segunda-feira, 12 de outubro de 2009

Como Termina o Amor?...


                  Como termina um amor? - O quê termina? Em suma ninguém - exceto os outros - nunca sabe disso; uma espécie de inocência mascara o fim dessa coisa concebida, afirmada, vivida como se fosse eterna. O que quer que se torne objeto amado, quer ele desapareça ou passe à região da Amizade, de qualquer maneira, eu não o vejo nem mesmo se dissipar: o amor que termina se afasta para um Outro Mundo como uma nave espacial que deixa de piscar: o Ser Amado ressoava como um clamor, de repente ei-lo sem brilho (o Outro nunca desaparece quando e como se esperava). Esse fenômeno resulta de uma Imposição do Discurso Amoroso: eu mesmo (sujeito enamorado) não posso construir até o fim de minha História de Amor: sou o poeta (o recitante apenas do começo); o final dessa história, assim como a minha própria morte, pertence aos Outros; eles que escrevam romance, narrativa exterior, mítica."
                 Ajo sempre – Teimo em Agir, não importa o que me digam nem quais sejam meus próprios desencorajamentos, como se o Amor pudesse um dia me fazer transbordar, como se o Bem Supremo fosse possível. Daí essa curiosa Dialética que permite que o Amor Absoluto suceda sem embaraço ao amor absoluto, como se, através do amor, eu tivesse acesso a uma outra lógica (o absoluto não sendo obrigatoriamente a única), a um outro tempo (de Amor em Amor Vivo Instantes verticais), a uma outra música (esse som sem memória, sem construção, esquecido daquilo que o precede e o segue, esse som é em si mesmo musical). Procuro, começo, tento, vou mais longe, corro, mas nunca sei que acabo: não se diz da Fênix que ela morre, mas apenas que renasce (posso então renascer sem morrer?)
                A Errância Amorosa tem seu lado Cósmico: parece um Balé, mais ou menos rápido conforme a velocidade do sujeito infiel; mas é ele também uma grande ópera. O Holandês maldito é condenado a errar sobre o mar até encontrar uma mulher de uma fidelidade eterna. Sou esse Holandês Voador; não posso parar de errar (de amar) por causa de uma antiga marca que me destinou, nos tempos remotos da minha infância profunda, ao deus Imaginário, que me afligiu de uma compulsão de fala que me leva a dizer “Eu te amo”, de escala em escala, até que qualquer outro escolha essa fala e a devolva a mim; mas ninguém pode assumir a resposta impossível (que completa de uma forma insustentável), e a errância continua...

Barthes, Roland. Fragmentos de um Discurso Amoroso.Como termina o amor. Editora Francisco Alves, 12º edição. Rio de Janeiro, 1994.