sábado, 28 de janeiro de 2017

Eu Moderno III: O Sádico Individualista...

Eugène Enriquez nos convida a refletir: "De certa maneira, podemos afirmar, sem risco de sermos contraditados, que o mundo atual se tornou sádico... Os antigos valores de mérito, trabalho, honra, prestígio e a herança histórica, usada pelo capitalismo, inclusive a honestidade, a integridade, a responsabilidade, o cuidado no trabalho, o respeito aos outros, foram desvalorizados em prol de um único valor: o dinheiro... Tudo se compra e tudo se vende... O axioma é o de nossa sociedade, de onde deriva a possibilidade de corrupção generalizada, comportamento perverso por excelência... Um novo impulso foi dado a essa tendência pela predominância contemporânea das estratégias financeiras... E a guerra econômica se intensifica a cada dia"...

Estando as pessoas submetidas aos aspectos letais do Poder - que transforma os seres humanos em seres perversos apáticos e sem paixões, que veem os demais seres como coisas descartáveis -, mais uma vez eu me pergunto: não seria o culto ao individualismo uma causa para tantos conflitos e um mal a ser combatido?... Também aqui não quero dissertar sobre os sintomas do individualismo no ser humano (solidão ou corrupção) e nem nas sociedades (violência ou guerra), bem como as consequências a expansão da desordem generalizada... Afinal, esse é um tema muito debatido pelos estudiosos e meio cientifico, bem vale citar a discussão sobre a “modernidade liquida”, teoria esta construída pelo sociólogo Zygmunt Bauman, onde ele afirma que a ideia fortalecida, no mundo atual, é a ascensão do objetivo individual, levando ao declínio as Instituições sólidas e tradicionais, que asseguravam o equilíbrio das pessoas, e consequentemente, das sociedades... Se vendo com dificuldades de se mobilizar em sociedade, o ser humanos constrói outros caminhos, nunca favorável à coletividade... 

Ademais, rompendo com tais paradigmas estigmatizantes, como sustenta Zygmunt Bauman, o ser humano segue se chocando (ou se auto destruindo) com as multifacetas dos novos padrões, sempre mais reduzidos, e sem o convívio social, o que ocasiona a fluidez das regras que vão se moldando em curtíssimo espaço de tempo... Assim são criadas as ‘comunidades de carnaval’... Como via de regra dessas comunidades causar o alívio temporário das agonias das solitárias lutas cotidianas: a cansativa condição de pessoas persuadidas e forçadas a ferir a si mesmo... São comunidades da explosão criando eventos que rompem com a monotonia da solidão cotidiana, permitindo aos foliões suportarem a rotina quando a brincadeira terminar.... “Sempre mais individualizados e mais solitários, aquilo que nos remetia ao sólido e estável é-nos mostrado como atraso e carregado com um tom de nostalgia; no entanto somos seres essencialmente sociais, como precisamos estar em coletividade, criamos essas comunidades de carnaval, para que possamos suportar a solidão de uma sociedade fluida de eventos passageiros... 

Enfim, dentro de tais perspectivas moderna somos condicionados a ter uma vida muito mais acelerada, o tempo parece curto para tudo que queremos fazer e ter, entretanto estamos cada vez mais sozinhos em esferas individuais, porque na verdade nossas buscas por preenchimento é o que nos faz correr tanto em direção do idealizado e pouco concretizado... Foi o sistema econômico que lançou esta busca desenfreada, buscamos individualmente: justiça, segurança, educação e saúde... Por não acreditarmos mais na força do coletivo somos tentados pela rapidez das respostas do mundo moderno fechados em nosso próprio muro de proteção, mesmo estando sob os perigos dos fenômenos naturais e a acelerada consequência das mudanças climáticas...

Portanto são através desses aspectos que tropeçamos no sistema capitalista com a doença da individualização; porém seus antagonismos são o bastante para desconstruir os padrões da insustentabilidade, pois "não estamos seguros em nossos condomínios fechados, nossos filhos não estão tão protegidos como pensávamos dentro da escolas particulares, nem sempre estamos salvos nos planos de saúde privado, e quanto a justiça: o dinheiro não basta para garanti-la, nem as políticas ambientais nos dão esperança e garantia de sobrevivência... O grande dilema da sociedade mais contraditoriamente solitária está muito longe do fim... A futura geração ainda está sendo criada para continuar acelerada e sozinha, porque estamos diante de uma educação ou um sistema que prioriza o eu”...

Por fim, se não houver uma inversão de valores, estaremos todos condenados a sermos refugiados dentro do nosso próprio território ou prisioneiros de nossos lares...
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