... "Parece
 compreensível que o primeiro épico contemporâneo sobre a saga palestina
 seja escrito por um libanês, mas o fato de o Líbano ter galvanizado a 
questão da identidade de um povo não justifica por si a fama de Porta do
 Sol (Editora Record, 504 págs., R$ 52), o delicado monumento literário 
de Elias Khoury, que completa 60 anos em 2008. O escritor conseguiu o 
que poucos autores envolvidos com temas políticos conseguem: unir a 
razão militante com a sensibilidade de quem vê no “outro” a própria 
imagem refletida no espelho. 
Para
 escrever A Porta do Sol, Khoury, um homem de esquerda, formado segundo 
os princípios do cristianismo, teve de se livrar de todos os 
estereótipos – palestinos e israelenses . Ao contrário de outros autores
 árabes, ele procurou ver o “outro” como fruto de uma experiência tão 
amarga como a dos refugiados nos campos palestinos. No entanto, 
reconhecer a alteridade não significa virar o outro. Khoury é adepto do 
monólogo interior, que marca parte de sua longa produção literária. 
Afinal, é só começar o diálogo para passar à discordância. Então, a 
solução encontrada pelo autor em Porta do Sol foi criar um narrador que 
fala sozinho. Ou melhor: com um outro que pode estar morto.
A Porta do Sol é um manifesto que prega não a tolerância, mas o diálogo 
real entre judeus e árabes, o que irritou alguns críticos de Israel, 
especialmente por conta do cruzamento entre história real e criação 
literária. Khoury deu o troco. Disse em sua defesa que a literatura 
israelense, com exceções, costuma reduzir os palestinos a beduínos 
estúpidos. E por que os escritores de Israel não conseguem enxergar o  
palestino? “Porque pisam em sua sombra.” Khoury não pisa em ninguém 
nesse livro lançado há dez anos e só agora traduzido para o português"...
