sexta-feira, 3 de junho de 2011

Por uma Ética e uma Política da Amizade...

"Não existe nada mais moderno do que a luta contra o político" (Carl Schmitt)
As chances de realizar uma ética e uma política da amizade são escassas. É sempre a mitologia familiar que percorre o imaginário relacional, fornecendo um complexo de significado social sumamente expressivo, dominante e unificador. A distância existente entre a imagem da família ideal e a realidade leva inevitavelmente a frustrações e insatisfações. A supervalorização da vida familiar deprecia outro tipo de vida, dificultando a vida fora da família, ao tornar outros lugares, onde as pessoas podem se misturar e viver juntas, parecer uma segunda opção numa sociedade constituída segundo uma ideologia familialista.

Enquanto a ideologia familialista permear nossas instituições, nossas formas de ser-com-os-outros, enfim, nosso imaginário emocional, político e relacional, uma ética da amizade terá poucas chances de realização. As oportunidades de cultivar a amizade fora do casamento são reduzidas, com freqüência o cônjuge é o melhor amigo, ou os amigos (normalmente casais) são amigos comuns do casal, o que cria uma situação difícil em casos de separação; os indivíduos se encontram amiúde sozinhos e sem amigos.

A amizade é um fenômeno público, precisa do mundo, da visibilidade dos assuntos humanos para florescer. Nosso apego exacerbado à interioridade, a ‘tirania da intimidade’ não permite o cultivo de uma distância necessária para a amizade, pois o espaço da amizade é o espaço entre os indivíduos, do mundo compartilhado - espaço da liberdade e do risco -, das ruas, das praças, dos passeios, dos teatros, dos cafés, e não o espaço de nossos condomínios fechados e nossos shopping-centers, meras próteses que prolongam a segurança do lar. Daí que um deslocamento da ideologia familialista e a correspondente reabilitação do espaço público permitiriam que uma estilística da amizade fosse um experimento social e cultural plausível. Intensificando nossas redes de amizade podemos reinventar o político. Cabe a nós aceitar o desafio de pensar a amizade para além da amizade mesma, de imaginar metáforas e imagens para nossas relações de amor e amizade, de usufruir o sabor doce dessa nova amizade.

(Francisco Ortega)

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