sábado, 28 de junho de 2014

Rumo ao Farol...

São palavras soltas e perdidas que as encontro tropeçando pela vida... Assim, na ávida esperança de formar a sinfonia que amenize a melancolia e permita compor a plenitude do destino, vou colecionando as simbólicas morfologias que o acaso insiste em oferecer-me... 

Outro dia fui a uma livraria em busca de alguma obra de Virginia Woolf, perdida sem saber por onde começar (uma leitura dessa autora, claro!) nada encontrei; hoje, na internet, li alguns comentários sobre o romance Rumo ao Farol; passarei este Dia de Domingo (29) nas livrarias, pois necessito muito da companhia de uma boa leitura, cá estou longe de meus livros: companheiros inseparáveis, às vezes, nem os leio, mas só em olhá-los fico calma... Vejamos uns trechinhos, que encontrei neste link , do Primeiro Capítulo de Rumo ao Farol... 

... "Agitando-se no sono, ela agarrou-se aos lençóis como alguém que despenca de um penhasco se agarra à vegetação na borda...

- É claro que amanhã fará um dia bonito – disse a Sra. Ramsay. – Mas vocês terão que madrugar – acrescentou.

Essas palavras trouxeram uma extraordinária alegria a seu filho, como se a excursão já estivesse definitivamente marcada. Após a escuridão de uma noite e a travessia de um dia, o desejo – por tantos anos aspirado – era agora tangível.

James Ramsay, sentado no chão, enquanto a mãe falava, recortava gravuras do catálogo das Lojas do Exército e da Marinha. Mesmo aos seis anos de idade, pertencia ao número daqueles que não conseguem separar um sentimento do outro, mas, ao contrário, deixam que as expectativas futuras – com suas alegrias e tristezas – toldem o que no momento está ao alcance da mão. Para tais pessoas, ainda na mais tenra idade, qualquer oscilação de sensações tem o poder de cristalizar e fixar o momento em que repousam, misturadas, alegria e tristeza: assim é que James Ramsay emprestava à fotografia de uma geladeira uma felicidade beatífica. Cercava-a de alegria. O carrinho de mão, o cortador de grama, o som dos álamos, folhas branqueando antes da chuva, gralhas grasnando, o raspar de vassouras, vestidos roçando – tudo isso era tão colorido e distinto em sua mente que ele já tinha seu código particular, sua linguagem secreta, embora fosse a imagem da mais pura e inflexível severidade: testa alta, arrogantes olhos azuis, impecavelmente cândido, recriminativo ao deparar com alguma fraqueza humana. Observando-o assim a guiar a tesoura com precisão em torno da geladeira, sua mãe imaginou-o num tribunal com uma rútila toga de arminho, ou talvez dirigindo uma empresa durante uma crise financeira.

- Mas o dia não ficará bom – disse o pai, parando em frente à janela da sala de visitas. Se houvesse um machado, um atiçador, ou qualquer outra arma à mão que abrisse uma fenda no peito do pai e por onde a vida se escoasse, James a teria empunhado naquele instante. Tais eram os extremos de emoção que o Sr. Ramsay despertava no íntimo dos filhos, apenas com sua presença. Ali estava: de pé, o perfil agudo como uma faca e estreito como sua lâmina, sorrindo sarcasticamente – não apenas pelo prazer de desiludir o filho e lançar sua mulher (que era mil vezes melhor do que ele, pensou James) no ridículo, mas sobretudo por causa da certeza íntima que tinha da exatidão de seus julgamentos. O que ele dizia era verdade.

Era incapaz de mentir: nunca interferia em alguma coisa ou se pronunciava de modo a dar um pouco de prazer a qualquer mortal, e muito menos a seus filhos, que, desde a infância, ficavam sabendo que a vida é árdua, os fatos inflexíveis, e que a passagem para essa terra fabulosa onde nossas esperanças mais brilhantes se extinguem e nossas frágeis críticas malogram na escuridão exige, acima de tudo – concluiria o Sr. Ramsay, empertigando-se e franzindo os olhos azuis na direção do horizonte -, coragem, lealdade e perseverança"...

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