domingo, 27 de agosto de 2017

Paixão: Erotismo e Sedução III...

Talvez alguma coisa compense todas as tensões proporcionadas pelo trabalho ou pelas guerras (caos em geral)... Alguma coisa que não consegue ser ditas pelas denotações, mas que sutilmente consegue expressar-se através dos enigmas exalados pelo corpo e pela alma; é, pois, através do sagrado e do profano que o corpo e a mente, enigmaticamente, encontram a sensação agradável da diversão...

Enamorei-me... Foi daí então que a conexão entre o erotismo e a sedução se tornou íntima da paixão... Não há subversão no amor; o amor também disciplina, ele acalma e faz-se no silêncio... Diferentemente do amor, a paixão exige subversão, transgressão e intensos movimentos... Há frenéticas disposições e alegria na paixão; ela não procura o silêncio, mas gosta de segredos: "Em lugar de um segredo absoluto; aí estaria a paixão... Não há paixão sem segredo, este segredo, mas não há segredo sem paixão" (Derrida)... O Segredo é uma qualidade sedutora... Porém não podemos nos iludir diante do processo de seduzir... Ao contrário, ele é carregado de exigências e intensas desordens; a sedução não pode parar de pensar; ela é incansável ao desnudar emoções... Capaz de construir um credo, a sedução busca a sabedoria, para fornecer a tolerância da espera ou meios de lidar com a encenação sem ligação com o real... 

"O que se diz de imediato sobre a sedução é que é um jogo... Caçada silenciosa entre dois olhares: captura numa rede silenciosa de palavras... Jogo arriscado e fascinante - angústia e gozo - onde o vencedor não sabe o que fazer com seu trofeu e o perdedor só sabe que perdeu seu rumo: um jogo onde a única possibilidade de empate se chama amor"... Lembremos agora que a sedução é também descrita pelo sagrado como inclinação artificiosamente para o mal ou para o erro... Também os crédulos a vêem com o sentido de desencaminhar os indefesos, mas lembremos também que a função do sagrado é disciplinar a sexualidade, portanto evitemos os moralismos disciplinadores, que sufocam a sexualidade, e nos apercebamos da arte do encantamento exalado pela sedução... Há uma solução muito eficaz contra a encenação do processo de seduzir: o erotismo... É ele que leva a pessoa sedutora a cair ou se envolver plenamente no fascínio da sedução...

O ser erótico evita o segredo, se afasta do silêncio da sedução e se envolve plenamente na desordem para cair na armadilha que lhe foi preparada pela paixão: o erotismo exige movimentos e ultrapassa a encenação sedutora para fixar-se em envolventes ações... Aqui faz-se necessário relembrar que jamais e jamais devemos relacionar sedução e erotismo à pornografia; a pornografia é a ânsia dos perversos e desequilibrados, ela pertence à ignorância de quem desconhece a paixão e o amor; é um jogo sujo que dificilmente se joga à dois...

Só quem vivencia bem a sedução consegue expressar e absorver o erotismo... Lembremos: é quando nos deleitamos de paixão que um vento quente, mais desesperado se arrasta pelo corpo e nos desmancha de prazer; aí existe qualquer coisa de verdade... Convence-nos de que no céu as estrelas brilham para enamorar, e começa a nos apresentar a metamorfose dos sentimentos; há uma fusão de sentidos avermelhados e úmidos... São as preliminares da estratégia estética nos apresentando o lúdico de uma realidade encantada, que não exige nenhuma explicação, nenhuma verdade... 

Uma poeira se espalha em nossa volta, inunda nossa alma, e avisa-nos que as coisas precisam ficar fora do lugar... É preciso aceitar que uma turbulência revire nosso coração, descompense nossa alma: é o vendaval da paixão deixando tudo fora de lugar... Até que os sentimentos agonizantes se vão, a poeira assenta e a solidão nos convida para uma conversa franca... Fala-nos que o tempo de espera findou... Foram, enfim, a sedução e o erotismo a prévia estética de um jogo lúdico anunciando a consumação do saudável e prazeroso ato sexual... 

Por fim, as estações, que nos estremeceram, desfizeram nossas certezas, flexibilizaram nossa insensatez e tudo transformou-se em aceitação; novos sentimentos florescem e dão permissão para olharmos de frente as arrebentações da paixão... Aprendemos a apreciar o tempo de espera e a desafiar o vento... Na presença tanto da paixão quanto da sedução, a encenação do erotismo foi de concretizar o desejo: o prazer do gozo... Afinal, amantes apaixonados não se comportam e não dão espaço ao tédio... Querem fantasia, exigem outras íntimas companhias: a sedução, o erotismo... eles necessitam prolongar o tempo com teatro e poesia, exigem romances na intimidade das horas... É a arte de amar e de reinventar-se a cada novo dia...

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Bibliografia Basilar...
Bataille, Georges. O Erotismo. Ed. L&PM. Porto Alegre, 1987.
Baudrillard, Jean. Da Sedução. Papirus Editora. São Paulo, 1992.
Derrida, Jacques. Paixões. Papirus Editora. São Paulo, 1995.
Foucault, Michel. História da Sexualidade I: a vontade do saber Edições Graal.Rio de Janeiro 1999.
____________. História da Sexualidade II: o uso dos prazeres. Edições Graal. Rio de Janeiro, 1990.
____________. História da sexualidade III: o cuidado de si. Edições Graal. Rio de Janeiro, 2007.

Paz, Octavio. A Dupla Chama: Amor e Erotismo. Editora Siciliano. São Paulo, 1995.