domingo, 27 de março de 2011

Na Turbulência da Saudade...

Sob o pensamento encantado da vida
nas mesmices dos desencontros

O mágico silêncio
da ausência de linguagem
em dias de mistérios
me redime na correnteza das águas
como dois rios que se encontram
na turbulência de lágrimas

em infinita tortura

Eu, divina vítima
desse vazio
com delírios de monotonia
graciosamente
sinto-te
na saudade de tantas saudades

Rio-denso-Coração...

No rio denso da saudade
E, dos barrancos de tantas embarcações

como as correntezas dessas águas
vejo sem-fim o volver

Turbulentos, errantes
são os corações...

Falácias da Amizade...

Falaciosa amizade
em ombros pouco amigo
dormi contigo

Sem máscara da irrealidade
senti nos devaneios da hipócrita
revelação: irônico destino familiar

Desabafos do cansaço
da real falsa amizade...

Insônia...

Afugentado os demônios: "De origem ancestral, as máscaras fazem parte da cultura de várias civilizações... Gregos e Romanos exibiam máscaras em cerimônias religiosas e na China eram usadas para afastar maus espíritos."...

sábado, 26 de março de 2011

sexta-feira, 25 de março de 2011

Estrada...

"Crise portuguesa, crise europeia"...


Segundo os estudiosos do sistema econômico: a crise      portuguesa é culpa do Primeiro-Ministro, José Sócrates: "A crise financeira continua fazendo estragos na União Europeia e especialmente na zona do euro. Mais um país - Portugal" ... Esse é o resultado em querer ser à semelhança...
Bem que o melhor cronista de Portugal avisou aos estúpidos sobre a situação econômica global: "É a economia global, estúpidos!"... E, ele não se cansou de apontar os erros: "Andamos todos cansados, à espera de uma coisa qualquer que redima o estado do país. É recorrente em Portugal esta condição - a espera. Talvez na espera resida a única esperança que temos"... Com esta eu aprendi que a espera é vã...

O Poder da Tua Palavra...

Qual o poder da palavra?...
Que força estranha é essa,
que emana da palavra?...

Mas da tua palavra...

Qual o enigma exalado da palavra
que vem na tua escrita?...

Esse poder que me domina,
ostensivamente,
torce-me e contorce-me
em desespero...

Dilacera-me em fragmentos
da dor que me tortura
Em noites de amarguras

Como um deus secreto:
invade-me,
esmaga-me,
desnorteia-me...
Solta, perdida, vagando na vida...

Vida sofrida?, porém vivida!

quinta-feira, 24 de março de 2011

La solitudine...

El amor despues del amor...

El tiempo vendrá
cuando, con gran alegría,
tú saludarás al tú mismo que llega
a tu puerta, en tu espejo,
y cada uno sonreirá a la bienvenida del otro,
y dirá, siéntate aqui. Come.
Seguirás amando al extraño que fue tú mismo.
Oferece vino. Oferece pan. Devuelve tu amor
a ti mismo, al extraño que te amó
toda tu vida, a quien no has conocido
para conoce a otro corazón,
que te conoce de memoria.
Recoge las cartas del escritorio,
las fotografias, las desesperadas líneas,
despega tu imagen del espejo.
Sienta. Celebra tu vida.

Derek Walcott

quarta-feira, 23 de março de 2011

A guerra contra a Líbia é um ato Democrático de Civilidade Política?...

A presidente Dilma e  Barack Obama no Palácio do Planalto (Foto: Agência Estado)
 Acredito que o ex-presidente Lula não compareceu ao almoço oferecido ao presidente Barack Obama para não compactuar com o Imperialismo  contra a Líbia, penso que não existe  nenhuma teoria que justifique seja lá qual for a guerra em jogo... Agora essa é boa: A "civilidade política fortalece a democracia"...

terça-feira, 22 de março de 2011

Sem Espaço, Sem Tempo...

                                      Imagem: Relacionamento com Deus
No Vendaval de Palavras
Encontro-me

E em mim mesmo
Busco sentidos

Por entre espaços
De tempos nunca existentes

Existo; sim?

No tempo em que o Tempo
Nos aproximou

Por entre caminhos e pedras
Da própria inexistência

Do Ser no ser
Não sou fantasia

Fim: chegando ao fim

Nos espetáculos
Espero-te no início

Em outras estradas... Sigo... 

segunda-feira, 21 de março de 2011

Três...

Piensando en Amazonía en América Latina...

Andava um tanto desligada da região Norte devido a tantas decepções, daí decidi voltar aos estudos para me situar no tempo e no espaço: foi quanto elaborei uma proposta de pesquisa para a Coordenação de Pós-Graduação no Mestrado: “Linguagem e Identidade”, porém ainda não passei pelo processo seletivo mas como sou exagerada solicitei uma vaga como ouvinte na esperança de por em prática posteriormente minha proposta de estudo. O tema que eu escolhi visa amenizar minhas inquietações a respeito das contradições no campo da política governamental, cuja idéia é compreender a florestania, na educação escolar acriana, através da linguagem de afirmação da Identidade cultural transmitida pelos Programas Educacionais de Governo...

Pois é, depois de uma década longe da academia e suas teorias: volto a sentar na sala de aula, passivamente, para receber o conhecimento necessário e compreender a desordem que impera no mundo da globalização e também aprimorar minha escrita...

Hoje numa aula com a professora Ana Pizzarro, da Univerdad de Santiago de Chile, foi discutida a distinção entre unidade e diversidade para compreendermos as diferentes culturas da America Latina; o que nos aproxima e o que nos diferencia enquanto latinos: aqui ela relatou as divergências entre Portugal e Espanha para explicar porque o Brasil do passado não foi considerado latino, fazendo referência que não é a língua que nos faz comum e sim o que nos inquieta enquanto cultura da descolonização: eis a nossa unidade latina, porque a luta da colonidade enquanto luta pela democracia restaura o discurso literário fragmentado do sistema ilustrativo da colonização... Enfim, enquanto ela abordava a estética das culturas periféricas, exemplificou: dizendo-nos que um sistema ilustrativo marca nossa memória como se fosse uma cicatriz gravada na pele...

Para meu regalo comprei a última publicação da Professora Pizarro, o livro “Amazonía: El rio tiene voces”... Ai, ai não vejo a hora de saboreá-lo!...

Humanitários ou Imperialistas?...

Lula e  Khaddafi, 13ª Assembléia da União Africana.Foto Ricardo Stuckert/PR
A maior de todas as ironias é o presidente Barack Obama estar numa reunião privada com a presidente Dilma Rousseff  para acionar a ordem de ataque contra a Líbia... Vá entender os imperialistas sem nenhuma atitude humanitária!...

Leio aqui para perceber além:   "A vida é muito irônica. A política também. Anos atrás, quando Nova York viveu o seu 11 de Setembro e George W. Bush marchou para o Afeganistão e para o Iraque, todo mundo gritou as palavras de ordem: imperialismo, imperialismo, imperialismo."

Vou em busca de melhor compreenção aqui: "A visita de Barack Obama ao Brasil por enquanto entrou para a história mais por expor ao mundo a nova fraqueza (relativa) dos EUA do que a nova força (relativa) do Brasil."

sábado, 19 de março de 2011

quinta-feira, 17 de março de 2011

Uma reforma mais radical...

Eu sou um ardoroso defensor da reforma ortográfica. A perspectiva de ser lido em Bafatá, no interior da Guiné-Bissau, da mesma maneira que sou lido em Carinhanha, no interior da Bahia, me enche de entusiasmo. Eu sempre soube que a maior barreira para o meu sucesso em Bafatá era o C mudo. Aguarde-me, Bafatá!

Nossa linguagem escrita está repleta de letras inúteis. A rigor, todas elas. Abolir o trema ou o acento agudo de alguns ditongos deveria ser apenas o primeiro passo para abolir o resto do alfabeto. Se os italianos decidissem abolir a linguagem escrita, perderiam Dante Alighieri. Se os brasileiros decidissem abolir a linguagem escrita, conseguiriam libertar-se de José Sarney.

José Sarney idealizou a reforma ortográfica em 1990. Ela foi escanteada por praticamente duas décadas, até a semana passada, quando Lula a sancionou. A posteridade se recordará da reforma ortográfica como a grande obra de José Sarney, ao lado da emenda parlamentar que permitiu ampliar o aeroporto internacional do Amapá para o atendimento de 700 000 passageiros.

Para os brasileiros, a reforma ortográfica tem um efeito nulo. Ninguém sabia escrever direito antes dela, ninguém saberá escrever direito depois. O caso dos portugueses é mais complicado. Eles concordaram em abrasileirar sua ortografia. Isso acarretou a necessidade de abdicar de um monte de consoantes duplas herdadas do latim. Alguém ainda se lembra de José de Anchieta? Quando ele desembarcou no Brasil, abdicou do latim e passou a rezar em tupi, para poder se comunicar com os canibais. Foi o que os portugueses, mais uma vez, concordaram em fazer agora: para poder se comunicar com os canibais - Quem? Eu? -, adotaram sua língua.

Eu entendo perfeitamente o empenho dos brasileiros em deslatinizar a língua escrita. De certo modo, o latim representa tudo o que rejeitamos: os valores morais, o rigor poético, o conhecimento científico, o respeito às leis, a simetria das formas, o pensamento filosófico, a harmonia com o passado, o estudo religioso. Ele encarna todos os conceitos da cultura ocidental que conseguimos abandonar. Eliminando o C e o P de certas palavras, Portugal poderá se desgrudar da Europa e ancorar na terra dos tupinambás.

Eu já enfrentei outra reforma ortográfica. Em 1971, durante a ditadura militar, Jarbas Passarinho, por decreto, cancelou uma série de acentos. Além do Brasil, só a China de Mao Tsé-tung pensou em fazer duas reformas ortográficas em menos de quarenta anos. Quando a reforma ortográfica de Jarbas Passarinho foi implementada, eu acabara de me alfabetizar. O resultado desse abuso foi despertar em mim uma salutar ojeriza pela escola. Nos anos seguintes, a única tarefa didática que desempenhei com interesse foi me lambuzar com cola Tenaz e, depois de seca, despelá-la aos pedacinhos. Meus amigos fizeram o mesmo. O analfabetismo causado pela reforma ortográfica de 1971 - e pela cola Tenaz - impediu que muitos de nós nos transformássemos em algo parecido com José Sarney. Espero que a reforma ortográfica de 2008 tenha um resultado semelhante. Em Carinhanha e em Bafatá.

Por Diogo Mairnadi
 
Fonte: Educar para Crescer

quarta-feira, 16 de março de 2011

Para Refletir...

                                     Fotografia do Arison - Mangueira do quintal de casa
A eficácia da oração não é determinada pela quantidade de palavras nela presentes, pelo seu volume ou pela sua visibilidade, mas antes de tudo pela capacidade de estabelecer um relacionamento sério, profundo e filial com Deus. Quem fala muito, grita e fica repetindo palavras é pagão, que não é capaz de reconhecer a proximidade de Deus e ter uma intimidade de vida com ele. A oração também deve ter um vínculo muito profundo com o próprio desejo de conversão e de busca de vida nova, de modo que ela não seja discursiva, mas existencial e o falar com Deus signifique estabelecer um compromisso de vida com Ele e para Ele.

REFLEXÃO

TERÇA-FEIRA - Mt 6, 7-15

Fonte: CNBB

Niki Nana...

terça-feira, 15 de março de 2011

Tribute...

Hermenêutica e Reveleação...

                                         Imagem Bing
Poucos cristãos param para pensar de onde vem o material utilizado como fonte para as traduções das Bíblias modernas. Alguém mais atento poderá fazer as seguintes perguntas: Há manuscritos originais escritos de próprio punho por Isaías, Oséias, Paulo ou João? Se não, que material dispomos, onde se encontram e quando foram escritos? Todos os manuscritos de um mesmo livro são iguais ou apresentam divergências? Se há divergências, qual deles se aproxima mais dos originais? Por último: quem definiu os livros que deveriam ou não ser considerados inspirados e que critério utilizou?

É de suma importância para todo aquele que se debruça sobre as Escrituras, levando em conta seu conteúdo sagrado e relevante para os dias atuais, conhecer, ainda que de maneira sucinta, a história da transmissão do texto bíblico. Depois de acurada análise, esse leitor curioso e inquieto a respeito das coisas divinas, certamente será levado uma profunda reflexão a respeito do significado da palavra “revelação”. No texto sagrado palavra humana e palavra divina se confundem como fogo e rocha ardente expelidos das entranhas da terra. Separá-las não é tarefa fácil. Eis o desafio da hermenêutica.

Breve história do texto do Antigo Testamento

Há entre os especialistas um relativo consenso de que os primeiros registros por escrito do Antigo Testamento ocorreram por volta do ano 1000 a.C., na época da monarquia davídica. Nessa época as tradições orais relativas aos patriarcas, ao êxodo e a tantos eventos ligados à fé e à história dos hebreus começavam a ser documentados por escrito. O material mais comum para a escrita empregado na época era o papiro.

Os registros mais antigos de textos do Antigo Testamento em hebraico foram encontrados entre os anos de 1947 e 1956 em algumas grutas em Qumran, às margens do Mar Morto. Datados em geral de 100 a.C. - 100 d.C. esses documentos (pergaminho, papiro ou cobre) ficaram conhecidos como Manuscritos do Mar Morto (MMM). De todos os livros que compõem a Bíblia hebraica, apenas os livros de Neemias e Ester não foram encontrados em Qumran.

Antes da descoberta dos manuscritos do Mar Morto os documentos mais antigos disponíveis do Antigo Testamento eram códices do final do primeiro milênio. Ao invés de costuradas e enroladas em carretéis como os pergaminhos, nos códices as folhas eram dispostas como num livro moderno. Alguns dos mais importantes códices em hebraico são os seguintes:

O Códice do Cairo dos Profetas C: É o manuscrito massorético mais antigo conhecido pelos eruditos. Foi escrito em Tiberíades e contém os Profetas Anteriores (de Josué a Reis) e Posteriores (de Isaías a Malaquias). Foi escrito por volta de 895 por Moisés ben Asher.

O Códice Or 4445 B: Também é conhecido como Códice Britânico e encontra-se atualmente no Museu Britânico de Londres. Abrange o Pentateuco com omissões. Foi escrito entre 925/930, talvez por Moisés ben Asher.

O Códice de Alepo A (ou Codex Alepensis): Também conhecido como Códex aleph. Originalmente continha todo o texto do Antigo Testamento, mas um incêndio criminoso feito na sinagoga de Alepo em 1947 lhe causou danos irreparáveis. Foi escrito em Jerusalém por volta de 925/930 por Shelomoh ben Buya'a. Encontra-se atualmente na Biblioteca do Instituto Ben-Zvi, em Jerusalém.

O Códice de Leningrado B19a (L): Foi escrito por volta do ano 1000 d.C. por Shemuel ben Yaakov no Cairo, Egito. Encontra-se atualmente na Biblioteca de São Petesburgo (antiga Leningrado). Este é o mais antigo manuscrito completo do Antigo Testamento e é a base da moderna Bíblia Hebraica Stuttgartensia (BHS). Uma nova edição do Antigo Testamento hebraico baseada neste códice está prevista para este ano: A Bíblia Hebraica Quinta (BHQ).

Todos os códices acima são conhecidos como Textos Massoréticos, desenvolvidos por um grupo de judeus conhecidos como massoretas (= transmissores e fixadores da tradição textual). Diferenciam-se dos manuscritos encontrados em Qumran por possuírem os sinais vocálicos e notas explicativas acrescidas ao texto.

Versões do Velho Testamento

Após a dramática experiência do exílio (586-537 a.C.), o hebraico como língua falada e escrita pelos judeus foi dando lugar ao aramaico (comunidades da Palestina e Babilônia) e ao grego (comunidades formadas em Alexandria, Egito). Esse deslocamento geográfico dos judeus fez surgir a necessidade de traduções do texto sagrado do hebraico para o aramaico (Targun) e para o grego (Septuaginta). O cisma com judeus que retornaram do exílio fez com que os samaritanos produzissem a sua própria versão do Pentateuco, que ficou conhecida como Pentateuco samaritano. Com o advento do cristianismo surgiu uma tradução para o latim (Vulgata Latina), língua oficial adotada pelo Império Romano. Após a difusão do cristianismo para outras regiões, logo surgiram versões em siríaco (dialeto do aramaico oriental falado por cristãos da Síria), copta (falado no Egito), o etiópico (falado na Etiópia), eslavo e árabe. Tais versões são extremamente importantes, uma vez que podemos compará-las com textos escritos em hebraico e determinar variantes. Vejamos com um pouco mais de detalhes cada uma delas:

Os targuns - versão parafraseada em aramaico da Bíblia hebraica. Os mais antigos de que dispomos são da era cristã. Os Targuns mais importantes são os de Onquelos, amigo de Gamaliel e Jonatã Ben Uziel, suposto discípulo de Hilel.

A Septuaginta – Também chamada de Setenta ou simplesmente LXX, foi elaborada por judeus que viviam em Alexandria, no Egito. Um escritor que se quis passar por um gentio chamado Aristeas relata que a tradução da LXX foi realizada por 72 judeus (seis de cada tribo) e completada em 72 dias no ano 285 a.C. Essa história é considerada inautêntica por estudiosos modernos.

O Pentateuco samaritano – Escrito num dialeto da mesma família da língua hebraica e com caracteres do antigo hebraico, o Pentateuco samaritano é um manuscrito medieval preservado pela comunidade samaritana. Ele apresenta cerca de seiscentas variantes em relação ao Texto Massorético. Em Dt 27,4, por exemplo, no lugar do monte Ebal aparece o nome do monte Gerizim.

A Vulgata Latina – É uma tradução do Antigo e Novo Testamento feita para o latim por Jerônimo em 404 d.C. Esta versão se tornou oficial na Igreja católica por mais de mil anos. Substituiu a Antiga Vulgata (conhecida como Vetus Latina), que por sua vez foi substituída pela Nova Vulgata no pontificado de João Paulo II, em 1995.

A Siríaca – Iniciada por volta do século II d.C. a versão siríaca conhecida como Peshitta segue fielmente o texto massorético.

Além das versões listadas acima, há ainda outras versões menos importantes, tais como a etíope (baseia-se na LXX), copta (sec. IV), gótica (também baseada na LXX - 360 d.C.), armênia (séc. V), eslavônica (séc. V) e árabes (séc. VIII ao XII).

Breve história do texto do Novo Testamento

Com relação ao Novo Testamento, as primeiras produções literárias dos discípulos de Jesus foram as cartas de Paulo, na década de 50. Marcos, considerado o primeiro dos evangelhos, parece ter sido escrito durante a guerra judaica (66-70 d.C.), ou seja, cerca de três décadas após a crucificação de Jesus. O mais antigo registro dos Evangelhos é um papiro (conhecido tecnicamente como Papiro P 52) que contém um fragmento do Evangelho de João, datado de 125 d.C. Os livros do Novo Testamento também são citados em escritos produzidos pelos Pais da Igreja. Dentre eles podemos destacar Justino Mártir, Irineu, Clemente de Alexandria e Orígenes.

Além dos fragmentos de papiro e citações antigas feitas pelos primeiros cristãos e seus opositores, os mais importantes códices do Novo Testamento são os seguintes:

O Códice Alef ou Sinaítico: Foi descoberto em 1859 no Convento de Santa Catarina (península do Sinai) por um jovem catedrático da universidade de Leipzig chamado Constantin von Tischendorf. O códice foi datado para o século IV. Contém o Antigo Testamento em grego e todo o Novo Testamento, acrescido das Epístolas de Barnabé e parte do Pastor de Hermas. Encontra-se atualmente no Museu Britânico.

O Códice A ou Alexandrino: Foi oferecido ao rei Carlos 1º da Inglaterra por Cirilo Lucar, Patriarca de Constantinopla, em 1627. Produzido em meados do século V, contém o Velho Testamento grego e o Novo Testamento a partir de Mt 25,6, mas omite partes do Evangelho de João (Jo 6,50 – 8,52) e II Coríntios (4,13 – 12,6). Contém ainda a Primeira Epístola de Clemente de Roma e uma pequena parte da segunda. Este documento também pertence ao Museu Britânico.

O Códice B ou Vaticano: Manteve-se oculto dos estudiosos na Biblioteca Vaticana desde que lá foi colocado pelo Papa Nicolau V (1447-1455). Como o Sinaítico, foi produzido no século IV. Contém o Velho Testamento em grego (com omissões) e o Novo Testamento até Hebreus 9,14. Faltam-lhe as epístolas pastorais (Timóteo e Tito), Filemon e o Apocalipse.

O Códice C ou Ephraimi Syri Recriptus: Trata-se de um palimpsesto (pergaminho reutilizado). O texto original foi recuperado porque a tinta do primeiro copista era de melhor qualidade que a do segundo. Contém fragmentos do Velho Testamento e todos os livros do Novo Testamento (com grandes omissões). Encontra-se atualmente na Biblioteca Nacional de Paris.

Todos os manuscritos acima foram escritos em unciais (letras maiúsculas). Existem 101 manuscritos unciais dos Evangelhos, 22 de Atos e Epístolas católicas, 27 de Epístolas paulinas e 6 de Apocalipse. Além dos unciais, há inúmeros manuscritos escritos em “minúsculos”, também chamados de manuscritos cursivos. O número de manuscritos cursivos é bem maior: 1420 dos Evangelhos, 450 do livro de Atos e Epístolas Católicas, 520 de Epístolas Paulinas e 194 do Apocalipse.

Versões do Novo Testamento

Como dito anteriormente, o Novo Testamento ganhou uma versão latina no século IV d.C., fruto do trabalho de Jerônimo. Além da versão de Jerônimo, o Novo Testamento também ganhou algumas versões siríacas (Peshita, Diatessaron e a versão Filoxeno-Harkeliana), uma versão armênia (fim do quarto século) e algumas versões em copta e etíope.

Obras consultadas:

ANGUS, Joseph. História, doutrina e interpretação da Bíblia – vol I. Tradução de J. Santos Figueiredo. Rio de Janeiro: Casa Publicadora Batista, 1951.

DRANE, John. Enciclopédia da Bíblia. São Paulo: Loyola, 2009.

FITZMYER, Joseph. 101 perguntas sobre os Manuscritos do Mar Morto. São Paulo: Loyola, 1997.

GEISLER, Norman L.; NIX, William E. Introdução Bíblica - Como a Bíblia chegou até nós. Tradução de Oswaldo Ramos. São Paulo: Editora Vida, 1987.

MEUNIER, Bernard. O nascimento dos dogmas cristãos. São Paulo: Loyola, 2005.

SICRE, José Luis. Introduccion al Antiguo Testamento. Estella: Verbo Divino, 2000, p.65.

SIMIAN-YOFRE, Horácio. Metodologia do Antigo Testamento. São Paulo: Loyola, 2000.

SCHNELLE, Udo. Introdução à exegese do Novo Testamento. São Paulo: Loyola, 2004.

VALDÉS, Ariel Álvares. Que sabemos sobre a Bíblia? – Vol II. Tradução de Afonso Paschotte. Aparecida, SP: Santuário, 1997.

VV.AA. Comentário bíblico em três volumes. São Paulo: Loyola, 1999.

VV. AA. Lexicon: dicionário teológico enciclopédico. São Paulo: Loyola, 2003.

Fonte: Numinosum Teologia

Diário Português...

Era o único diário de Eliade que, por vontade do autor, só podia ser publicado depois da sua morte e "o único manuscrito", o que criou "dificuldades de transcrição e algumas incorrecções", disse à agência Lusa o tradutor, o jornalista romeno Corneliu Popa.

Trata-se de uma obra de cerca de 300 páginas, publicada pelo editora Guerra & Paz, e inclui um estudo de um sobrinho de Eliade, o crítico literário Sorin Alexandrescu, que virá a Portugal em Abril para apresentar o livro.

Mircea Eliade (1907-1986), autor de "O Mito do Eterno Retorno", "Tratado da História das Religiões" e "O Sagrado e o Profano", foi adiado de imprensa e adido cultural da embaixada da Roménia em Lisboa entre 1941 e 1945.

O autor estava em Portugal quando terminou a II guerra mundial: "Salazar, que tinha cometido a `gaffe` de ordenar luto pela morte de Hitler e tinha sido injuriado na imprensa anglo-americana, corrigiu o erro rompendo as relações com a Alemanha, fechando a Legação e congelando os fundos alemães", anotou Eliade no seu diário, no dia 10 de Maio de 1945.

O escritor romeno conheceu pessoalmente Salazar, que retrata com simpatia ("É menos rígido visto de perto"), mas segundo Corneliu Popa, "não era propriamente fascista".

"É inegável que Eliade tinha simpatias de direita, mas não era um militante surdo e cego. Ele defendia um Estado autoritário, mas não totalitário", disse.

O "Diário Português" de Mircea Eliade foi publicado pela primeira vez em 2001, por uma editora de Barcelona, e cinco anos depois saiu também na Roménia.

"A edição portuguesa é a mais correcta. Mesmo a romena tinha vários erros, nomeadamente quanto aos nomes das localidades", garante Corneliu Popa.

Eliade ficou "fascinado" com a poesia de Camões e "o charme indiscritível" de Sintra e apreciava "Os Maias", de Eça de Queiroz, realça também o tradutor. Contudo - acrescenta - "o Portugal que ele descreve é um país bastante atrazado, muito rural e até triste".

"Não sei porquê, Portugal parece-me cada vez mais triste. Prestes a morrer. É um passdo sem glória", escreveu Eliade no dia 3 de Outubro de 1943.

A passagem do autor por Portugal ficou também marcada pela morte da sua mulher, em 1944.

Corneliu Popa, 36 anos, jornalista freelancer, radicado há uma decada em Portugal, já traduziu para romeno Pedro Tamen, Egipto Gonçalves e outros poetas portugueses, mas depois deste "Diário Português" gostaria de continuar a traduzir Mircea Eliade.

"Os seus livros de ficção, que são pouco conhecidos, merecem ser traduzidos. Durante o regime comunista na Roménia (derrubado em 1990), nem sequer se podia falar de Mircea Eliade, mas hoje ele é considerado um dos grandes vultos da cultura romena", diz Corneliu Popa.
AC.
Lusa/Fim

Fonte: RTP

Seu Rosto Amanhã...

“Seu Rosto Amanhã”, do escritor espanhol Javier Marías, abriu novas possibilidades para a ficção ao enriquecer técnicas narrativas e dialogar com a filosofia e a história...

Agora que já adentramos dez anos no novo século, pode ser um bom momento para rever as realizações culturais do período e procurar discernir novos rumos. Poderíamos perguntar, por exemplo, quais foram os melhores ou mais notáveis romances publicados desde o começo do milênio.

Muitos leitores terão suas listas próprias de “finalistas”; a minha inclui “O Xará” (2003, lançado no Brasil pela Companhia das Letras), da escritora bengalesa-americana Jhumpa Lahiri; “A Hora Azul” (2005, Objetiva), do peruano Alonso Cueto; “Testimone Inconsapevole” (Testemunha Inconsciente, 2002), do magistrado italiano Gianrico Carofiglio, seguido por duas outras histórias policiais da mesma alta qualidade; “Chicago” (2007), do egípcio Alaa al Aswany, uma história de biografias entremeadas que tem minha preferência sobre “O Edifício Yacubian” (2002, Companhia das Letras), do mesmo autor.

Todas essas obras são comoventes e bem escritas. Mas minha primeira escolha não é nenhuma delas, e sim o ambicioso romance em três volumes do escritor espanhol Javier Marías, “Seu Rosto Amanhã” [tradução de Eduardo Brandão, cujos volumes 1º e 2º foram publicados no Brasil pela Companhia das Letras, que prevê lançar o volume 3º no segundo semestre].

Suponho que eu possa ser acusado de viés nacional por essa escolha, já que Marías é um anglófilo que chegou a lecionar espanhol em Oxford, minha antiga universidade, e gosta de citar Shakespeare com ainda mais frequência do que cita Cervantes (o título do romance é uma citação de “Henrique 4º”, de Shakespeare).

O cenário de boa parte da história é Londres. Além disso, tive o prazer, em mais de uma ocasião, de encontrar dois personagens do livro, o professor de Oxford e ex-agente secreto sir Peter Russell (1913-2006), que aparece no livro transparentemente disfarçado como “Peter Wheeler”, e o professor espanhol Francisco Rico, que aparece brevemente no volume 3 sob seu próprio nome.

Mesmo assim, escolhi “Seu Rosto Amanhã” por uma razão diferente: por suas técnicas narrativas, que -como as de Cueto, mas de modo ainda mais notável- ampliaram as possibilidades do romance. Não estou pensando tanto no uso feito no livro de fotos de pessoas reais, à maneira de W.G. Sebald, para conferir uma ilusão mais forte de realidade, mas em outras técnicas.

Thriller subjetivo

O romance é uma espécie de thriller. Embora seja espanhol, o protagonista tem um emprego temporário trabalhando para o serviço secreto britânico, e lemos que Wheeler foi amigo de Ian Fleming [1908-64], o inventor de James Bond. Mesmo assim, o leitor não deve esperar uma narrativa movimentada.

No início de sua carreira, Marías traduziu para o espanhol um romance inglês do século 18, “A Vida e as Opiniões do Cavalheiro Tristram Shandy”, de Laurence Sterne, e aprendeu com Sterne, como já admitiu a um entrevistador, a escrever muitas páginas sobre um momento breve.

Boa parte do espaço em “Seu Rosto Amanhã” é dedicado a reflexões sobre a vida tecidas pelo protagonista, Jacques, Jaime ou Jack Deza, e a longas conversas entre Deza e seu amigo Wheeler ou entre Deza e seu pai -uma figura baseada no pai do autor, o filósofo Julián Marías (1914-2005). Algumas das conversas são “traduzidas” pelo autor do inglês ao espanhol, permitindo a ele refletir sobre as diferenças entre as duas línguas.

O leitor pode muito bem ter a impressão de que essas reflexões e conversas sejam digressões da história -devo admitir que, inicialmente, eu ficava um tanto quanto impaciente com elas-, mas essas sempre acabam revelando-se partes essenciais da história, como as aparentes digressões de Peter Wheeler.

Com a exceção de duas descrições vívidas e por momentos grotescos de violência física, minuto a minuto, como se estivessem acontecendo diante do leitor, a maior parte da ação de “Seu Rosto Amanhã” acontece nos bastidores, sob a forma de anedotas relatadas por Deza ou, mais frequentemente, histórias contadas a Deza por outros personagens no romance. Outro aspecto incomum do romance é seu tema autodestrutivo. As primeiras seis palavras do livro são “No debería uno contar nunca nada” [Ninguém deveria nunca contar nada] -seguidas, é claro, por uma história que dura cerca de 1.500 páginas.

O romance retorna repetidas vezes ao tema das consequências desastrosas que podem advir de falar, já que as palavras escapam do controle de quem as proferiu assim que são ditas, no caso de falas impensadas não menos que no de conversas traiçoeiras, incluindo as denúncias de antigos amigos que se seguiram à vitória de Franco na Guerra Civil Espanhola [1936-39], tema que ocupa bastante espaço nessas páginas.

O sofrimento causado às vítimas desse tipo de conversa nunca poderá ser cancelado, mas pode, pelo menos, ser aliviado, quando se conversa sobre ele. Nesse sentido, pode-se dizer que o romance seja freudiano, apesar de o nome de Freud nunca ser mencionado.

Tema e variações

A repetição controlada é um dos segredos do estilo do autor, convertendo este longo romance em uma espécie de sinfonia na qual o leitor aprende a prestar atenção para captar o reaparecimento de um “leitmotiv” (como a traição ou o poder das histórias), de uma citação de Shakespeare ou de uma das palavras-chave do romance -febre, lança, baile, sonho, veneno e sombra.

Descrições de incidentes que, à primeira vista, pareciam ser triviais ou irrelevantes revelam, quando são repetidas, empurrar a história para a frente ou ajudar o protagonista -e, por meio dele, o leitor- a compreender seu significado.

Existem maneiras diferentes de descrever o que Javier Marías realizou neste romance impressionante, com certeza sua obra-prima, além de ser um dos trabalhos de ficção mais importantes escritas na década passada. Um crítico literário poderia dizer que “Seu Rosto Amanhã” enriqueceu o repertório de técnicas narrativas e prever que não demorará muito a ser imitado por outros romancistas. Um filósofo poderia afirmar que Marías encontrou uma maneira nova de fazer filosofia, especialmente ética.

Um historiador pode impressionar-se sobretudo com a maneira como o autor trouxe os anos 1930 e 1940 de volta à vida. Todos teriam razão, já que “Seu Rosto Amanhã” é um livro híbrido, espanhol e inglês, literário e filosófico, apropriado para nossa era de hibridez cultural, em que tantos escritores sentem-se atraídos a explorar o terreno fronteiriço entre ficção e história.
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PETER BURKE é historiador inglês, autor de “A Tradução Cultural” (ed. Unesp) e “O Historiador como Colunista” (ed. Civilização Brasileira).
Tradução de Clara Allain.
Fonte: http://resumendeprensasp.wordpress.com/

segunda-feira, 14 de março de 2011

domingo, 13 de março de 2011

時の流れに身をま...

A HAIJIN SEDUTORA...

O último livro de Alice Ruiz, "Desorientais", é um diário poético, uma espécie de haibun - dias e noites vividos e revelados em vários haikais. Nenhuma invenção, nada artificial, nada arranjado, nada forçado, nada limado, nada "transpirado". Cada verso é expressão sincera e única de momentos em que ela se deixou entregar com a alma em estado de "grata aceitação". Simplesmente isso. E, no fundo, não é aquilo que Tohô nos ensina?

"Quando o espírito está embebido de haikai, o sentimento interior se funde com as coisas exteriores para determinar a forma do verso, e tão bem que o objeto é apreendido tal qual ele se apresenta, sem que a visão própria crie a menor divergência. Se o espírito, pelo contrário, não se depurou, a visão própria entra em ação e a pessoa tende a buscar a perfeição no arranjo das palavras. E isso constitui apenas a vulgaridade de um espírito que não se esforça para encontrar a verdade."*

"fim de tarde
depois do trovão
o silêncio é maior"

"entre uma estrela
e um vagalume
o sol se põe"

"varal vazio
um só fio
lua ao meio"

"rede ao vento
se torce de saudade
sem você dentro"

(*) citações retiradas do livro "Haikai", de Paulo Franchetti


 Fonte: Doc PDF

sexta-feira, 11 de março de 2011

Em um Mundo Melhor...

"É assim que as guerras começam", diz o pai depois de buscar na escola o filho que caiu na provocação do bully. Isso que parece uma caricatura de sermão - as reações sempre exageradas dos adultos - no cinema da diretora dinamarquesa Susanne Bier é perfeitamente normal. Para ela, as guerras de fato começam assim.

E a guerra virou uma obsessão. Recentemente, Bier tocou no assunto de forma mais direta em Brothers, e hoje, assaltada por uma grandiloquência (ou uma culpa burguesa), ela parece não conseguir mais fazer pequenos melodramas sem antes contextualizá-los geopoliticamente. Mais do que nunca, há algo de podre no reino da Dinamarca. A consciência tem pesado.

Em um Mundo Melhor parte, assim como Depois do Casamento, de uma cena terceiro-mundista para só depois ambientar a trama na Europa. Estamos em uma nação africana em guerra civil, onde o médico sem fronteiras sueco Anton (Mikael Persbrandt) tenta salvar meninas esfaqueadas e violentadas pela facção criminosa dominante. Anton, como bom médico, não julga as pessoas que atende - não lhe cabe fazer justiça.

Mas Anton se vê diante de uma situação delicada quando, de volta para a sua casa, na Dinamarca, descobre que o seu filho e o novo amigo dele se vingaram do bully do colégio de forma agressiva. Dizer que violência só gera violência não basta, e posar de bom moço que dá a outra face também não adianta. As crianças estão decididas a consumar, também em outros aspectos do seu dia a dia, essa descoberta satisfação de revidar.

Como Susanne Bier nunca foi uma diretora de meias palavras, perdoa-se o seu exagero quase irresponsável de comparar a realidade cruel de um fim de mundo africano com as questões rotineiras dos belos loiros suecos e dinamarqueses. O que torna Em um Mundo Melhor insuportável não são as cenas na África, mas a tentativa constante de enxergar em tudo aquilo que se move na Europa sintomas das doenças gerais da humanidade.

Então, no filme, se a avó do garoto diz inocentemente que "já instalamos internet no seu quarto", ferrou. Internet é a porta do mal. Se o avô guardava fogos de artifício no galpão, boa coisa não há de vir. Se os pais se separam, é um futuro apocalíptico que espera qualquer criança. E se as crianças gostam de passar a tarde no terraço de um edifício precário, então daí já viu. Em um Mundo Melhor é o filme da vida de quem decide educar os filhos em casa e não na escola. Em casa tudo é fotografia saturada, espreguiçadeiras à beira do lago e muitos abraços paternais.

Se pretendia colocar os seus personagens em um contexto complexo, e dar conta dos dramas mais variados, como o luto ou a rixa entre nações, o filme só consegue isolar e esvaziar esses personagens e esses dramas. O medo venceu, enfim. O mal-estar de Susanne Bier com o mundo entra em metástase.


Marcelo Hessel


Fonte: Omelete

quinta-feira, 10 de março de 2011

Se me Comovesse o Amor...

                                             Moça com livro Óleo sobre tela de José Ferrazde Almeida
Se me comovesse o amor como me comove
a morte dos que amei, eu viveria feliz. Observo
as figueiras, a sombra dos muros, o jasmineiro
em que ficou gravada a tua mão, e deixo o dia

caminhar por entre veredas, caminhos perto do rio.
Se me comovessem os teus passos entre os outros,
os que se perdem nas ruas, os que abandonam
a casa e seguem o seu destino, eu saberia reonhecer

o sinal que ninguém encontra, o medo que ninguém
comove. Vejo-te regressar do deserto, atravessar
os templos, iluminar as varandas, chegar tarde.

Por isso não me procures, não me encontres,
não me deixes, não me conheças. Dá-me apenas
o pão, a palavra, as coisas possíveis. De longe.

Francisco José Viegas, "Se Me Comovesse o Amor", 2007.

Fonte: Blogue Da Luzes & Da Sombra

A Simplicidade do Rei...

Quando o amor invade a alma... É magia
inspiração pra nossa canção... Poesia
O beijo na flor é só pra dizer
Como é grande o meu amor por você!

quarta-feira, 9 de março de 2011

Celebrando a vida...


Decidi celebrar a vida com Bach, pois às vezes gosto de cultuar o clássico e senti o erudito, eis que encontrei um saboroso cardápio para degustar com um toque de perdão melancólico... Bem, nem sou a pessoa mais apropriada para falar sobre a as Cantadas de Bach, pois é uma desafiadora tarefa, mas esta "obra-prima, bela, encantadora e sublime" eleva o coração de qualquer ser humano, por isso decidi desafiar-te: tirar fio-a- fio, apenas para ouvir e sentir o perdão sublime que vem do Mundo Celestial com a música erudita...

A Cantada 199 é classificada como um tesouro novo na composição de Bach porque foi descoberta pelo musicólogo dinamarquês Martienssen na Biblioteca de Copenhaga, em 1911: portanto há um século... Uma edição do manuscrito foi incluída em 1913 nas Obras Completas de Bach... O texto baseia-se no Evangelho (Lucas 18: 9-14) sobre a parábola do pecador: "o fariseu e o cobrador de impostos"... Esta parábola nunca desvanece com o passar do tempo... Enfim: é uma re-análise sobre a fé... Meu coração é uma fonte de lágrimas e meus olhos vivem em busca do teu perdão...

PS.: Esqueci apenas um detalhe: alguns dados têm como fonte a tradução do dr. Gloogle e estão entre aspas...

terça-feira, 8 de março de 2011

Everyday...

Psicologia dos Contos de Fadas...

                                O Eterno Imaginário, óleo sobre tela de John Anster
“ERA UMA VEZ uma criança que adorava ouvir histórias… ela nada mais esperava que viver cada momento, mas a cada passo dado neste seu mundo de sonhos e fantasia, pouco a pouco, sem o perceber, ia encontrando um sentido para a vida…”

Infelizmente, muitos pais desejam ver seus filhos com as cabeças funcionando racionalmente como as suas, e acreditam que a maturidade deles dependa exclusivamente do ensinamento lógico oferecido pela maioria das escolas que, via de regra, em nossa sociedade moderna, nada mais fazem que repassar um conteúdo pedagógico desprovido de maiores significados para a vida. Esquecem-se de explorar os sentimentos como fundamental ingrediente para a formação do caráter e, ainda que bem alfabetizem, desconsideram os contos de fadas como se estes só gerassem confusões quanto aos conceitos sólidos de realidade que devem ser ensinados às crianças. Pecam gravemente por isso.

Afinal, a sabedoria não é coisa que nasça pronta como a deusa Palas Atena, que, inteiramente formada, pulou fora da cabeça de Zeus; é antes algo delicado, que se constrói desde os tenros anos da infância, e que passa necessariamente por um estágio primevo, irracional, de extraordinário potencial que só se desdobrará convenientemente num bem explorado e maduro psiquismo. Obrigatoriamente, isto nos leva à necessidade de lidar com nossos sentimentos. O mundo interior, desconhecido pela consciência intelectualizada, encerra segredos legítimos, guarda metade de nós mesmos, e sua assimilação é imprescindível para todo aquele que deseje conhecer-se melhor ou que esteja buscando respostas honestas para os enigmas da existência.

Nesse particular, os contos de fada cumprem relevante papel. São expressão cristalina e simples de nosso mundo psicológico profundo. De estrutura mais simples que os mitos e as lendas, mas de conteúdo muito mais rico que o mero teor moral encontrado na maioria das fábulas, são os contos de fada a fórmula mágica capaz de envolver a atenção das crianças, despertando-lhes (idem nos adultos sensíveis) sentimentos e valores intuitivos que clamam por um desenvolvimento justo, tão pleno quanto possa vir a ser o do prestigiado intelecto.

Em essência, os contos de fada podem ser vistos como pequenas obras de arte capazes que são de nos envolver em seu enredo, de nos instigar a mente e comover-nos com a sorte de seus personagens. Causam impacto em nosso psiquismo porque tratam das experiências cotidianas, permitindo que nos identifiquemos com as dificuldades ou alegrias de seus heróis, cujos feitos narrados expressam, em suma, a condição humana frente às provações da vida. Não fossem assim tão verdadeiros ao simbolizar nosso caminho pessoal de desenvolvimento, apresentando-nos as situações críticas de escolha que invariavelmente enfrentamos, não despertariam nem sequer o interesse nas crianças que buscam neles, além da diversão, um aprendizado apropriado à sua segurança. Nesse processo, cada criança depreende suas próprias lições dos contos de fadas que ouve, sempre consoante seu momento de vida, e extrai das narrativas, ainda que inconscientemente, o que de melhor possa aproveitar para aí ser aplicado. Oportunamente, pede que seus pais lhes contem de novo esta ou aquela história, quando revive sentimentos que vão sendo trabalhados a cada repetição do drama, ampliando assim os significados aprendidos ou substituindo-os por outros mais eficientes, conforme as necessidades do momento.

Desde a remotíssima Antigüidade (especialistas apontam para uma tradição oral que começa há mais de 25 mil anos), a relação de qualquer criança com o mundo sempre dependeu dos relatos míticos e religiosos, cujos elementos básicos constituintes encontram-se espalhados por uma miríade de células narrativas de caráter mágico, as quais denominamos contos de fadas.

Platão, século IV a.C., no Livro III da República, propunha educar seus cidadãos por um mito próprio que lhes explicasse a origem de suas castas; em outros escritos informa que em seu tempo era função das mulheres narrar às crianças as alegorias, às quais chamou de mythoi. Data histórica mais antiga nos leva diretamente à fonte do popular tema dos “Dois Irmãos”, um dos quais geralmente é bom, o outro nem tanto, encontrado em quase todos os folclores. Ela se acha escrita no papiro egípcio Orbiney (nome de seu antigo possuidor) datado de 1210 a.C., que se encontra completo e preservado no Museu Britânico. Relata as desavenças entre dois irmãos, projetadas na dupla de deuses Anúbis e Bata, que vivem brigando entre si, mas dependem mutuamente um do outro. Entretanto, a ocorrência desta história parece ser ainda mais arcaica.

Assim como os mitos e as lendas, os contos de fada e as fábulas provêm do alvorecer da cultura humana e acham-se espalhados por todas as civilizações. Os registros ocidentais mais antigos nos levam a Esopo, herói popular da Trácia, a quem se reputa o ofício de ter sido no século VI a.C. um proeminente contador de fábulas. Aristóteles, em 330 a.C., relata que Esopo, certa feita, como advogado de defesa de um político corrupto teria se valido de uma de suas histórias, “A raposa e o ouriço”, para defender o seu cliente. A raposa estava tomada por pulgas, e o ouriço propôs-se a tratar dela. Com receio de se machucar ainda mais, ela argumenta: “Sr. Ouriço, deixe estar, se me retira estas pulgas já gordinhas, que nem me chupar podem mais, logo outras sedentas por sangue ocuparão seu lugar”. Ao que completou dizendo aos juízes que se condenassem à morte o réu já enriquecido, outros não tão ricos, mas ávidos para roubar, viriam a ocupar sua cadeira!

Esopo não escrevia suas fábulas. Até surgirem as duas coletâneas mais antigas desse gênero, datadas do ano 1 d.C., sua transmissão era exclusivamente oral. A primeira delas foi escrita em latim por Fedro, que traduziu Esopo para os romanos; a outra, em grego, é da autoria de Babrius.

A primeira coleção de contos, porém, com motivos do folclore europeu, denominada Gesta Romanorum, só surgiria no século XIV, escrita em latim. Precedeu em poucos anos As Mil e uma Noites, famosos contos árabes de magia e aventura, de origem persa, que datam dos séculos XIV a XVI. Tudo começa com a desilusão do califa Shahryar ao descobrir que seu irmão Shazeman era traído pela esposa. Resolve então que nunca deixaria que consigo acontecesse tamanha desonra, e decide dormir com mulheres sempre virgens para no dia seguinte entregá-las a seus soldados para a morte. Até que a corajosa Sherazade, filha de seu principal vizir, contrariando os conselhos de seu pai, oferece-se para o califa. Propondo-se a evitar maior matança, passa a contar-lhe todas as noites, após se amarem, uma história que ela sempre interrompia em seu ponto culminante, fazendo com que seu amo a poupasse até a noite seguinte, quando então, continuava a narrativa.
As Mil e uma Noites têm por pano de fundo o apogeu do mundo árabe alcançado durante o reinado de Harum-el-Raschid, quinto califa da dinastia dos Abácidas, século VIII d.C. Aladim e o gênio da lâmpada, Simbá, o marujo, e Ali Babá são alguns dos personagens que por três anos mantiveram viva Sherazade, até que, por fim, estando o califa completamente apaixonado por ela e transformado interiormente pela beleza de suas histórias, liberta-se de sua depressão, suspende a pena e a pede em casamento. Os contos das “Noites Árabes” haviam servido a el-Raschid como verdadeira terapia! A propósito, este é o procedimento adotado desde a Antigüidade pela medicina hindu, chamada Ayurveda, na qual os pacientes são convidados a meditar sobre contos de fadas para que suas mentes se purifiquem, condição prévia para que qualquer cura seja alcançada.

O título dado às histórias de Sherazade, assim como o modelo adotado por Bocaccio (1313-1375) no Decameron, bem serviram ao italiano Giovanni Straparola (1480-1557) que imaginou uma reunião de jovens, isolados do mundo, entretidos em suas narrativas de fadas. O conjunto, batizado por Piacevoli Notti (Noites de Prazer), foi publicado de 1550 a 1553. Muitas de suas idéias seriam depois adaptadas pelo francês Charles Perrault (1628-1703), até nossos dias lembrado por seus Contos da Mamãe Gansa, que vieram a público em 1697 trazendo uma versão de “Chapeuzinho Vermelho” em que o lobo sai vitorioso da história, após haver jantado a vovó e comido em seguida a menina de sobremesa. O literato justificava-se dizendo que sua narrativa era de valor eminentemente moral, e que as crianças bem deviam saber o preço da desobediência aos pais. Foi seu contemporâneo Jean de La Fontaine (1621-1695), imortalizado por suas Fábulas, publicadas entre 1668 e 1694, de cunho igualmente moral, que passaram a ser contadas nas escolas da época e permanecem populares até hoje. O alemão Gotthold Lessing, por considerar as sátiras de La Fontaine muito leves, em 1759 edita seu Fabels (Fábulas), cujo teor trazia lições bem mais severas que as da moral francesa.



Somente no século seguinte, porém, é que o jardim da infância floresceria definitivamente com a paciente pesquisa feita pelos irmãos Grimm na Alemanha. Os filólogos Jacob Grimm (1785-1863) e Wilhelm Grimm (1786-1859), lingüistas e folcloristas, colecionaram contos de encantamento por toda parte da Europa, e lançaram de 1812 a 1815, em dois tomos, Os Contos de Fadas dos Irmãos Grimm, que, desde então, vêm sendo adaptados em quase todos os idiomas, e transformados em elemento essencial da literatura infantil. Jacob era o mais intelectualizado dos irmãos, mas Wilhelm era quem detinha a verve da poesia; juntos chegaram a editar 210 histórias, maior parte delas encontrada nos dois volumes originais. Em 1983, descobriu-se um manuscrito com conto inédito na coleção dos Grimm.
Hans C. Andersen, 1894, tela de A. Kücher

Outro autor de novelas, peças de teatro, roteiros de viagens, memórias e poesias, consagrado por seus contos de fada, é o dinamarquês Hans Christian Andersen (1802-1875), filho de um humilde sapateiro e de uma iletrada mãe, mulher supersticiosa que o influenciou bastante por passar-lhe a tradição oral do campo. Em 1835 publicou Histórias Contadas às Crianças, com seus quatro primeiros contos. Até 1872, produziu 168 histórias, logo traduzidas em diversos países, comumente publicadas em séries de quatro narrativas por livro. Combinando à fantasia infantil sua aguçada sabedoria, encantou igualmente o público adulto, repetindo a mística do fenômeno provocado pelos irmãos Grimm; hoje sua obra acha-se traduzida em mais de cem línguas.
Monteiro Lombato
Ainda no século XIX, os românticos alemães Goethe e Ernst Hoffman, e o inglês Oscar Wilde são exemplos dos que também se dedicaram à literatura infantil. E citemos com orgulho Monteiro Lobato (1882-1948) que, preocupado em edificar os jovens, produziu extensa literatura infanto-juvenil de cunho pedagógico, adaptando para as crianças brasileiras as Fábulas de Esopo.

Mas por que nos impressionam tanto os contos de fada? Por certo, não apenas pelos expoentes citados que se dedicaram à sua compilação, visto que tais contos sempre foram populares como tradição oral, mas, antes, porque suas histórias são instigantes. Não há como alcançar completamente seu sentido em termos puramente intelectuais, fato que nos desperta a percepção intuitiva.


A fantasia - irracional a ponto de permitir que a vovó engolida pelo lobo mau permaneça viva em sua barriga até ser salva, ou que Bela Adormecida durma enfeitiçada um sono de cem anos, e João suba num pé de feijão até alcançar no céu o castelo de um gigante -, justamente pelo inverossímil que expõe, provoca uma reviravolta em nosso mundo psíquico que, estimulado, se aguça na tentativa de compreendê-la. E não há como explicá-la pelos padrões da razão metódica. A história de fadas é per si sua melhor explicação, do mesmo modo que as obras de arte encerram aspectos que fogem do alcance do intelecto, já que suscitam emoções capazes de comover os que diante delas se colocam. O significado desses contos está guardado na totalidade de seu conjunto, perpassado pelos fios invisíveis de sua trama narrativa. Claro que, diante desse mistério, muitas formas de abordá-lo são possíveis e igualmente válidas, posto que acrescentam luz à sua compreensão.

O psicanalista austríaco Bruno Bettelheim (1903-1990), por exemplo, em seu precioso estudo Usos do encantamento: significado e importância dos contos de fadas (em Português, A Psicanálise dos Contos de Fada, ed. Paz e Terra), argumenta: “Os psicanalistas freudianos se preocupam em mostrar que tipo de material reprimido ou inconsciente está subjacente nos mitos e contos de fada, e como estes se relacionam aos sonhos e devaneios. Já os junguianos, ele continua, frisam em acréscimo que as figuras e os acontecimentos destas histórias estão de acordo com fenômenos arquetípicos, e simbolicamente sugerem a necessidade de se atingir um estado mais elevado de autoconfiança, uma renovação interna conseguida à custa de forças inconscientes que se tornam disponíveis ao indivíduo”.


O próprio Jung disse certa vez que “nos contos de fadas melhor podemos estudar a anatomia comparada da psique”. Quis dizer com isso, explica-nos sua discípula Marie Louise von Franz em Interpretação dos Contos de Fadas (ed. Paulus) que os contos de fadas espelham a estrutura mais simples, ou o “esqueleto” da psique, e que suas muitas peças acabam por fundir-se, compondo os grandes mitos que expressam toda uma produção cultural mais elaborada. O estudioso clássico E. Schwizer demonstra como, por exemplo, o mito de Hércules foi sendo aos poucos espontaneamente “montado” a partir de histórias separadas, todas temas centrais de seus respectivos contos de fadas.

Fenômeno semelhante ocorre, aponta-o o historiador Homero Pimentel, no campo da literatura clássica, onde se registra a corriqueira absorção de temas arquetípicos encontráveis nos contos de fadas, como a figura típica da madrasta má que ordena a seu servo que mate Branca de Neve, bem aproveitada por Shakespeare em sua peça Péricles, Príncipe de Tiro. E talvez o literato britânico não alcançasse tanto sucesso não fosse seu costume de ler contos de fadas.
Branca de Neve, a propósito, cuja narrativa remonta há mais de mil anos, permite inúmeras interpretações à luz da psicanálise ou da psicologia junguiana. Prefiro ver neste conto, contudo, uma das jóias raras produzidas pelo saber dos alquimistas. Na alegoria de “Branca de Neve” estão depositados inúmeros segredos do ocultismo. A rainha, que morre ao parir, fora bem clara em seu desejo: “Quero ter uma filha de pele alva como a neve, lábios vermelhos como o sangue, e cabelos tão negros quanto a noite!” É como começam as versões originais deste fabuloso conto. Implícita está, desde o início, a alusão às três grandes fases da transmutação alquímica: albedo (o branco), rubedo (o vermelho) e nigredo (o negro). Expulsa de seu castelo aos sete anos, a menina é abandonada pelo servo na floresta; miticamente, este é o lugar desconhecido onde primeiro nos perdemos na busca da verdade. A casa dos sete anões representa o núcleo orientador capaz de nos levar de volta ao caminho iniciático dos alquimistas. E os anões, todos mineradores da caverna, representam a necessidade de trabalharmos nossas entranhas em busca do ouro filosofal. Na alegoria do sete acham-se velados os sete metais alquímicos, bem como seus sete planetas regentes, também os sete degraus para o preparo da Pedra Filosofal. A madrasta, por sua vez, traduz arquetipicamente os perigos do caminho de provações, revelando-se como bruxa perdida (por estar presa à vaidade) na busca da beleza eterna, enganada quanto à natureza do “Elixir da Longa Vida”. Ela morrerá em desgraça, e Branca de Neve, após pagar o preço de sua ingenuidade, acabará por renascer de sua morte simbólica nos braços de seu príncipe encantado, a representar a coroação dos ideais da alma. Mas a complexidade desta análise alquímica nos levaria a outra matéria; paremos por aqui. Parafraseando Michael Ende, autor da saga A História sem Fim: “Esta é uma outra história e terá de ser contada em outra ocasião…”

Texto de Paulo Urban, publicado na Revista Planeta, edição nº 345, junho/2001

Fonte: Amigo da Alma

segunda-feira, 7 de março de 2011

Mulheres lêem mais do que os homens...

                                                             Óleo sobre tela Moça lendo em Itu - José de Almeida 
Hoje li pela segunda vez o relatório Retratos da Leitura no Brasil, do Instituto Pró-livro, uma pesquisa feita sobre os hábitos de leitura no Brasil, incluindo o perfil do leitor brasileiro. Não fiquei surpresa ao saber que no Brasil, assim como no resto do mundo, as mulheres lêem mais que os homens. Aqui, a nossa percentagem é de 55% de leitoras mulheres para 45% de leitores homens.

Na verdade esta diferença entre leitores e leitoras é tão conhecida que o escritor inglês Ian McEwan se sobressaiu numa entrevista publicada no jornal The Guardian, de Londres, em 2000, quando sabendo-se conhecedor destes números e sendo avisado que as mulheres lêem mais ficção do que os homens, declarou: A conclusão inevitável é que no dia que as mulheres deixarem de ler, o romance terá desaparecido.

Este tipo de pesquisa, estes tipos de números são sempre fonte para muita especulação. Muitos estudos ainda virão a ser feitos, muitas teses de doutoramento e pesquisas similares para justificar esta diferença. Há as explicações biológicas, comparando os cérebros entre os dois sexos e há também aqueles que acreditam que isto se deve às meninas em geral serem alfabetizadas e apresentadas à leitura numa idade mais tenra do que os meninos.

Mas não deixa de me trazer um sorriso irônico nos lábios ao constatar que esta diferença também existe no Brasil. Porque até bem pouco tempo as mulheres não eram nem consideradas para a alfabetização. Lembrei-me disso quando ontem à noite, passando uma vista d’olhos no romance de Ana Miranda intitulado O retrato do rei, uma passagem prendeu minha atenção. Uma passagem que ilustra as raízes culturais que levaram em parte ao atraso na alfabetização das mulheres brasileiras, e a uma perda cultural imensa para a nós.

Fonte: Peregrinacultural's Weblog

Último Soneto...

 A Carta de Amor, François Boucher – 1750 – óleo sobre tela
Que rosas fugitivas foste ali!
Requeriam-te os tapetes, e vieste...
 Se me dói hoje o bem que me fizeste,
É justo, porque muito te devi.

Em que seda de afagos me envolvi
Quando entraste, nas tardes que apareceste!
Como fui de percal quando me deste
Tua boca a beijar, que remordi...

Pensei que fosse o meu o teu cansaço ---
Que seria entre nós um longo abraço
O tédio que, tão esbelta, te curvava...

E fugiste... Que importa? Se deixaste
A lembrança violeta que animaste,
Onde a minha saudade a Cor se trava?...

Mário de Sá-Carneiro

Fonte: Mundo Pessoa

O amor...

                                                               Fotos de Óleo sobre tela - Luiz XV
MOTE

Amor é chama que mata,
Sorriso que desfalece,
Madeixa que desata,
Perfume que esvaece.

GLOSAS

Amor é chama que mata,
Dizem todos com razão,
É mal do coração
E com ele se endoidece.
O amor é um sorriso
Sorriso que desfalece.

Madeixa que se desata
Denominam-no também.
O amor não é um bem:
Quem ama sempre padece.
O amor é um perfume
Perfume que se esvaece.



Mário de Sá-Carneiro

Além-tédio...

                                                                      Autoria de Túlio Dias - Baixaki
Nada me expira já, nada me vive
Nem a tristeza nem as horas belas.
De as não ter e de nunca vir a tê-las,
Fartam-me até as coisas que não tive.

Como eu quisera, enfim de alma esquecida,
Dormir em paz num leito de hospital...
Cansei dentro de mim, cansei a vida
De tanto a divagar em luz irreal.

Outrora imaginei escalar os céus
À força de ambição e nostalgia,
E doente-de-Novo, fui-me Deus
No grande rastro fulvo que me ardia.

Parti. Mas logo regressei à dor,
Pois tudo me ruiu... Tudo era igual:
A quimera, cingida, era real,
A própria maravilha tinha cor!

Ecoando-me em silêncio, a noite escura
Baixou-me assim na queda sem remédio;
Eu próprio me traguei na profundura,
Me sequei todo, endureci de tédio.

E só me resta hoje uma alegria:
É que, de tão iguais e tão vazios,
Os instantes me esvoam dia a dia
Cada vez mais velozes, mais esguios...

Mário de Sá-Carneiro

sábado, 5 de março de 2011

Linguagem e Silêncio...

Sem querer criticar a maior festa popular de todos os povos: passarei mais um carnaval a ouvir o meu silêncio, pois já que sou huni kuin (gente verdadeira) e não povo... não irei à avenida festejar a vida: ficarei a reviver uma antiga paixão com um reconhecido crítico contemporâneo, George Steiner, mas a minha paixão por ele aconteceu através duma breve leitura em um trecho do seu ensaio sobre a crise da palavra em “Linguagem e Silêncio”, este ensaio, como o próprio título indica, é uma instigante coletânea sobre a linguagem e suas crises nesse tempo de caos, apesar de suas críticas e minha leitura ter sido a duas décadas atrás, tudo está acontecendo exatamente de acordo com o pavor que senti naquela época... 23 anos da edição brasileira pela Companhia Das Letras se passaram e alguns da minha superficial silenciosa leitura, mas eu cá estou na mesma agonia dum carnaval sem fim, pois é nele que a ficção ganha nova forma, novos contornos e a arte é a própria alegoria dos foliões que seduzidos pela magia da festa vive sua ficção no real da comédia...

Neste ensaio Steiner ‘aborda desde assuntos mais abrangentes como a pornografia; o silêncio na literatura moderna ou o papel nefasto que o nazismo exerceu sobre a língua alemã, aborda também a obra de autores como o tcheco Franz Kafka; o húngaro Georg Lukács; a norte americana Sylvia Plath; o Frances Claude Lévi-Strauss e o alemão Günther Grass’... Pois Linguagem e Silêncio trata, antes de tudo, da linguagem e sua relação com a política, da linguagem e o futuro da literatura, das pressões exercidas sobre a linguagem e outros códigos de significados como música e teatro; tradução e ideologias...

Muito me despertou a atenção uma reflexão onde ele expõe que para Platão, Stendhal e Mozar, a arte é o riso da inteligência, essencialmente em nosso tempo atual onde a sociedade segue os contornos do comunismo falido, pois os indivíduos sem disciplinar seus impulsos reproduzem a selva na cidade e suas revoltas tornam-se a própria realidade cotidiana na polis dos homens selvagens, daí a arte ser a própria representação da tragédia real... “Mas é duvidoso se os modos relevantes serão os da tragédia... Se a sociedade futura assumir os previstos pelo marxismo, se a selva de nossa cidades tornar-se a polis do Homem e os sonhos de revolta tornarem-se reais, a arte representativa será a alta comédia” (p. 337)...

“As utopias embutidas nas revoluções têm necessariamente um contorno ideal e indistinto. É da essência da situação revolucionária que o Agora deva apropriar-se do Amanhã, que a imaginação, quando possuída pelo tempo Futuro, deva concentrar-se no curto prazo... Os sonhos devem ser disciplinados para cobrir o terreno do possível... O marxismo não é o único a deixar seu objetivo final vago. A maioria das religiões e filosofia da esperança fizeram o mesmo... Aí pode ser uma das fraquezas do Islão ter feito seu paraíso exato demais. Mesmo a perfeição perde o viço quando é entregue simples a imaginação. Como Dante sabia, a mente projeta o sonho para a frente, para dentro duma luz tão forte que ofusca todos detalhes (p 326).

“Em qualquer teoria sobre a sociedade pós-histórica – nosso sentido de ‘estar na historia’ é determinado em grande parte pela pressão dos conflitos políticos e sociais – terá que se considerar o dilema das motivações humanas na cidade justa... Então, o que viria a substituir o mecanismo primordial da esperança frustrada? De que modo seriam estimuladas as energias do movimento para a frente, que parecem integrais à personalidade humana, e como seria mantidas, ou, nos termos do paradoxo freudiano, como existirá civilização sem descontentamento? Nessa área de futuras incertezas, a circunstância da literatura apresenta um problema especifico: na medida em que a literatura é expectativas dramatizada, na medida em que é uma crítica do real à luz do possível, haverá necessidade dela? A literatura está enraizada na imperfeição do ser histórico? Os homens irão conseguir em dedicar suas idéias à ficção, quando o real satisfazer e seduzir as capacidades plenas de percepção e de ação? ” (p. 327)...

Mas Trotski afirma que a arte irá durar para além da vitoria: “o poeta da nova época irá repensar de um novo modo os pensamentos da humanidade, e re-sentir seus sentimentos... A muralha irá desabar entre arte e natureza”!... E tudo aconteceu: a muralha desabou e uma Nova Arte Renascerá...