terça-feira, 20 de setembro de 2011

O Mundo se Despedaça...

Ler O Mundo Se Despedaça, de Chinua Achebe, é uma experiência às vezes desconfortável, às vezes arrebatadora. O autor nigeriano que faz 79 anos no próximo dia 16 escreveu o seu livro de estreia quando ainda era um jovem de 20 e tantos anos. Redigiu à mão, em inglês, e enviou o texto para um escritório em Londres datilografar, com as despesas pagas. Eram os anos 1950.

Por pouco o texto não se perdeu. Graças à intervenção de um conhecido de Achebe, o manuscrito foi “desencavado” depois de passar meses ignorado num canto da empresa e, finalmente, passado a limpo. Aquela era a única cópia que havia e, se ela tivesse desaparecido, é muito provável que o escritor mais conhecido e lido da África jamais publicasse coisa alguma.

E foi com O Mundo Se Despedaça que Chinua Achebe (a pronúncia é algo próximo de “tchinua tchebei”) ganhou o mundo. Publicado pela primeira vez em 1958, depois de ter sido rejeitado por inúmeras editoras, o romance virou referência sobre como vivia o povo ibo na Nigéria até o fim do século 19 e o impacto que a chegada do homem branco teve sobre a região. A obra é considerada também fundadora da literatura moderna nigeriana.

Uma tradução brasileira foi publicada pela Ática em 1983 e era disputada a tapa no circuito de sebos. A nova edição, da Companhia das Letras, tem uma introdução minuciosa do escritor e historiador Alberto da Costa e Silva.

“Os ibos têm sua pátria no sudeste da Nigéria, ao norte do delta do Níger e ao sul do Benué, numa larga faixa que vai do sudoeste do Níger até as águas do rio Cross. Seus vizinhos ao norte são os igalas e os idomas; a oeste, os binis; a leste, os ecóis e os efiques; ao sul, os ibíbios e os ijós. As tradições colocam a fonte da nação ibo na área de Nri-Awka e dizem que a principal rua de Nri é a rua dos deuses, e que por ela transitam, a caminho da terra dos espíritos, todos os que morrem em outras da Ibolândia”, escreve Costa e Silva.
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O modo como Achebe escreve parece refletir a tradição oral do povo sobre o qual fala. Na descrição de Costa e Silva, os ibos amam a eloquência e têm o dom da palavra no mais alto conceito, além de jogar com palavras e adorar provérbios.

O Mundo Se Despedaça tem poucas descrições – o que torna o glossário ao final do volume ainda mais útil –, o enredo é ralo e mal consegue amarrar os acontecimentos de um capítulo aos do outro. Assim como as histórias narradas pelos pais aos filhos, Achebe sempre guarda uma lição atrás de cada fato. Seu protagonista perde a humanidade para virar uma ideia, ou um exemplo.

Okonkwo não é apenas um, mas sim um povo inteiro. Por mais que sofra as consequências de seus atos e viva um cotidiano que parece bárbaro aos olhos de um leitor de hoje, Achebe mostra o valor das tradições e o faz de maneira afetuosa.