quinta-feira, 14 de outubro de 2010

O País da Imaginação...

 
                                                                                                                                         Imagem MSN
Em Benjamim e Raízes do Brasil, obras de Chico Buarque e de Sérgio Buarque de Holanda, respectivamente, há a caracterização da ausência de uma finalidade para a vida e para a história. A passagem do individual ao coletivo, e a sua justa interpretação, é um tema que, nos livros em foco, questiona a descontinuidade e a precariedade de certas narrativas históricas, tradicionalmente amparadas numa lógica com sentido determinado, com finalidade e com certezas previamente estabelecidas. Percebe-se, assim, que a escrita da história humana tem caráter inconcluso, incerto, quanto ao seu sentido.

Chico Buarque, em sua obra, apresenta uma configuração do ser humano numa época de miragens e de protótipos. Verifica-se que a construção da identidade de seu protagonista é erguida sobre ilusões, fantasias e faíscas imaginárias. Benjamim tem a sensação de estar sempre sendo filmado. A idéia de tudo ver, com todos os olhos, não é mais do que uma possibilidade lógica, que no entanto se consome no mesmo tempo em que se acredita tê-la alcançado, como no instante anterior à morte da personagem narrada na cena inicial do livro (a narrativa começa pelo fim). A trama, ao se desenrolar sob o signo da morte, aponta, talvez, para a abolição do futuro, na medida em que não atinge qualquer finalidade. O que há é a impossibilidade da escrita do futuro, porque o gozo é constituído por meio do jogo com os resquícios do passado.

Sérgio Buarque de Holanda ressalta, por sua vez, a especificidade temporal da realidade histórica do Brasil. Reconstrói, por meio da comparação, os aspectos do processo de formação da sociedade e da mentalidade dos brasileiros em suas mudanças, em seu devir, libertando-se de esquemas teóricos e de preconceitos. O aventureiro e o trabalhador, o espanhol e o português, são tipos ideais, que não existem "na realidade", ou seja, que se explicam nas suas diferenças e oposições, mas que somente puderam existir depois da análise minuciosa das fontes pelo historiador. Portanto, o "homem cordial" não existe, sendo apenas a condensação de um núcleo de atitudes recorrentes, que, reunidas num tipo ideal, permitem compreender uma certa constante na história brasileira, que é a prevalência do âmbito pessoal sobre o âmbito político, o qual deveria, por princípio, reger-se impessoalmente. Essa interpretação dos subterrâneos (raízes) do País aponta para a impossibilidade trágica da formação de um espaço público no Brasil.

O sentido da revolução brasileira em Sérgio Buarque de Holanda seria uma racionalização progressiva da sociedade tradicional, dominada por valores afetivos, familiares. Portanto, uma modernização baseada na separação entre o afetivo/privado e o racional/público. Assim, a modernização representaria uma mudança de mentalidade e um estabelecimento de regras universais que atingissem a todos, independentemente da sua origem familiar e de suas relações pessoais e políticas. Seu desejo é o de uma organização racional da sociedade, na qual todos possam encontrar o seu lugar e se expressar, de forma original, segundo regras universais e consensuais (cidadania).

Por Mauro Gaglietti* e Eliane Colussi**


*Mauro Gaglietti é Professor da Universidade de Passo Fundo (UPF). Doutor em História/PUCRS, Mestre em Ciência Política/UFRGS, Especialista em História/UFSM e Graduado em Licenciatura em História/UFSM.

FONTE: Internet