domingo, 26 de outubro de 2014

Sobre o Tempo...

Por entre as minúsculas partes que se comportam aleatoriamente, considero o tempo a mais complexa virtualidade das lembranças daquilo que já existiu e tudo aquilo que há por vir... Considerando a fragilidade dessas lembranças, fixo neste Mundo, na tentativa de ilustrar a minha convulsão interior, as considerações Sobre o Tempo de Norbert Elias, isto como probabilidade de dispensar o destino para compreender o acaso das lentas horas de tantos caóticos viveres... 

Talvez o tempo de que eu necessito compreender não seja o tempo sociológico de Elias, mas sim um tempo psicológico que retrate o descompasso da sincronização de todos os monumentais instantes da minha geográfica existência, que grande confusão: viver meio século e só sentir que viveu duas décadas... E as outras três décadas como contabilizá-las?... Talvez tenha sido os momentos de profundo sono, portanto elas não existiram... Pois é, eu só consegui sentir o tempo passar somente até aos vinte anos, depois comecei a viver num mundo inexistente; enfim estou me retratando: para tanto estou restaurando o tempo esquecido... 

Bem, mas o interessante é perceber que para Norbert Elias o que marca a evolução do mundo não é nenhuma revolução ou construção e uso da moeda, mas sim a medição e o controle do tempo: o relógio... Foi este regulador das atividades ascendentes que caracterizou a passagem da Idade Média à Moderna... Compreendendo esse regulador civilizatório é possível, posteriormente, entender melhor o outro tempo subjetivo: o psicológico, assim como avaliar a incompatibilidade entre o tempo social e o tempo psicológico... Fica aí um trechinho do livro Sobre o Tempo... 


... "Quando não me perguntam sobre o tempo, sei o que ele é", dizia um ancião cheio de sabedoria... "Quando me perguntam, não sei"... Então, por que fazer a pergunta?... Ao examinarmos os problemas relativos ao tempo, aprendemos sobre os homens e sobre nós mesmos muitas coisas que antes não discerníamos com clareza... Problemas que dizem respeito à sociologia e, em termos mais gerais, às ciências humanas, que as teorias dominantes não permitiam apreender, tornam-se acessíveis...

Os físicos às vezes dizem medir o tempo... Servem-se de fórmulas matemáticas nas quais o tempo desempenha o papel de um quantum específico... Mas o tempo não se deixa ver, tocar, ouvir, saborear nem respirar como um odor... Há uma pergunta que continua à espera de resposta: como medir uma coisa que não se pode perceber pelos sentidos?... Uma "hora" é algo de invisível...

Os relógios não medem o tempo?... Se eles permitem medir alguma coisa, não é o tempo invisível, mas algo perfeitamente passível de ser captado, como a duração de um dia de trabalho ou de um eclipse lunar, ou a velocidade de um corredor na prova dos cem metros... Os relógios são processos físicos que a sociedade padronizou, decompondo-os em seqüências-modelo de recorrência regular, como as horas ou os minutos...

Essas sequências podem ser idênticas em toda a extensão de um país, ou até de vários, quando a evolução da sociedade o exige e o autoriza... Os relógios, assim, permitem comparar a velocidade de aviões que sobrevoam regiões muito diferentes, mas que percorrem a mesma distância... Graças a eles, é possível comparar a duração ou a velocidade de processos que se desenrolam sucessivamente e que, por isso mesmo, não podem ser diretamente comparados — como a duração de dois discursos, proferidos um após o outro"...

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Pintura: Vladimir Volegov