemorá-los com o casamento gay? Saberiam apreciar a ironia da História?

REPÚBLICAS HÁ MESMO MUITAS

A Coreia do Norte é uma república, tal como Portugal; a Bélgica uma monarquia. O actual regime português tem, felizmente, mais a ver com a Bélgica do que com a Coreia do Norte. A nossa República Portuguesa, desde 1910, já foi muita coisa, com situações constitucionais diversas: a I República (1910-17), a República Nova (1918), outra vez a I República (1919-26), a Ditadura Militar (1926-33), o Estado Novo (1933-74), o PREC (1974-76), a Democracia (a partir de 76). Comemorar a implantação é comemorar o quê? Todos esses regimes? Só um deles – e qual?

REPÚBLICA PARA TODOS OS PORTUGUESES

O grande problema da I República de 1910-26 foi saber-se se era um regime aberto a todos os portugueses ou só para alguns. Os líderes do dominante Partido Republicano Português de Afonso Costa, situado na esquerda radical, achavam que devia ser só para os militantes do seu partido, que monopolizavam o Governo e todos os empregos no Estado. Recusavam o princípio da alternância no poder (”na república não se governa para a direita”) e qualquer desvio à linha anticatólica.

Outros republicanos – como os Presidentes Manuel de Arriaga e Sidónio Pais e o “fundador da república”, Machado dos Santos – quiseram, pelo contrário, fazer uma “república para todos os portugueses”, isto é, conciliadora com a Igreja Católica e aberta à participação no espaço público de quem não era militante dos republicanos ou não tinha ideias de esquerda. Por isso, Arriaga foi deposto em 1915 e Sidónio e Machado dos Santos assassinados (em 1918 e 1921).

DO GOVERNO DA REPÚBLICA PELO REI

É o título de um livro de Diogo Lopes Rebelo publicado em 1496, no tempo do rei D. Manuel I. Como salientou o historiador Vitorino Magalhães Godinho, os reis e as cortes portuguesas a partir do século XV sempre pensaram no reino de Portugal como uma “república” no sentido clássico: um governo em que, independentemente da origem do poder dos governantes, estes regiam o Estado tendo em conta o bem público e de uma maneira regular e legal, sem arbítrio pessoal.

Mais tarde, sobretudo a partir do século XVIII, acrescentou-se a esta ideia de república o princípio da participação dos cidadãos no governo, através de instituições representativas e em nome da soberania da nação. A monarquia constitucional portuguesa, no século XIX, foi esse tipo de “república”. Portugal já era, neste sentido, “republicano” muito antes de 1910.

UM OUTRO 5 DE OUTUBRO: O DE 1143

“Cinco de Outubro? É o dia da verdadeira independência de Portugal!”, diz o líder do Partido Popular Monárquico. Mas Nuno da Câmara Pereira refere-se a outro 5 de Outubro, mais recuado no tempo e crucial na fundação do Reino de Portugal: o de 1143. Assinou-se então o Tratado de Zamora, início da independência portuguesa. Este tratado, fundador da nacionalidade, foi o resultado da conferência de paz entre Afonso Henriques e o rei Afonso VII de Leão e Castela, precisamente a 5 de Outubro de 1143.

Lamentando que seja celebrado apenas pelos monárquicos, Câmara Pereira lembra que já propôs ao PS que o 5 de Outubro passasse a ser o ‘Dia da Bandeira’, em que “todos os portugueses, da esquerda à direita, dos monárquicos aos republicanos, celebrassem o dia da pátria”.

NOTAS:

PORTO

Só um dia depois da revolução em Lisboa, a 6 de Outubro, é que foi proclamada a república no Porto.

GNR

A Guarda Nacional Republicana foi criada a 12 de Outubro e substituiu as Guardas Municipais.

BANDEIRA

A nova bandeira nacional, verde e vermelha, foi aprovada pelo Governo republicano a 29 de Novembro.

Por Rui Ramos

Fonte: Correio da Manhã, 04 de Outubro de 2009...

sábado, 2 de outubro de 2010

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

Comer... Rezar... Amar...


 
‘Comer, rezar, amar’ é filme direcionado para elas e eles Julia Roberts faz o papel da autora do livro homônimo, Elizabeth Gilbert. Javier Bardem interpreta o seu par romântico, o brasileiro Felipe.

“Comer, rezar, amar” chega às telas nesta sexta-feira (1º) com a expectativa de transpor para o cinema o sucesso do livro homônimo. Para isso, foram escalados a atriz Julia Roberts, no papel da autora Elizabeth Gilbert, e Javier Bardem, para o seu par romântico, o brasileiro Felipe.

A história autobiográfica fala sobre Liz que, apesar do sucesso profissional e pessoal, sente-se vazia. Para se preencher, a escritora decide reencontrar os seus prazeres perdidos, como o gosto pela boa comida. Ou o conforto de uma religião, principalmente uma exótica para os ocidentais. Por isso, ela escolhe visitar a Itália e Índia, respectivamente. A Indonésia é escolhida para que Liz possa se reencontrar com um guru, que tinha previsto que ela voltaria. Mas lá ela encontra o terceiro caminho desse tripé, ao conhecer Felipe. Javier Bardem até se arrisca em algumas palavras e expressões em português, como “falsa magra”, mas sempre escorrega no sotaque.

Além dessa história de redescoberta, o filme se baseia também em boas histórias laterais que enriquecem o caminho de Liz – e alongam o filme, talvez um pouco além da conta. Na Itália, ela conhece um grupo que a adota, levando-a para restaurantes e até para casas de campo, onde passam o feriado de Ação de Graças. É na Itália que ela começa a aprender a relaxar e a alegria de não fazer nada – o famoso dolce far niente.

Na Índia, ela conhece Richard (Richard Jenkins), um texano que implica com o seu jeito, até que se torna seu amigo e uma espécie de mestre, mesmo com pouca relação com a religião. Na Indonésia, ela reencontra o seu verdadeiro guru, que propõe que ela encontre o equilíbrio entre o prazer e a censura. Também em Bali, ela é apresentada para uma curandeira, que, junto com a sua filha, são responsáveis pelo momento mais emocionante do longa.

Ponto fora da curva de todo o longa, os italianos são retratados de maneira caricatural, como já tinham alertados os jornais da Itália. O mesmo não acontece com os indianos, indonésios, nem mesmo com o solitário brasileiro interpretado por Bardem. Aliás, Liz elogia “os brasileiros”, por serem amáveis. E o filme homenageia a música nacional, com citações como o “Samba da benção”, aquele que diz que “é melhor ser alegre que ser triste”.

Talvez porque o filme seja em primeira pessoa, com Gilbert contando as suas próprias experiências na passagem por essas três diferentes culturas, e suas reações a cada uma delas, vemos que o filme não se trata de um manual de auto-ajuda. Ela mesma refuta seguir à risca os ensinamentos hindus quando passa pela Índia, por exemplo. Como se mostrasse que, mesmo as religiões não são – ou não deveriam ser – dogmas impostos, mas sugestões de comportamento.

Mas o maior mérito do longa é não ser direcionado apenas para as mulheres, ou melhor, para esse tipo de mulher que, após conseguir a independência, voltou-se para a casa e, mesmo assim, não consegue encontrar a felicidade. Ele mostra que esse comportamento, essa busca por algo exterior – trabalho, casamento, filhos, etc. – é inócua. “Comer, rezar, amar” é um filme amplo, leve, que vai fazer a alegria delas e, até mesmo, deles...

Por Ronaldo Pelli Do G1 RJ
Fonte: G1 Pop & Arte